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Falando em Copa

Copa desse ano tem dividido opinião de torcedores (Foto: Divulgação).
Copa desse ano tem dividido opinião de torcedores (Foto: Divulgação).

Falar de Copa de Mundo me traz muitas coisas à mente. Lembro da Copa de 1990, quando a bola em campo era o que menos me importava. Tudo o que eu mais queria era colecionar aqueles copões da Pepsi, decorados com motivos relacionados ao Mundial. Lembro da de 1994, a “minha primeira Copa”, de fato, da qual participei ativamente, torcendo, opinando, preenchendo as tabelinhas dos jogos, ajudando minha mãe e minha avó a preparar os lanches para as partidas, aprendendo sobre um universo novo, que se tornou fascinantemente especial depois da conquista do tetra. Lembro de chorar pela derrota de 1998 e me perguntar por que aquele cara da França tinha que nos humilhar ainda mais marcando o terceiro gol contra nós, no finalzinho do segundo tempo. Lembro de acordar de madrugada em 2002 para assistir a muitas das partidas que nos levariam ao pentacampeonato. E lembro de pouco me lixar para o que aconteceu nas copas que vieram depois. Até essa, de 2014.

A Copa do Mundo desse ano está sendo diferente. Porque somos os anfitriões, sim. Embora, eu vá assistir a todos os jogos pela TV mesmo, como sempre. Mas, principalmente, porque a reação dos brasileiros quanto ao evento está tornando esse um momento singular. Há quem considere essa uma ótima oportunidade de demonstrar toda a nossa paixão pela camisa verde e amarela, vibrando e fazendo o possível para que essa seja a Copa das Copas. Todavia, há quem torça contra o sucesso do Mundial e, também, da Seleção Brasileira. A motivação? Protestar contra a corrupção. Porque se acha totalmente inútil mobilizar todo um país para um evento supérfluo enquanto a educação, a saúde e todo o resto agonizam. Parece justo. Acontece que não é. Não na minha humilde opinião.

É como aquela velha polêmica que questiona por que gastar dinheiro comemorando Carnaval enquanto outros setores públicos precisam tanto de verba. Particularmente, não sou adepta da comemoração. Mas, creio que, se o dinheiro da educação, da saúde, do transporte, da habitação e da “mãe do Badanha” fossem aplicados como deveriam, haveria recurso de sobra para tudo. Inclusive, para a cultura e o entretenimento. As festas não são o vilão. O vilão é a má-utilização do dinheiro público. E isso acontece com ou sem Copa. Com ou sem Carnaval. Com ou sem PT. Infelizmente.

Muitas vezes, esse pessimismo coletivo não tem nem um fundamento decente. Hoje, por exemplo, tinha gente se dizendo croata desde pequeninho e nem sabia explicar o porquê. Quer dizer, sabia: apenas para ser contra o Brasil.

Ainda bem que a gente ganhou. Seria muito frustrante perder o primeiro jogo, em casa, reforçando todo esse ar de mau humor que anda pairando por aí nos últimos meses. Entendo as justificativas de quem espera muito mais do que estádios padrão FIFA para melhorar a nossa situação. De quem quer muito mais do que chamar a atenção do resto do mundo, quer uma vida digna para se viver quando não tiver nenhum turista olhando. Entendo tudo isso. Sou brasileira. Mas, não sou alienígena. Por isso, nessa Copa, entre o pessimismo e o otimismo, fico com o segundo. Que tudo possa dar muito certo. Dentro e fora do campo. O espetáculo começou e, sim, vai ter Copa.

Taís Brem
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“A escola precisa preparar cidadãos responsáveis”

Projeto Direito na Escola trabalha conscientização ética e moral desde a adolescência

Projeto é desenvolvido desde agosto (Foto: Divulgação)
Ação é desenvolvida desde agosto (Foto: Divulgação)

Não se trata de induzir os jovens a seguir carreira como advogados. É apenas uma tentativa de aproximar os alunos de quinta e sexta séries do Ensino Fundamental da percepção do Direito no cotidiano, em ações simples, como ceder lugar para alguém no ônibus. Por meio do projeto Direito na Escola, uma equipe desenvolve a iniciativa desde o mês de agosto na Escola Técnica Estadual Professora Sylvia Mello, em Pelotas. Responsável pela aplicação das disciplinas, a integrante do projeto e acadêmica de Direito da Faculdade Anhanguera Cássia Soares, 33, contou ao Blog Quemany como está sendo a experiência.

Blog Quemany – Do que trata o projeto?
Cássia Soares – O projeto visa apresentar aos alunos o mundo do Direito, fazer com que eles vejam a saúde, a educação, a ética, a moral pelo prisma do Direito. Numa determinada aula, por exemplo, discutíamos sobre um fato que ocorre no ônibus: ceder lugares que são reservados por lei e ceder lugares que não são reservados por lei. O que seria moral e o que seria Direito? Foi uma aula muito animada, pois os alunos saíram surpresos em perceber que o Direito está nas atitudes e ações do dia a dia. Noutra oportunidade, analisamos o que é pluralismo jurídico. Pegamos como exemplo a autoridade do pai que diz ao filho que deve passar de ano na escola, caso contrário será castigado. É um poder exercido com coercibilidade, mas sem a intervenção do Estado. O pai é a autoridade e ele mesmo aplicaria a sanção. Eles saíram da aula dizendo que em sua casa tem pluralismo jurídico, rindo e aprendendo a perceber o mundo que os cerca por mais um prisma.

Disciplinas são ministradas na Escola Sylvia Mello (Foto: Divulgação)
Disciplinas são ministradas na Escola Sylvia Mello (Foto: Divulgação)

BQ – Como surgiu a ideia de implantá-lo?
Cássia – A implantação de algo que ajudasse as pessoas a ver “mais longe” era uma inquietação pessoal. Tomei a atitude quando, em uma aula de História do Direito, com a professora Ana Clara Henning, a minha venda caiu. Decidi trabalhar para aumentar a criticidade de outras pessoas. O caminho é a escola, pois nela concentra-se o ensino, a preparação para a vida profissional e adulta. Preparar os jovens com temas do tipo é o mínimo. Creio que a escola ainda precisa ir mais longe, preparar cidadãos responsáveis, ter na base curricular assuntos que abrangem lei de trânsito, Maria da Penha, tributos… Claro que numa linguagem didática, própria para a idade. Mas, preparar para o futuro é essencial.

BQ – Como ele funciona? Qual o período de execução?
Cássia – O projeto funciona uma vez por semana, às sextas-feiras, numa turma-piloto do sexto ano, num período de 45 minutos. O projeto tem duração de seis meses.

BQ – Quem é o público-alvo da ação? Como está sendo a receptividade?
Cássia – O público-alvo são os estudantes a partir do quinto ano, que foram bem receptivos. Alguns pais, porém, não entenderam, acharam “bobagem” ver esse assunto na quinta série. “Isso é bom para quem vai fazer Direito”, disse uma mãe, bem brava.

BQ – Qual o principal objetivo do projeto e sua contribuição para a comunidade pelotense?
Cássia – Além da conscientização pessoal, o objetivo é multiplicar o conhecimento adquirido. Depois das lições, os alunos produzem cartazes e anexam nos murais da escola, atingindo toda comunidade escolar. Certa vez, tivemos uma palestra com dois policiais militares e um estudante de Direito, dirigida aos alunos de quinta a oitava série. Os alunos praticaram uma ação ética e moral, leram uma parábola e interpretaram, como contadores de história, aos alunos da Educação Infantil. A comunidade pelotense sai ganhando, porque passa a conhecer aquilo que não sabia e, então, usa esse conhecimento para facilitar a sua vida e a dos outros.

Taís Brem

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“A discriminação como regra e a igualdade como exceção”

Tese sobre falta de educadores negros em Pelotas discute desigualdade racial

Pesquisa comprova falta de docentes negros na cidade (Foto: Divulgação)
Pesquisa comprova falta de docentes negros na cidade (Foto: Divulgação)

“Uma análise sobre o discurso da desracialização da docência negra em Instituições de Ensino da Cidade de Pelotas-RS”. Esse é o título da pesquisa realizada pela doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Católica de Pelotas (PPGL/UCPel) Olga Maria Lima Pereira. Nessa entrevista ao Blog Quemany, Olga explica como sua pesquisa pode ajudar a trazer à tona reflexões sobre a situação dos negros no contexto educacional pelotense, não apenas como professores, mas, também, como alunos.

Blog Quemany – Do que trata o seu trabalho, especificamente?
Olga Maria Pereira – O projeto nasceu de uma certa inquietude e de uma busca constante por desconstruir certas histórias que, de tão sedimentadas, tendem a construir, em relação aos negros e seus descendentes, uma única e distorcida história. Por isso, quando escolhi, como tema principal da pesquisa, refletir sobre o discurso da desracialização da docência negra em algumas instituições de ensino da cidade de Pelotas, o fiz por compreender que o mito da democracia e harmonia racial entre negros e brancos, tão aclamado em nosso país, representa apenas uma forma confortável de negação do negro como cidadão de fato e de direito. Por mais que seja angustiante constatar certas verdades que permeiam as relações raciais na cidade de Pelotas, não podemos entrar no conformismo do velho ditado que sempre nos diz que “as coisas sempre foram assim”, que “até têm negros que são encontrados em alguns cargos de chefia, direção etc” e que “em nossas escolas (como não?) há professores negros, sim, senhor!”. No entanto, sabemos que a realidade que nos é apresentada no cotidiano é muito diferente das sutis afirmações de confraternidade e oportunidade entre negros e brancos. Como negar que em nossas instituições de ensino a ausência de docentes negros é um fato e não uma utopia? Como fingir que em nossas escolas o contingente de alunos e professores brancos ,de forma desproporcional, anula a pequena parcela de alunos e docentes negros ? Como desconsiderar a realidade socioeconômica dos negros em nossa cidade e continuar negando um racismo e uma discriminação velada, porém, facilmente identificada? A ausência e a invisibilidade de negros em nossas escolas são realidades escancaradas e jogadas a zonas de total silenciamento. Temos pouquíssimos professores negros em nossa cidade. E daí? Muitas vezes foi isso que ouvi! E o mais grave, na minha opinião, é que essa realidade tenha se naturalizado de tal forma que a impressão que se tem é que ninguém, ou poucos, procuram questionar os porquês dessas ausências justamente nos locais onde a educação e a reflexão deveriam ser sinônimos! Refletir sobre isso é mais do que um dever como pesquisadora: é uma atitude racional e humanizada. A sociedade precisa compreender que as sequelas deixadas em nossos irmãos africanos não podem mais ficar condenadas a uma fala distante, desprovida de atitudes transformadoras.

BQ – Como surgiu a ideia de abordar essa temática?
Olga – Desde minha adolescência, sempre participei de concursos literários sobre a abolição da escravatura realizados na cidade de Pelotas. Por isso, posso dizer que minha pesquisa começou antes mesmo que eu pudesse compreender que um dia ela se tornaria um instrumento reflexivo e de repúdio ao preconceito racial, tema tão caro e tão carente de políticas, verdadeiramente, reparatórias. Aliás, nunca consegui compreender porque o branco precisou anular tanto o negro para fazer sobressair sua vazia vaidade e soberania. Nas escolas, infelizmente, o que aprendemos foi a história do colonizador e, jamais, a história do colonizado – ou escravo, como queiram. Ensinaram-nos que um dia o país precisou ter escravos para escancarar seu desenvolvimento, porém, não nos fizeram refletir que esses escravos tinham uma cor e que essa cor serviu para justificar a desumanidade, fruto de um comércio farto de africanos sequestrados da África e jogados em solo brasileiro. O pigmento de uma pele foi a justificativa mais frágil que o branco arranjou para transformar o negro em escravo e rotulá-lo de ser desprovido de alma e de intelectualidade. No livro de Franz Fanon, “Pele negra, máscaras brancas”, o autor sintetiza essa realidade vivenciada por todos os negros: “Quando me amam, dizem que o fazem apesar da minha cor. Quando me detestam, acrescentam que não é minha cor. Aqui ou ali, sou prisioneiro do círculo infernal”. Essas inquietações foram me acompanhando e fortalecendo dentro de mim a incessante busca por tudo aquilo que me negaram tanto nas escolas como na própria academia: a verdadeira aprendizagem reflexiva sobre a outra história tão ausente nos livros didáticos e nos currículos escolares. Por isso, pensei: “Por que não aprofundar a pesquisa sobre essa ausência de alunos negros em nossos cursos de tecnologias? Por que não usar o mestrado como ferramenta reflexiva para me auxiliar a compreender como, de fato, se deu a trajetória desses alunos desde o seu ingresso até a colação de grau?

Poucos alunos negros chegaram à formatura (Foto: Taís Brem)
Poucos alunos negros chegaram à formatura (Foto: Taís Brem)

BQ – Como foi realizada essa pesquisa?
Olga – Fiz um recorte, de 2000 a 2008, de todos os alunos negros dos cursos de tecnologias do Campus Pelotas do Instituto Federal Sul-Rio-Grandense (IF-SUL), traçando estatísticas sobre desistência, trancamento, reprovação, cancelamento e colação de grau. Nesses oito anos analisados, fiquei decepcionada e indignada ao perceber que o direito de todos à educação sinaliza apenas uma frase bonita que não condiz com a prática e o quanto a educação continua sendo traduzida pela cor e pela negação do outro que tornei diferente. Apenas oito alunos negros chegaram à colação de grau. Os demais ficaram dispersos nas estatísticas de reprovação, desistência, trancamento e cancelamento de matrículas por motivos de trabalho. Seria por que a intelectualidade é só dos brancos? Ou seria porque a maioria dos alunos negros precisavam dividir a escola com a família e o trabalho? Muitos diziam para mim (afinal, trabalhei por 28 anos no Departamento de Registros Escolares da instituição): “Gostaria muito de continuar o curso, ele é tudo de bom! Chego a me ver como um grande e notável profissional” ou “Seria legal ter um diploma e trabalhar numa grande empresa, mas tenho família e preciso levar o sustento pra casa. Chego tarde da escola e cedo tenho que ir trabalhar. Meu cansaço é tanto, que não estou conseguindo acompanhar as lições do curso”. Ouvindo certos depoimentos ficava me questionando por que temos que conviver com sutilezas de determinadas leis que, desde a escravidão, tendem a legalizar amparos desamparando os negros e seus descendentes. Essas reflexões foram se agigantando dentro de mim e foi aí que resolvi usar o doutorado para pesquisar sobre a significativa ausência de docentes negros nos espaços escolares.

BQ – Mesmo não sendo negra, de que forma você percebe o preconceito racial na área da docência em Pelotas?
Olga – O fato de eu não ser negra, de certa forma, me faz perceber melhor o quanto é significante esse preconceito. Aprofundando um pouquinho mais nossos olhares sobre o preconceito racial numa cidade cujas marcas da escravidão são identificadas pelo período charqueadense, podemos entender, ainda que nos custe, o quanto o negro foi abandonado às margens de periferias e bairros e o quanto o acesso à educação sempre foi privilégio de poucos e não direitos de todos, como rege a Constituição Federal. A ausência de alunos negros nas redes de ensino de Pelotas é o reflexo e a consequência de suas ausências como docentes nesses mesmos espaços que serviram para excluí-los.

Olga estuda na UCPel e trabalha no IF-Sul (Foto: Arquivo Pessoal)
Olga estuda na UCPel e trabalha no IF-Sul (Foto: Arquivo Pessoal)

BQ – Como sua pesquisa poderá contribuir para a comunidade pelotense na educação e na cultura?
Olga – Em primeiro lugar, como bem sinalizado pela escritora nigeriana Chimamanda Adchie, é importante que não tenhamos sobre os outros a versão de uma única história. Lamentavelmente, somos cônscios que os ensinamentos repassados tanto na escola como na academia sobre o negro e sua contribuição cultural ficaram à mercê de zonas de total silenciamento. Diria mais: o que desaprendemos sobre o negro foi tão forte que preexiste uma falsa concepção sobre sua cor que através dos séculos fragilizou e fragmentou sua identidade. O negro não se enxerga na história como ator portador de uma voz que o identifique. Ele foi e continua abandonado e relegado a povo sem memória. Meu propósito é instigar reflexões sobre temas tão caros que foram silenciados pela ganância e pelo poder desmedido. Ainda que a pesquisa seja apenas um grão de areia num imenso deserto chamado “consciência humana”, creio que, como um todo, ela trará interrogações a serem debatidas e aprofundadas sobre os diversos porquês que insistem em delimitar oportunidades tão estreitas ao exercício da docência negra em Pelotas. Espero, acima de tudo, que ao ingressarmos nesses espaços escolares, nossa sensibilidade aflore a indignação e, através desse desconforto, possamos refletir sobre o papel dessas instituições que naturalizando a ausência dos negros em suas cadeiras fortalecem sua cumplicidade e passividade discriminatória e racista. Se a educação tem como objetivo principal um olhar de acolhimento coletivo, onde estão nossos alunos e professores negros? Até quando os avanços das tecnologias serão maiores que as relações com o outro? Será que é tão difícil compreender que somos todos diferentes, independente do pigmento de uma pele, e isso jamais pode se transformar em motivo torpe capaz de magoar, ignorar e negar ao outro os direitos que dizem ser de todos? Até quando o negro precisará recorrer a todo tipo de lei que os ampare se, desde do período pré-abolição, nenhuma lei foi cumprida em sua integralidade? Como conceber que diante de uma imensa legislação o negro continue sendo discriminado pela cor e, também, por recorrer a tais amparos? Nossa cidade historicamente foi marcada pelo longo período charqueadense, onde o negro foi explorado e humilhado em troca de uma desumana jornada trabalho. No entanto, os casarões dos grandes charqueadores da época hoje servem de pontos turísticos que, ao ressaltar a preciosidade de nossa arquitetura, de forma adversa, silenciam as dores de centenas de negros que deram seu sangue em troca de uma vida miserável. Não temos como quantificar o sofrimento desses negros porque, na história, eles foram transformados em peças,mulas e coisificações múltiplas. A luta por uma igualdade de direitos continua maculando nossa sociedade que , de tantos preconceitos, acaba ratificando a discriminação como regra e a igualdade como exceção.

BQ – Os resultados da pesquisa já estão fechados? O que já pode ser divulgado até esse momento?
Olga – Os resultados ainda não estão fechados, porque utilizei a técnica dos questionários e os mesmos estão chegando a todo o momento. Posso sinalizar que as análises finais não serão capazes de amenizar o preconceito pela cor em nossa cidade que, de forma velada, mas identificada, continua fortalecendo a sensação de um “não-lugar” para negros e negras, sejam eles docentes ou não. A invisibilidade da cor sofrida pelo educador negro continua, tal como num passado não muito distante, a sequelar sua identidade, através de situações constrangedoras vivenciadas no exercício de sua docência. Infelizmente, a mentalidade que simboliza nossa cidade, carrega consigo uma educação fundamentada pela permanência de um branqueamento que ainda persiste em achar que negro numa instituição possa assumir qualquer cargo, menos o de professor. Essa mentalidade, por sua vez, reforça, também, no seu quadro discente um desrespeito por educadores negros. No entanto, tenho percebido que os intelectuais negros estão dispostos a reverter esse quadro lamentável. Esse desconforto está desencadeando uma reação de reversão à imagem depreciativa que sempre lhe impuseram e, isso, em minha opinião, será um grande momento que marcará para sempre a história da educação em nossa cidade.

Taís Brem

Rico dinheirinho

Como as famílias trabalham a educação financeira junto a seus filhos

Mesmo pequenas, crianças já devem aprender noções básicas de finanças (Foto: Divulgação)
Mesmo pequenas, crianças já devem aprender noções básicas de finanças (Foto: Divulgação)

Em alguns lares, ainda hoje é assim: num determinado dia do mês, os pais dão aos filhos uma quantia fixa, chamada mesada, uma espécie de salário que as crianças e adolescentes recebem para administrar, exercitando, assim, sua independência financeira. Em outras residências, o trato recebe o nome de semanada e, portanto, refere-se ao pagamento concedido de semana em semana. Há, ainda, as famílias que investem na caderneta de poupança, separando um valor que, de tempos em tempos, é depositado no banco para custear algum projeto futuro, como o ingresso na universidade. E tem os casos mais simples, em que a educação financeira é praticada no bom e velho cofrinho. Ali, de moeda em moeda, os pequenos vão aprendendo a lidar com o dinheiro.

Longe de ser uma brincadeira, a tarefa de ensinar a administrar as finanças é indicada aos pais por especialistas da área, com o objetivo de colaborar na criação de adultos economicamente responsáveis, desde cedo. Assim, espera-se que aumentem as chances de os pequenos saírem desse processo preparados para enfrentar a selvageria do mundo capitalista em que vivemos.

Em geral, é na faixa dos dois anos de idade que começam a ser reproduzidas em lojas, supermercados e afins aquelas cenas dramáticas que todos nós já cansamos de assistir, cujo texto, salvo ligeiras variações, é sempre “Mãe, me dá isso? Pai, me dá aquilo?”. E é nesse ponto que as noções básicas sobre economia encontram espaço para se desenvolverem. “No mundo moderno, quase tudo tem um preço. Se você quer, por exemplo, um chocolate, deve pagar o valor que o vendedor pede. A mesma coisa acontece com os outros alimentos que você come, com a roupa que você usa, com a luz que ilumina a sua casa à noite, com a água que você usa para tomar banho e com o telefone que você usa para conversar com seus amigos. Como você pode ver, cada coisa tem um preço que se mede com dinheiro”, diz um trecho da cartilha “O que é o dinheiro?”, disponível no site do Banco Central do Brasil (BCB). A cartilha integra o Programa de Educação Financeira, projeto criado pelo BCB para aproximar a comunidade dos conhecimentos sobre economia e finanças.

O público-alvo do projeto não é composto apenas de crianças e adolescentes, mas seu material serve como subsídio para a conscientização dessa faixa etária. As ações educativas de curto, médio e longo prazo estão divididas em cinco pilares básicos – planejamento financeiro, economia, operações financeiras, Banco Central e meio circulante – e incluem, por exemplo, promoção de palestras em universidades, visitas de alunos de Ensino Médio e Fundamental ao Museu de Valores do Distrito Federal e a série de cadernos ilustrativos com textos simples que oferecem uma explicação clara a respeito de temas e conceitos básicos de economia.

Na prática

Kelen e Ariel (Foto: Daniel Avellar)
Kelen e Ariel (Foto: Daniel Avellar)

Ariel Borges tem sete anos. Mas, muito antes de completar essa idade, já havia ganhado de seus avós um cofrinho, que se abastece de moedas toda vez que os patriarcas vão visitá-la. Ela não ganha mesada, entretanto seus pais entendem a importância de ensinar o valor do dinheiro. Tanto que a própria Ariel, quando acompanha a mãe, a estudante Kelen Costa, 28, até o mercado, já sabe quando determinada mercadoria está com o preço alto demais para ser levada para casa.

“Ela sabe distinguir e me diz ‘Hum, isso é caro! Tem tal número na frente; não dá para comprar”, explicou Kelen. Ariel leva tão a sério suas economias que certa vez Kelen pediu emprestado umas moedas do cofre da filha e ouviu um alerta: “Só não pega tudo, porque eu tô guardando para comprar nosso apartamento”, disse a menina. É bem provável que Ariel não tenha noção de quanto custará ao bolso da família adquirir uma casa própria. Mas, o fato de ter sido estimulada a administrar seus trocados está lhe ajudando a ter uma visão mais clara do complexo formato que contorna as transações econômicas do nosso cotidiano. “Do meu ponto de vista, acho que as crianças têm que ter noção de valores, números e quantidade, desde pequenas”, opinou Kelen. “É uma forma de aprendizado. Você ensina e, também, aprende muito com elas”.

Jamile quer ajudar a comprar o carro da família (Foto: Wilson Brem)
Jamile quer ajudar a comprar o carro da família (Foto: Wilson Brem)

A família de Jamile já não vive de aluguel. Portanto, as moedas que guarda em seu cofrinho não serão necessárias para ajudar a subsidiar o sonho de uma nova moradia. Porém, a menina de nove anos tem planos igualmente ousados para alguém de sua idade: quer ajudar a mãe, a auxiliar de Educação Infantil Eloisa Santos, 40, a adquirir um carro. “Não dou mesada a ela, mas dou umas moedinhas, de vez em quando, para ela guardar no cofre. O trato é abrir só quando encher e houver um objetivo”.

De família evangélica, Jamile tem o hábito de separar 10% de tudo o que ganha e direcionar para o dízimo. O restante só é investido após o aval da mãe. “Normalmente, ela pede minha opinião”, comentou Eloisa, ao destacar que considera fundamental ensinar da forma correta para que os filhos não se tornem avarentos.

Nem todas as crianças e adolescentes seguem o exemplo de Ariel e Jamile; preferem custear investimentos bem mais modestos, como o lanche da escola ou o brinquedo do momento. Para Eloisa, entretanto, o principal é orientar para que não haja exageros, nem quanto ao desperdício nem quanto à valorização exacerbada. “Acho que dar dinheiro aos filhos requer, também, orientação. Só dar o dinheiro, sem propósito, não irá edificá-los em nada”, pontuou.

Porquinho de estimação

Tradição de fabricar cofres em formato de porco surgiu na Europa (Foto: Divulgação)
Tradição é europeia (Foto: Divulgação)

Criatividade é o que não falta na hora de inventar novas caras para os tradicionais cofrinhos. Mas, quando se fala de economizar moedas, a primeira imagem que nos vem à cabeça é, inevitavelmente, a de um porquinho. E isso por influência do Velho Continente. Reza a lenda que, por volta do século 16, os europeus costumavam guardar dinheiro em vasinhos feito com um argila chamada “pygg clay”. Mais tarde, o recipiente passou a ser conhecido como “pygg banks”. E, como em inglês, a palavra “piggy” é porquinho, foi daí que os ceramistas tiraram a ideia de começar a fabricar cofres nesse formato. A prova de que a invenção foi um sucesso é que até hoje ela é imitada nos quatro cantos do planeta.

Taís Brem

Cala-te, boca!

Evoluindo de xingamento a elogio, palavrões estão na boca do povo, mas ainda são mal vistos

Foto: Divulgação
Popularidade não aliviou má fama dos “nomes feios” (Foto: Divulgação)

Se antes era senha para um bom tapa na boca, hoje já não é tão feio assim. Falar palavrão está na moda. E nessa moda, nomes que acumularam má fama ao longo da história já não são utilizados apenas para descarregar a língua em xingamentos. Eles viraram sinônimo de adjetivos comuns, usados no dia a dia. E estão mais populares do que a gente costuma perceber.

Exemplos? Dizer que você foi a uma p*t* festa, significa que sua saída do fim de semana foi, a nada menos, que a um baita evento. Falar que aquele autor que você adora escreve bem pra c*r*lho, é elogiá-lo por sua capacidade ímpar de colocar as palavras no papel. E o tal do “ligue o f*d*-se” não passa de um conselho para levar a vida de forma mais light e desencanada. A maior prova de que isso não é balela, é que grandes são as chances de você ter lido essas expressões em seu sentido completo, como se os asteriscos não existissem.

Mãe de dois filhos – um de 17 e um de 20 –, a funcionária pública Mariza Cruz, 35, diz acreditar que esse “vocabulário pop” tem a ver com a inversão de valores da sociedade moderna. “Tudo o que circula na mídia, se torna ‘moda’”, disse. “As músicas, entre outros meios, estimulam o uso desse tipo de palavras, assim como o uso de drogas e outras coisas mais graves. Espero que meus filhos não se contaminem, mas não é fácil. Às vezes, ouço conversas dos meus primos, por exemplo, que têm entre 14 e 18 anos, e é assustador”.

Bruna Soares (Foto: Arquivo Pessoal)
Bruna costuma policiar o hábito (Foto: Arquivo Pessoal)

Pelo discurso, é possível que Mariza também ficasse incomodada se ouvisse uma conversa da vestibulanda Bruna Soares, 19, com sua turma. Bruna diz achar normal falar palavrão. “Mas, depende com quem, porque tem uns que eu acho meio pesados para se falar e, de vez em quando, dependendo do ambiente ou das pessoas que estão comigo, eu cuido pra não falar”, ponderou. Os pais de Bruna – o publicitário Paulo e a bancária Marta – estão entre as pessoas que ela considera inadequadas para ouvirem seu palavreado liberal, embora não lembre de ter recebido nenhuma correção deles nesse sentido. “Não lembro de me corrigirem, mas, também, não fico me cuidando. É normal não falar para eles”.

O analista e desenvolvedor de sistemas Robson Hellebrandt, 24, assume, numa boa, que fala palavrão em seu dia a dia, entretanto, como Bruna, ele também estipula restrições. “Não uso para ofender ninguém. Geralmente, é para intensificar alguma novidade, um fato que me emociona ou conquista. Muitas vezes, nos meus encontros com amigos, usamos bastante essa linguagem, mas sempre no intuito de intensificar a emoção do momento. Faz parte, infelizmente”, disse. Ao ser questionado sobre o porquê da palavra “infelizmente” para justificar seu hábito, Hellebrandt explicou: “Acho que posso parecer pouco confiável por, às vezes, me valer de palavrões para expressar algo. Considero que seja uma forma um pouco ‘suja’ de se expressar, que não passa credibilidade”.

"O que é ofensa para uns, não é para outros", disse Daniela (Foto: Taís Brem)
“O que é ofensa para uns, não é para outros”, disse Daniela (Foto: Taís Brem)

Embora tenham adquirido uma aparência mais natural ao longo dos anos, os chamados “nomes feios” não conseguiram, ainda, se desfazer completamente de seu lado negativo. Porém, é provável que esse quadro esteja mudando. “O que é uma ofensa para alguns, em certo contexto, para outros, em outro contexto, é algo natural. Isso acontece, porque a palavra não possui um significado fixo; ela toma diferentes significados, por meio do uso que os falantes fazem dela”, explicou a jornalista e mestra em Linguística Aplicada pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Católica de Pelotas (PPGL/UCPel), Daniela Agendes, 25. “É uma questão sócio-cultural. Talvez, seja uma forma de os falantes se integrarem e se identificarem a um determinado grupo, através do uso que fazem da língua, como se o uso do palavrão de forma diferenciada fosse um requisito para fazer parte daquele grupo”.

Punição a R$ 1
Quem não admite essa mudança sócio-cultural e não quer entrar na onda, deve se policiar. E policiar, também, aos seus. Na casa do fotógrafo Nauro Júnior e da jornalista Gabriela Mazza, esse policiamento teve de partir para o lado punitivo. E pasmem: quem controla a punição, não é o pai, mas a filha do casal, a pequena Sofia, de oito anos. “A coisa surgiu meio que naturalmente. Eu sempre falei muito palavrão, faz parte de meu vocabulário. Meus pais já me cobravam muito em casa e, quando a Sofia, nasceu a Gabi pediu para eu dar uma maneirada. Quando ela começou a falar, lá pelos dois anos, notamos que, às vezes, ela repetia alguns palavrões”, contou Nauro. A tática de dizer a Sofia que “falar palavrão é feio”, por si só, não funcionou. Afinal, ela argumentava que “se o papai podia falar, ela também podia”. “Foi quando a Gabi disse que, a cada palavrão que o papai falasse, teria que pagar um real pra ela. Ela adorou e, além de não dizer palavrão, fica me controlando o tempo todo. Até nas minhas palestras, quando ela vai junto, fica anotando quantos palavrões eu falo e depois me cobra. Se eu estiver conversando com alguém, não interessa quem for, e falar algum palavrão, ela começa a anotar pra me cobrar. Aí, eu tenho que explicar para a pessoa sobre a brincadeira, então prefiro me cuidar e falar menos”, afirmou o fotógrafo.

Se o objetivo era mesmo melhorar a qualidade do vocabulário na família, pelo jeito, está funcionando. “Além de ser cobrado o tempo todo em público, ainda tenho prejuízos. Geralmente, tenho que negociar com ela, porque falo muito mais palavrões do que posso pagar. Ela tem três cofrinhos cheios e, agora, fomos para a Bahia e ela conseguiu até comprar lembrancinhas com o meu dinheiro”. Na verdade, dinheiro dela, honestamente adquirido com seu dedicado trabalho de fiscalização.


Taís Brem

Design de exclusão

Produtos de apelo inusitado e criativo fazem sucesso no mercado, mas esquecem de contemplar o público negro

avental

Em tempos de design criativo, só consome produtos com cara de convencionais quem quer. Para os mais despojados, divertidos e, até mesmo, autênticos, há materiais com ar de exclusividade que dão um toque especial à decoração da casa ou do próprio corpo. Existem lojas físicas especializadas no ramo, mas é na Internet que os adeptos dessa moda fazem mesmo a festa. Nesse contexto, encontra-se de tudo, inclusive artigos com estampas que simulam a transparência do corpo, que estão no topo das novidades. Um fato, no mínimo, curioso, é que, na maioria das vezes, tais materiais são produzidos apenas para quem tem a pele branca. E descobrir se isso ocorre por uma inocente falta de noção da indústria ou por uma demonstração escancarada de preconceito racial é motivo de debate.

A tendência está nas luvas térmicas que ilustram mãos cheias de anéis; nos aventais divertidos, que sugerem que o cozinheiro está com o barrigão à mostra; e nas camisetas sensuais cuja estampa simula um corpo feminino sarado trajando apenas top – ou um corpo masculino, musculoso e tatuado. Até as grávidas podem usufruir das novidades. Um dos modelos para esse público é uma blusa listrada com o desenho de um bebê no centro, como se espiasse através de uma persiana o mundo que, logo, logo será seu novo lar.

Analista de mídias sociais acha que produtos deveriam ser mais abrangentes
“Viver as diferenças é tendência”, disse Trecha (Foto: Wilson Lima)

Entre o público, há quem diga nunca ter percebido que, “coincidentemente”, esse nicho do mercado parece ter esquecido os consumidores negros. “Nunca havia parado para pensar sobre isso, mas, é possível acreditar que a indústria está sendo racista”, opinou o analista de mídias sociais Ranieri Trecha, 22. “Eu acredito que ter o olhar sobre a diversidade é ver a oportunidade de mercado para diferentes segmentos e fazer com que todos se sintam parte do ‘todo’ sempre, e não somente na hora de comprar. Viver as diferenças é tendência. Se eu não fosse branco, logicamente iria querer comprar produtos com a minha cor. O preconceito está em não querer ver a possibilidade que existe em diversificar os produtos, afinal vivemos numa diversidade de estilos, raças e crenças”.

Para a formanda do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) Tamires Mendes, 21, talvez o equívoco da indústria do design não esteja sendo proposital, mas não deixa de ser uma atitude que merece atenção. “Eu acredito que é uma falha enorme eles produzirem vários produtos que têm o desenho de membros do corpo humano somente para brancos. Não quer dizer que pessoas negras não possam usar esses produtos, mas fica estranho usar algo que simula um corpo diferente do seu”, comentou. “Espero que as pessoas mudem a forma de pensar e vejam que nós somos todos iguais e que devemos ser respeitados e tratados com dignidade”.

Com a palavra, os profissionais
De acordo com a designer Ingrid Scherdien, 27, conhecer as particularidades do usuário do artefato que está sendo produzido é fundamental para o sucesso de qualquer ideia. “Projetos de design necessitam de uma clara definição do público-alvo ao qual se destinam. Partindo desse princípio e observando esses produtos que brincam com a ‘transparência’, percebe-se que os negros certamente não são o público-alvo dessas peças. Afirmar o racismo com exatidão é complicado, mas, é possível dizer, com certeza, que esse posicionamento é, no mínimo, excludente”, disse. “O comparativo não é exato, mas seria algo como relacionar a produção de roupas que geralmente são feitas nas medidas corpóreas dos mais magros a um preconceito com os mais gordinhos. Ouso ampliar essa percepção para a grande maioria das indústrias, não só de produtos criativos. Talvez, as empresas não considerem os negros como consumidores em potencial, pensando que não é apropriado colocar algo específico em produção que, ao final, não terá saída. Esse mercado ainda não conseguiu absorver a ideia de que os negros possuem plena capacidade de ascender social e financeiramente e consumir tais produtos, assim como todas as outras pessoas”.

"Discurso não deve ser apenas dos afrodescendentes", disse Tereza.
“Discurso não deve ser apenas dos afrodescendentes”, enfatizou Tereza (Foto: Wilson Lima)

Tereza Duarte, 38, que leciona disciplinas de Design no Campus Pelotas – Visconde da Graça (CaVG) do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IF-Sul) e na UCPel, concorda que a comunidade negra não seja cogitada como possível consumidora desses produtos, mas demonstra encarar o tema com mais complexidade. “Enquanto educadora, vejo que ainda temos muito que lutar e avançar nas discussões para que o valor e a cultura do negro sejam mais presentes, em todos os segmentos”, disse, ao sugerir que o assunto não se trata de síndrome de inferioridade ou autocomiseração. “Isso não pode ser apenas um discurso dos afrodescendentes, e acredito que seja este o grande problema: falta, ainda, a sensibilidade e o comprometimento de todos (negros e não-negros) sobre a importância das questões étnico-raciais”, pontuou Tereza, que é formada em Artes Visuais – Habilitação Desenho pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e mestranda em Design pelo Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter), em Porto Alegre.

Teoria e prática
Em 2010, a publicitária e sócia da Tr3s Comunicação Total Danielle Gonzales, então diretora de arte da Agência Experimental de Publicidade da UCPel (Agente), participou da concepção da campanha para a divulgação do Vestibular da universidade. A principal peça da ação era um álbum de figurinhas com ilustrações representando os possíveis alunos da instituição. Danielle, que desenhou todos os personagens, procurou contemplar as diferentes raças no projeto, acolhendo a sugestão dos demais colegas. “Procurei fazer um número parelho de ilustrações para cada raça; lembro que tinha uma menina ruiva, tinham negros, loiros, morenos e um japonês, também. Nos morenos, fui variando o tom da cor de cabelo desde preto até castanho claro, e também os tons de pele, para que o maior número de pessoas pudesse se identificar com as figurinhas”, relembrou. “Creio que os dados estatísticos a respeito das populações negra e branca tenham números bem equilibrados. Pensando assim, não teria porque fazer essa distinção e ofertar produtos apenas para os consumidores brancos”.

Um exemplo da distinção a que Danielle se refere é um case para iPhone que estampa uma mão e uma orelha. O propósito do produto é criar a ilusão de ótica de que, ao atender ao telefone, o indivíduo está apenas levando a mão junto ao rosto. Na página da Internet onde é comercializado, o artigo tem seis apresentações diferentes, sem que nenhuma, porém, faça alusão à raça negra. “Pelo menos uma dessas opções poderia representar um negro, porque, aí, não se enquadraria a desculpa de dificuldade de produção. Pode ser que as empresas tomem essa atitude por considerar uma opção mais barata e por achar que a massa de consumidores se enquadra no ‘padrão pele branca’”, sugeriu Danielle.

Também publicitária e gestora de eventos, Adriana Cunha, 22, vê todo esse processo como um reflexo de valores, como o racismo e o machismo, que são passados para a sociedade com o propósito de atingir determinado objetivo de venda. Muitas vezes, de forma tão enraizada que é aceito como normal. “Mas, preciso, também, falar que vejo um movimento contra isso tudo, uma tentativa de mudança”, ressaltou. “Hoje, estamos mais tolerantes que há anos atrás. Acredito que é um processo em que a publicidade pode e deve ajudar. Os questionamentos que surgem com relação a essa questão e as pessoas que já veem além acabam gerando propagandas com o objetivo de questionar, chocar e tentar alertar para uma possível transformação”.

Sentindo na pele
Em 1994, a modelo internacional e mulher do músico David Bowie, Iman

Modelo criou sua própria linha de maquiagens em 1994
Modelo criou sua própria linha de maquiagens em 1994

Abdulmaji, resolveu lançar sua própria linha de maquiagem. O motivo: cansou de ir às sessões de fotos, encontrar apenas maquiagens ideais para pele branca e ser obrigada a praticamente posar mascarada nos trabalhos em que comparecia. Hoje, Iman não trabalha mais como modelo, mas, é executiva-chefe da própria empresa, que, aliás, vende seus produtos para cerca de duas mil lojas mundo afora, além da Internet.

A história de sucesso de Iman pode, muito provavelmente, ter dado certo por ter sido iniciativa de alguém que sentia literalmente na pele a dificuldade de ser ignorada no universo dos cosméticos. Quase vinte anos depois, empresas do ramo já têm linhas específicas para afrodescendentes, inclusive aqui no Brasil. Mas, basta um olhar mais apurado para perceber que a dica para que os demais segmentos da indústria sigam o mesmo exemplo permanece necessária.

Taís Brem

De tudo um pouco

Teve o Matteo citando Capitu, de Machado de Assis, ao acusar algum político de amnésia – que, por ética, não teve o nome citado. Teve Marroni fotografando a plateia com seu iPhone e sugerindo que seria uma boa a população contar com um transporte coletivo decente para usar seus tablets em paz, na rotina do dia a dia. Teve burburinhos entre os presentes de quem bem que gostaria que isso fosse uma realidade, mas sabe que é um sonho distante. Teve Catarina honrando o público que chegou na hora para assistir à entrevista, marcando seu lugar na mesa reservada aos entrevistados bem antes que todos os outros chegassem. Teve Eduardo, brincando com a proximidade entre uma cadeira e outra na mesma mesa e aproveitando, assim, para exaltar o clima de harmonia que marca essas eleições. Teve eleitor homenageando Eduardo ao beber refrigerante numa garrafa de Coca personalizada com o nome dele. Teve a ausência do Jurandir, que nem sequer foi mencionada ou justificada. E teve a presença de uma plateia além da capacidade que o local suportava.

Parece que o povo realmente estava a fim de ouvir as propostas de campanha dos candidatos à Prefeitura de Pelotas no sufrágio de 07 de outubro próximo. E a oportunidade da vez foi a atividade realizada na noite de quarta-feira (12), no Auditório do Campus II da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), por iniciativa da Coordenação Arquidiocesana de Leigos.

Catarina Paladini, Eduardo Leite, Fernando Marroni e Matteo Chiarelli falaram bastante de saúde, um dos principais problemas que a cidade enfrenta atualmente. Marroni disse, inclusive, que não é aceitável que Pelotas, que conta com duas universidades de Medicina e outros tantos conceituados cursos superiores no segmento, não tenha condições de suprir necessidades de pronto atendimento para desafogar o sempre lotado Pronto Socorro.

Educação foi outro ponto bastante discutido. Matteo assumiu o compromisso de criar mais escolas e aumentar, dessa forma, o número de vagas na educação infantil. Isso sem falar no – tão prometido por todos – pagamento do piso nacional para os professores.

Catarina falou em “postura republicana e diplomática” para garantir a Pelotas um espaço privilegiado na carona do desenvolvimento de Rio Grande. Eduardo foi genérico. Mas, disse, em suma, que para cuidar da cidade, é preciso cuidar das pessoas, pessoas essas que têm o direito de morar numa cidade bonita, limpa, organizada, com trânsito não estressante e blá, blá, blá.

Quem se dispôs a ficar cerca de uma hora e meia sentado ouvindo o que os candidatos tinham a dizer, ou estava ali porque queria prestigiar quem já elegeu para ganhar o seu voto ou porque queria definir quem será o felizardo. Sem dúvida, a segunda postura é a mais difícil de manter. Eles parecem falar a mesma coisa sempre e, como bem ajudou Eduardo, não há como ser muito diferente, afinal a cidade é a mesma, os problemas também e, por conseguinte, assim o são as propostas. O caso é que, como disse Matteo, a população está com raiva, com nojo de política. Até se tenta levar a coisa a sério. Mas o difícil mesmo é saber se, do lado lá, está havendo a mesma seriedade. Como saber quem fala a verdade? O maior medo é acabar caindo na lábia de quem sabe mentir muito bem. Oremos.

Taís Brem

Um novo post

Eu não tive nenhuma outra idéia melhor que essa para um título de um novo post a não ser “um novo post”. E é óbvio que ele teria de ser de frases. Trata-se de uma compilação de algumas declarações de celebridades (ou pseudo-celebridades), umas mais recentes, outras nem tanto assim. Com a correria do dia a dia e o twitter, que simplifica muito o que se quer falar na web, tenho andado meio em falta. Mas pretendo voltar. Esse, então, é o novo primeiro passo! =)
Taís Brem

“As crianças pedem autoridade. Essa coisa debatida com os estudiosos de educação de deixar a criança fazer tudo não é uma demonstração de amor. Ao contrário, amor é dizer ‘não pode’, o que é mais difícil.
Wagner Moura,
ator, sobre educação infantil. A opinião vem bem a calhar no dia em que o presidente pretende assinar um projeto de lei contra as palmadas…

“Sou a voz da Globo no esporte nos últimos 30 anos. Isso é uma coisa que pesa muito, para o bem e para o mal. Mas tenho a exata noção dos limites”.
Galvão Bueno,
narrador.

“Namorarei, noivarei e casarei quantas vezes forem necessárias, até encontrar meu verdadeiro amor”.
Thammy Miranda,
filha de Gretchen, ao dizer que pretende seguir o “exemplo” de tentativas amorosas da mãe. Recentemente, Thammy acabou um relacionamento homossexual com Jenifer Ferracini.

“Sinceramente, achava o Saramago parecido com o Pelé: bom no que faz, desde que calado”.
Dado Schneider,
comunicador, opinando, via twitter, sobre o escritor português, morto mês passado.

“A gente tinha dito que numa das danças terminaríamos com um selinho para mostrar que não temos pudor”.
Renato Zóia,
instrutor de Ana Maria Braga no quadro “Dança dos Famosos”, do Domingão do Faustão, sobre o final estratégico que levantou rumores sobre um possível caso entre os dois. Sem pudor? É, eles conseguiram mesmo atingir o objetivo.

“Ele só sabe dizer que a filha é linda, que tem o bumbum e as perninhas definidinhas, iguais às da mãe “.
Assessora da Scheila Carvalho,
sobre a opinião de Tony Salles, marido da dançarina, a respeito de Giulia, a filha recém-nascida dos dois.

A quem interessar possa

Olhando as estatísticas do blog, atualizei meus conhecimentos acerca da visitação feita por aqui, especialmente nesse tempo em que estive meio off. Então, fazendo jus ao título deste post, a quem interessar possa, estou tornando público o ranking com os dez posts mais visualizados. Além da home page  pura e simples do blog, que já teve mais de 18 mil visitações, aí vai a lista dos textos mais procurados. Se quiser ler também, clica em cima e vai lá. Não esquece dos comentários!

 

Taís Brem

1º – Obama por nove frases, com 575 visualizações: Uma seleção de declarações de anônimos e famosos sobre a vitória do primeiro presidente negro dos EUA.

2º – Salmos e Provérbios, com 392 visualizações: O que o conteúdo da famosa caixinha de promessa tem a ver com Clodovil? Clica e descobre!

3º – A cara jovem do Brasil, com 320 visualizações: O resumo de um levantamento do Datafolha sobre a juventude brasileira. Inclui seleção de frases também!

4º – Irmão Marley, com 304 visualizações: Você sabia que Bob Marley se converteu ao cristianismo pouco antes de morrer? Cazuza também. Leia aqui!

5º – Didático?, com 274 visualizações: Os péssimos exemplos de literaturas nada educativas que têm aparecidos nas prateleiras de bibliotecas escolares.

6º – Anã ou menina prodígio?, com 202 visualizações: De tanto sucesso, o fenômeno infantil Maísa Silva chega a causar até medo.

7º – O filme do Coringa, com 201 visualizações: As bizarrices de um longa em que o coadjuvante quase roubou a cena principal.

8º – Idade não é documento, com 170 visualizações: Uma distinta “senhora de idade” e suas aventuras pela mídia em busca de sexo.

9º – Mate amargo, com 148 visualizações: Um estudo que mostra que o chimarrão pode ser tão tóxico quanto um maço de cigarros. Será?

10º – Frases – parte X, com 114 visualizações: Meu décimo post de frases . Traz declarações curiosas de figuras como Alinne Moraes, Paris Hilton e Rodrigo Santoro.

Didático?

Primeiro foi o Paraguai, aparecendo duas vezes no mapa de um livro de Geografia da sexta série, o que já era péssimo. Agora, por acaso, alguém se deu conta que um erro ainda pior estava presente em publicações destinadas para o terceiro ano do Ensino Fundamental de escolas paulistas. Termos impróprios e de conotação sexual foram encontrados na obra “Dez na Área, Um na Banheira e Ninguém no Gol”, comprada aos montes pela Secretaria Estadual de São Paulo para subsidiar o ensino a estudantes com idade média de nove anos. Nove anos, terceira série… Pode? Dizem os subordinados de José Serra que o “equívoco” será resolvido em breve, já que houve ordem para que os livros sejam recolhidos imediatamente.

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A editora Via Lettera, responsável pela obra, justifica dizendo que o livro é voltado para adultos e adolescentes. “Não sabíamos para qual faixa etária seria destinado. Se soubéssemos, avisaríamos a secretaria”, disse o gerente de marketing da empresa, Roberto Gobatto. Caco Galhardo, cartunista que escreveu a história mais criticada da publicação por causa do conteúdo picante, foi além: “O cara que escolheu não leu o livro”.

Se realmente não leu, apesar de chocante, esta é a única explicação que ameniza o episódio. Mas do que, afinal, trata o livro? Bem, a história cuja autoria pertence a Galhardo, por exemplo, é a caricatura de um programa de mesa-redonda de futebol na TV. Enquanto o comentarista faz perguntas sobre sexo, jogadores e treinadores respondem com clichês de programas esportivos, como “o atleta tem de se adaptar a qualquer posição”. Fraquinho? Hã… Isso para não citar as palavras de baixo calão que constituem os apelidos mais “comuns” usados para ânus e sexo oral, se é que vocês me entendem… Meus filhos não leriam.

Embora tenha reconhecido que houve “falha”, o governo de São Paulo explicou que a intenção foi mais uma ação de boa-fé do “grande esforço que se tem feito para estimular o hábito da leitura” na idade escolar, por meio do projeto “Ler e Escrever”. Afirmou ainda que a infeliz comprinha de R$ 35 mil representa “apenas” um dos 818 títulos que os estudantes têm à sua disposição. Em miúdos, dá só 0,067% do total de publicações disponíveis para leitura na escola ou em casa. Como se o zero à esquerda aliviasse o transtorno.

 

Taís Brem