Incorretos

letrasA placa em frente ao açougue era simples, daquelas escritas com giz branco. E anunciava, entre outras coisas, que ali tinha “figuinho” pra vender. Alguém já disse que o importante para que uma comunicação seja estabelecida é que haja entendimento entre as partes. E parece que, neste ponto, estava tudo certo. Quem passava por ali e lia a placa, entendia a que produto ela se referia: fígado de galinha, o popular “figuinho”, ora bolas!

É claro que se levarmos para o lado linguístico da coisa, sabe-se que “figuinho” deveria ser o diminutivo de “figo”, não de fígado. Mas, como ninguém fala “figadozinho”, a adaptação acaba valendo. Senão nas provas de português, pelo menos no linguajar das ruas. Como na frente daquela casa, onde o pedreiro colocou um cartaz anunciando que faz de tudo: do “alicersso” ao telhado…

É aquele tipo de palavra que todo mundo – ou a maioria, pelo menos – sabe que não é assim que se pronuncia. Mas, pelo costume, acaba ficando tudo desse jeito, incorreto.


Não é difícil encontrar, por exemplo, quem tenha percorrido um trajeto caminhando e diga que veio “de a pé”, em vez de “a pé”, simplesmente. Ou quem tenha feito algo recentemente e explique que “arrecém” realizou tal ação. O correto é “recém”. Porém, mesmo sabendo qual é o certo, quantas pessoas você conhece que falam assim?


Dia desses, descobri que a palavra “subsídio” não se fala com som de “z”, mas com som de “c”. O correto seria “subcídio”, portanto. Compartilhando a informação com uma amiga, ela disparou: “Mentira que esse é o certo? Acho mais bonito continuar falando errado!”. E, de fato, muitas palavras que são adaptadas no nosso dia a dia, devem ter encontrado sua versão popular nessa mesma justificativa: o correto é correto, mas não cai tão bem aos ouvidos. Então, bem-vindos ao mundo incorreto dos “guspes”, “cônjugues”, “sombrancelhas”, “mendingos”, “rúbricas” e companhia limitada. Quem nunca foi adepto delas, que atire a primeira borracha.

Taís Brem
*Texto publicado originalmente no Clicsul.net.

Lembrancinha para todos

Tradicional brincadeira do “amigo secreto” é forma de democratizar presentes

(Foto: Divulgação).
Origem do clássico jogo é desconhecida (Foto: Divulgação).

Tem quem diga que tudo começou como uma forma de homenagem dos povos nórdicos aos deuses pagãos. Há quem defenda que foi na época da Grande Depressão, em 1929, que o hábito se popularizou, em função do aperto nas finanças. O certo é que hoje, pelo menos no Brasil, a brincadeira do amigo secreto – ou oculto – é tradição em grupos de amigos, colegas de trabalho e escola e até nas grandes famílias. Um jeito criativo de ninguém ficar sem presente não apenas no Natal, mas em diversas ocasiões ao longo do ano, como a Páscoa ou reuniões aleatórias.

Para a enfermeira Andressa Calheiros, 22, por exemplo, a brincadeira é interessante pelo aspecto do entrosamento. “Os prós são os momentos de risadas e maior interação entre os participantes, além da descontração”. Quanto aos contras… “Sabe aquelas pessoas que sempre dão presentes bons e ganham presentes muito inferiores ao que deram? Pronto, sou uma dessas!”, comentou, às gargalhadas. “E quando ganho! Já aconteceram, umas duas ou três vezes, de eu dar o presente e não receber, ou por a pessoa estar ausente ou por esquecer de levá-lo… Péssimo!”.

A jornalista Josiele Godinho, 29, participa sempre dos amigos secretos que ocorrem em seu local de trabalho. “É uma maneira de unir mais a equipe e de confraternizar”, opinou. Mas, o ambiente não é exclusivo: em família – que soma mais de 20 membros – a comunicadora também entra na brincadeira. “Na verdade, é uma tradição, uma forma de se divertir em família e entre amigos”, disse ela, que já tem até suas táticas para agradar ao presenteado. “Na família, já conheço bem os gostos de cada um. No trabalho, procuro conhecer mais a pessoa. Entre uma conversa e outra, entre um almoço e outro, a gente vai ‘pescando’ algumas coisas”, confessou.

Variações

"Inimigo secreto" também virou moda (Foto: Divulgação)
“Inimigo secreto” também virou moda (Foto: Divulgação)

O básico é o clássico pacotinho com vários papeis dobrados, cada um contendo o nome de um participante. O nome que se tira corresponde à pessoa que irá ganhar um presente seu no tão esperado dia da revelação, que deve ser feita com dicas para que os outros tentem acertar quem é o felizardo da vez. Entretanto, embora tradicional, a brincadeira do amigo secreto não fica só nisso. Atualmente, há sites que organizam o troca-troca e, também, versões mais divertidas do jogo, como o chamado “inimigo secreto” ou “amigo da onça”, quando cada um escolhe dar um presente inútil ou contrário ao gosto do presenteado.

Taís Brem
*Curta nossa página no Facebook e siga-nos no Twitter #NóisGostaDeFeedback 😉

Se eu soubesse, tinha guardado

Objetos que eram hit no passado, voltam à moda (Foto: Divulgação)
Objetos que eram hit no passado, voltam à moda (Foto: Divulgação)

Meus tios-bisavós Florício e Dininha tinham uma casa encantadora. Passar algumas horas por lá era uma estadia no paraíso, principalmente para as crianças: bolachinhas, geléias, chás, refrigerante, bife, goiabada… Tudo delicioso! Mas, não era só no quesito hospitalidade que eles tiravam nota 10, não. Tinha outra coisa que chamava a atenção de quem visitava aquele lar: a bela cozinha vermelha que eles tinham.

Quando falo de cozinha, não falo de alguns acessórios apenas. Falo de tudo. Tudo – mesmo – naquela cozinha era vermelho: o fogão, a geladeira, a mesa, as cadeiras, as latas de mantimentos… Devia ser moda na época em que eles casaram – lá pela década de 1940, calculo eu, tendo em vista a idade avançada que teriam hoje, caso estivessem vivos.

Toda vez que eu vejo um móvel ou eletrodoméstico daquela cor, lembro da cozinha da tia Dininha e do tio Florício. A moda voltou. E agora tem nome: retrô. Ou vintage. Tudo o que tiver no mercado atualmente com essa terminação, pode crer que é daquele tipo de coisa que você já teve um dia, colocou fora, pensando que nunca mais ia usar, e agora lamenta: “Ah, se eu soubesse… Teria guardado!”.

Pode dar uma olhada por aí. Tanto nas lojas virtuais quanto nas físicas, os tais objetos estão em alta. E o preço deles não fica atrás. Uma vitrola, uma televisão antiga, uma geladeira arredondada, um óculos com uma cara mais antiguinha, uma cristaleira, uma penteadeira, uma câmera analógica… Voltou à moda e, portanto, custa muito caro.

Minha mãe sempre disse que moda é coisa que vai e volta. Mas, do jeito que o consumismo nos afeta, o que virou moda mesmo foi adquirir muito e descartar, também, com a mesma intensidade. O interessante é que esse vai-e-vem não é coisa recente. Realmente, volta e meia, o que se usava numa época, torna a ser tendência algumas eras depois. Talvez, seja a deixa para que a gente comece a observar melhor o que está sendo deixado de lado, gastando menos, economizando e reaproveitando mais. Um dia, você vai poder se orgulhar em dizer: “Ufa! Ainda bem que eu guardei!”.

Taís Brem
*Texto publicado originalmente no Clicsul.net.

Grande novidade

É como se tivesse virado regra: não precisa casar. Vive um tempo junto, para se ter re-al-men-te certeza do que se quer e, depois, casa. Todavia, se não der certo, separa. Mas, não apenas corporalmente. Divorciar-se, direitinho, com papel e tudo, está mais fácil. Agora, quem quer fazê-lo, só precisa desembolsar uns trocados – porque, de graça, nem injeção na testa – e dirigir-se a um cartório de notas. Lá, se encaminha tudo para que o casamento seja desfeito. Uma das únicas ressalvas é que não haja menores de idade envolvidos na tramitação. Porque somente cônjuges de fato responsáveis podem tomar uma decisão como essa.

Há duas semanas, o Jornal Hoje anunciou uma reportagem sobre o assunto. E, quando Sandra Annemberg deu a manchete, parecia até que era novidade. Mas, não. Divorciar-se não está mais fácil “agora”. Já era, desde 2007, quando saiu a lei que descomplica o processo para desfazer um casamento.

A matéria mostrada no telejornal teve como case uma moça que priorizou “ser feliz” e não pensou duas vezes para sair fora da relação matrimonial. Foi até um cartório e pronto: desfez os laços que outrora eram para sempre. As imagens mostravam uma mulher bem-resolvida. E uma criança pequena, provavelmente fruto da união que não deu certo.

Só alguns segundos depois é que ficou claro o que era, de verdade, tudo aquilo. Explicaram que a lei do divórcio rápido não é nada nova. O que sustenta que a notícia deveria ter sido sobre o aumento no número de divórcios do ano passado para este, conforme uma pesquisa divulgada há pouco. Essa, sim, que poderia ser considerada uma “novidade”, apareceu basicamente pincelada. Nem sei se alguém conseguiu entender do que se tratava. A abordagem foi tão confusa que, após o programa, quem procurou revê-la no site do JH, não a encontrou postada entre as matérias daquela edição. Talvez, a produção tenha se dado conta de que o chamariz deveria ter sido mais condizente com a real informação que seria passada. Antes tarde do que nunca.

Ah, e a menininha que apareceu enfatizando a ideia de que, na busca pela felicidade, os filhos são meros coadjuvantes, não era filha do primeiro casamento. Mas, do segundo, ocorrido dez anos depois, do qual a entrevistada diz não se arrepender. “Agora, é tudo diferente.” Fazemos votos que sim.

Taís Brem
*Texto publicado originalmente no Observatório da Imprensa.

Cansei de ter chefe

Preferência pelo empreendedorismo continua crescendo, mas nem tudo são flores

Ideal de independência profissional é um dos principais atrativos para a abertura do próprio negócio (Foto: Divulgação)
Ideal de independência profissional é um dos principais atrativos para a abertura da própria empresa (Foto: Divulgação)

De cada quatro brasileiros, três querem abrir o próprio negócio. É o que mostra uma pesquisa feita pela Endeavor Brasil, com o apoio da Ibope Inteligência, em fevereiro do ano passado. O dado pode ser relativamente antigo, mas continua a expressar a relação da população com o fenômeno do empreendedorismo. Cada vez mais pessoas, qualificadas ou não, desejam se libertar do padrão tradicional de emprego para serem chefes de si mesmas. Na empolgação, tem quem se surpreenda ao perceber que a experiência demanda muito trabalho – não raro, mais do que quando se trabalhava como empregado. E isso torna cada vez mais claro o fato de que ser dono da própria empresa está longe de ser brincadeira.

Martins fundou a própria empresa em 2009 (Foto: Arquivo Pessoal)
Martins fundou a própria empresa em 2009 (Foto: Arquivo Pessoal)

O jornalista Miguel Martins, 39, tinha certa noção disso desde o começo. Mas, depois de trabalhar em diversos setores – de supermercado a imobiliária, passando pela telefonia móvel -, desde os 17 anos, ele se deu conta de que poderia exercer melhor sua atual profissão na condição de empreendedor. “Após me formar em Jornalismo em 2007, observei que eu poderia fazer muito mais pela comunidade local com uma empresa própria do que somente como colaborador”, disse Martins, que é egresso da Universidade Católica de Pelotas (UCPel).

A empresa própria a que ele se refere é a revista Vida Saudável, que objetiva levar aos leitores informações sobre qualidade de vida e bem-estar. A publicação foi lançada em novembro de 2009 e é distribuída gratuitamente em toda a zona Sul do estado. A competitividade local, principalmente no que tange aos patrocínios comerciais, é colocada pelo jornalista como uma das principais dificuldades de levar adiante o negócio. Entretanto, quando questionado se faria tudo de novo, caso pudesse voltar atrás, ele é taxativo: “Sim, com certeza! Mas, teria tentado melhorar ainda mais o início de tudo”.

Cunha também decidiu trabalhar por conta própria (Foto: Arquivo Pessoal)
Cunha também decidiu trabalhar por conta própria (Foto: Arquivo Pessoal)

Arrependimento também não é o lema do analista de sistemas Guilherme Cunha, 27. De 2006 a 2013, ele passou por duas empresas diferentes e era bem remunerado pelo seu trabalho. “Mas, me sentia preso e nem sempre as minhas opiniões eram aceitas”, afirmou, ao explicar que a busca por liberdade profissional foi o que lhe impulsionou a pedir demissão e tornar-se seu próprio patrão.

O começo como proprietário da Data Extreme Consultoria em TI [Tecnologia da Informação] foi difícil e seu projeto ainda não alcançou os 100% de satisfação. “Há muita dificuldade para conseguir novos clientes, mas, aos poucos, tenho conseguido conquistar a confiança do meu público-alvo”, disse Cunha.

Além dos espinhos
Que seguir carreira como empreendedor é um desafio, isso já deu para entender. Porém, não há só problemas. Para Martins, a melhor coisa em ser chefe de si mesmo é a sensação diferenciada de dever cumprido. “Poder chegar em casa no fim do dia e sentir orgulho de fazer um trabalho que leva qualidade de vida para uma considerável fatia da população e saber que pessoas mudaram seus hábitos, deixando o sedentarismo de lado, após lerem a revista, é o melhor de tudo”. Cunha, por sua vez, destaca a conquista de independência. “Não ter que aturar desaforo e má educação por parte dos chefes é uma das melhores recompensas. Acredito que esse seja o motivo pelo qual tantas pessoas optam por seguir esse caminho, principalmente os jovens”.

Inspiração e transpiração

Empreendedorismo exige muito trabalho (Foto: Divulgação)
Empreendedorismo exige muito trabalho (Foto: Divulgação)

Para ser um empreendedor de sucesso algumas habilidades específicas são indispensáveis, como organização, liderança, flexibilidade e perseverança. De acordo com as dicas do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), além disso, ter senso de planejamento é extremamente necessário para que a empresa não apenas seja criada, mas permaneça no mercado e sobreviva frente à concorrência.

Taís Brem
*Curta o Blog Quemany no Facebook e siga-nos pelo Twitter #NóisGostaDeFeedback 😉

Obrigada, não sou macaca

macaco_quemany

A mania de aproveitar o espaço esportivo para exercitar o preconceito – sobretudo, racial – está em alta. Por isso, dia desses surgiu uma nova vítima, o jogador do Barcelona Daniel Alves, que é negro. Parece que ele estava em campo contra o Villareal e foi atingido por uma banana, lançada por um torcedor numa clara tentativa de chamá-lo de macaco. Eu não sei se Alves, por acaso, já tinha pensado com seus botões que reação teria caso fosse alvo de uma atitude assim. O certo é que ele fez o inusitado: parou a bola, pegou a banana, descascou-a e comeu. Para só depois continuar o jogo. Queria, como declarou depois, “rir dos racistas retardados”.

E foi assim que começou essa enorme campanha com a hashtag #SomosTodosMacacos, que está se espalhando pela Internet e além dela. Os pais da ideia? O também jogador de futebol Neymar e a agência de publicidade Loducca.

Eu não conhecia a história desde o começo. E, sinceramente, quando deparei com ela, pensei que era algo mais profundo – Darwin, evolução, macacos, seres humanos, entende? De qualquer forma, contou com meu repúdio desde o início. Porque acredito no criacionismo. Não me conformaria em ser resumida a uma macaca, mesmo que evoluída.

Contudo, quando soube do que, de fato, se tratava a iniciativa, tentei entender pelo lado positivo. As pessoas que têm aderido à campanha, principalmente as celebridades – de Dilma Rousseff a Michel Teló -, parecem querer apenas mostrar que estão do lado dos negros desprezados, que sofrem preconceito dessa forma tão arcaica e sem criatividade. Mas, esse lema soa aos meus ouvidos como um “tiro no pé”, que estimula a associação entre negros e macacos mascaradamente. Ou seja, dá no mesmo. E nesse circo todo, até os macacos resolveram se defender e dizer que não querem ser comparados aos seres humanos. Certo eles. Cada um na sua.

Como negra, agradeço a solidariedade de todos os que aderiram a essa polêmica campanha em prol do respeito às diferenças raciais. Gosto muito de banana, mas gosto ainda mais de respeito. Muito obrigada, mas eu não sou macaca.

Taís Brem
*Texto publicado originalmente no Clicsul.net.