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A ditadura das comemorações

Mesmo em tempos de dinheiro escasso, população continua mantendo hábito de consumir para celebrar efemérides (Foto: Roni Rigon/Agência RBS).
Mesmo em tempos de dinheiro escasso, população continua mantendo hábito de consumir para celebrar efemérides (Foto: Roni Rigon/Agência RBS).

Que o país está passando por uma séria crise econômica, todos sabemos. Mas, o que todos nós também temos conhecimento é de que, por mais apertadas que estejam as finanças, sempre há certo esforço para cumprir o protocolo de presentear em datas comemorativas. Pode ser que, em vez de grandes mimos, dê-se lugar às pequenas lembrancinhas – ou, em tempos de celebração pascal, troque-se os tradicionais e atrativos ovos pelas barras de chocolate. Mesmo assim, aqueles dias destacados no calendário têm um poder já bem conhecido de driblar até mesmo a falta de dinheiro e garantir que a tradição consumista, típica dessas épocas, siga se perpetuando.

Assim, as datas comemorativas são um motivo interessante para ganhar e dar presentes ou tornam-se um compromisso desagradável para quem quer poupar, mas se vê obrigado a sempre compartilhar desses momentos? Para o social media Iago Fernandes, 23, tais festividades têm sua importância, principalmente porque traduzem uma forma de mostrar o afeto e o carinho pelo outro. “As datas [comemorativas] trazem uma boa lembrança, assim como um incentivo ao que se comemora”, disse, ao comentar que, ele e os amigos costumam presentear-se mutuamente nas datas que celebram as profissões de cada um. Para isso, entretanto, até mesmo simples cartões são válidos. “Não precisa comprar necessariamente um bem material. O principal é descrever a intenção de ter chegado àquele contexto”.

Dia dos Namorados é uma das datas em que o comércio mais lucra (Foto: Taís Brem).
Dia dos Namorados é uma das datas em que o comércio mais lucra (Foto: Taís Brem).

De fato, ao presenciar o aumento nas vendas durante épocas próximas a datas comemorativas, percebe-se que grande parte da população também valoriza o hábito e vai além. Segundo o economista Ezequiel Megiato, 27, pela ordem, Natal, Dia das Mães, Dia dos Pais e Dia dos Namorados são os períodos de maior consumo no comércio. “Em função do apelo que as datas exercem sobre as pessoas, aliado ao apelo comercial dos lojistas, nessas datas, os gastos aumentam devido à troca de presentes”, observou. “Evidentemente, muitas pessoas são mais propensas ao consumo e, às vezes, extrapolam o orçamento futuro, já que, quase sempre, optam por compras à crédito e essas compras, posteriormente, devem ser quitadas”. Para ele, que é professor e coordenador do curso de MBE em Controladoria e Finanças da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), há, inclusive, uma contradição quando a questão é economia. Se por um lado seria interessante que as pessoas pensassem formas de celebrar sem gastar tanto, para o comércio local, o melhor mesmo é que haja consumo. “Evidentemente, esse consumo precisa ser racional, para que não tenhamos um cenário de endividamento posterior, o que, seria ruim para as famílias e para o próprio comércio”.

Campanha
Aproveitando o feriadão que começou nesta sexta-feira (25) e encerra-se no domingo (27), a Associação Comercial de Pelotas (ACP) está divulgando uma campanha que reforça a necessidade do investimento por parte da população para aquecer a economia local. A peça relaciona a figura dos sonhos de consumo às compras em lojas da própria cidade para impulsionar o crescimento do comércio pelotense. E, claro, incentiva o público a “não deixar ninguém sem presente nessa Páscoa”.

Para auxiliar quem não quer abandonar a tradição, mas, mesmo assim, pretende aderir a um consumo o mais consciente possível, Megiato deixa algumas dicas: “Antes de consumir qualquer coisa, a recomendação é que se faça as seguintes perguntas: Posso adiar essa compra? Ela é realmente essencial? Quanto eu pagaria por ela à vista? E a prazo? Claro que em um período comemorativo, é difícil que alguém vá adiar a compra de um presente. No entanto, essas perguntas podem, de imediato, postergar o consumo desenfreado e auxiliar no planejamento financeiro pessoal”, finalizou.

Taís Brem

Black Friday made in Brazil

Promoção ocorrida há duas semanas mostrou que empresas ainda tentam enganar o consumidor

No Brasil, promoção tem o negativo rótulo de "Black Fraude" (Foto: Taís Brem)
No Brasil, promoção tem o negativo rótulo de “Black Fraude” (Foto: Taís Brem)

Há duas semanas, está aberta a temporada oficial de compras para as festas de fim de ano. É o que diz a cópia brasileira da tradicional promoção do comércio americano, a tal Black Friday, ocorrida por aqui no dia 29 de novembro. A sexta-feira que antecede o feriado de Ações de Graças na terra do Tio Sam é marcada pela desesperada procura dos clientes por preços mais baratos que os convencionais. Mas, a onda do varejo que existe desde a década de 1960 nos Estados Unidos não tem, pelo menos por enquanto, muita semelhança com o que acontece no Brasil há quatro anos. Se lá, a chamada “sexta-feira negra” é cenário, inclusive, para cenas de violência (onde pessoas cospem umas nas outras ou disparam tiros para garantir pechinchas), aqui o consumidor tem mesmo é que se cuidar para não ser violentado pela esperteza das empresas, que não raro aproveitam a oportunidade para maquiar preços, alardear descontos que, na prática, não existem e faturar em cima da ingenuidade dos clientes.

A tática, apelidada de “Black Fraude”, tem chamado a atenção, até do Procon, o Órgão de Proteção e Defesa do Consumidor, que multa as empresas que comprovadamente usam de “má-fé” com o público. As reclamações registradas por compradores tanto de lojas físicas quanto de virtuais no Procon ou em sites como o Reclame Aqui bateram recorde em 2013: em apenas 12 horas de promoção, havia mais de 5 mil queixas registradas contra 8 mil em um período de 24 horas no ano passado.

Maquiagem comprovada

Pesquisa mostrou resultados da edição 2013 (Foto: Taís Brem)
Pesquisa mostrou resultados da edição 2013 (Foto: Taís Brem)

Uma pesquisa divulgada nesta sexta-feira (13) pelo Programa de Administração de Varejo da Fundação Instituto de Administração (PROVAR/FIA), em parceria com a empresa de monitoramento de preços no comércio virtual Íconna mostrou que 21,5% dos produtos pesquisados apresentou alta de 10,2% nos preços. Ao todo, foram analisadas as variações de preços de 1.312 produtos, como aparelhos de ar condicionado, lavadoras, câmeras digitais, fogões, cooktops, aparelhos de DVD, refrigeradores, filmadoras, impressoras, livros e conjuntos de panelas. Mas, nem tudo foram espinhos: em relação aos produtos com redução, 9,5% dos itens apresentaram desconto médio de 11% nos preços. Embora pareça pouco, os números são menos desagradáveis que em 2012, quando apenas 2,8% dos produtos apresentaram queda média de 6,3%. “Houve promoções e alguns itens apresentaram grandes quedas, mas um consumidor sem referência de preços correu um risco maior de pagar mais caro do que obter um bom desconto no dia da promoção”, afirmou o diretor de pesquisas do Provar e coordenador da pesquisa, Nuno Fouto.

Mesmo com todos os inconvenientes, a edição 2013 da Black Friday Brasil movimentou R$ 424 milhões somente em vendas no ambiente virtual, o que se traduz como 95% a mais do que o registrado em 2012, quando o faturamento chegou a R$ 217 milhões.

Andressa queria um livro e uma camiseta (Foto: Arquivo Pessoal)
Andressa queria um livro e uma camiseta (Foto: Arquivo Pessoal)

A fotógrafa Andressa Barros, 27, estava “enrolando” há um tempão para comprar uma camiseta com a imagem do roqueiro Ozzy Osbourne estampada. Preço básico do objeto de desejo em dias normais: R$ 75,00 mais frete (R$ 16,00 via PAC, a encomenda “econômica” dos Correios, e R$ 34,00 via Sedex, o serviço de encomenda expressa). No dia 29, quando conversou com o Blog Quemany, Andressa tinha acabado de ouvir falar que todas as t-shirts do site paulistano por que se enamorara estavam com preço reduzido: R$ 39,00. A oferta foi uma tentação. “Nunca comprei nada [na Black Friday], mas se essa camiseta fizer parte da promoção, com certeza estrearei minhas compras hoje”, disse, ao citar que também estava de olho num livro de composição fotográfica que estava por R$ 9,00.

Ana e o irmão: sugestão de presente (Foto: Arquivo Pessoal)
Ana e o irmão: sugestão de presente (Foto: Arquivo Pessoal)

A gerente administrativa Ana Carolina Magalhães, 21, queria mesmo era adquirir uma câmera fotográfica. Só que… “Há um mês, ela estava por R$ 699,00 e, na Black Friday, continua com o mesmo preço, mesmo anunciada como promoção. Ou seja, não compensa”, comentou. Para ela, a ilusão dos consumidores se deve ao “vislumbre das propagandas”. “As empresas fazem o cliente acreditar que está fazendo um bom negócio. Só que para se certificar disso, é necessário fazer uma boa pesquisa”, opinou ela, que chegou a postar em seu perfil do Facebook o indignado post “Que Black Friday mais fajuta!”. Contudo, momentos depois, Ana encontrou na promoção uma forma de garantir economia para o bolso do irmão, no caso de ele desejar comprar uma “lembrancinha” para ela: “Aproveita o preço de hoje e já compra meu presente de Natal! Grata!”, cutucou, linkando o site que anunciava a promoção da coleção de 40 DVD’s com as dez temporadas completas do seriado americano Friends.

Coleção de temporadas de seriado estiveram em promoção (Foto: Divulgação)
Coleção de temporadas de seriado esteve em promoção (Foto: Divulgação)

Taís Brem
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Rico dinheirinho

Como as famílias trabalham a educação financeira junto a seus filhos

Mesmo pequenas, crianças já devem aprender noções básicas de finanças (Foto: Divulgação)
Mesmo pequenas, crianças já devem aprender noções básicas de finanças (Foto: Divulgação)

Em alguns lares, ainda hoje é assim: num determinado dia do mês, os pais dão aos filhos uma quantia fixa, chamada mesada, uma espécie de salário que as crianças e adolescentes recebem para administrar, exercitando, assim, sua independência financeira. Em outras residências, o trato recebe o nome de semanada e, portanto, refere-se ao pagamento concedido de semana em semana. Há, ainda, as famílias que investem na caderneta de poupança, separando um valor que, de tempos em tempos, é depositado no banco para custear algum projeto futuro, como o ingresso na universidade. E tem os casos mais simples, em que a educação financeira é praticada no bom e velho cofrinho. Ali, de moeda em moeda, os pequenos vão aprendendo a lidar com o dinheiro.

Longe de ser uma brincadeira, a tarefa de ensinar a administrar as finanças é indicada aos pais por especialistas da área, com o objetivo de colaborar na criação de adultos economicamente responsáveis, desde cedo. Assim, espera-se que aumentem as chances de os pequenos saírem desse processo preparados para enfrentar a selvageria do mundo capitalista em que vivemos.

Em geral, é na faixa dos dois anos de idade que começam a ser reproduzidas em lojas, supermercados e afins aquelas cenas dramáticas que todos nós já cansamos de assistir, cujo texto, salvo ligeiras variações, é sempre “Mãe, me dá isso? Pai, me dá aquilo?”. E é nesse ponto que as noções básicas sobre economia encontram espaço para se desenvolverem. “No mundo moderno, quase tudo tem um preço. Se você quer, por exemplo, um chocolate, deve pagar o valor que o vendedor pede. A mesma coisa acontece com os outros alimentos que você come, com a roupa que você usa, com a luz que ilumina a sua casa à noite, com a água que você usa para tomar banho e com o telefone que você usa para conversar com seus amigos. Como você pode ver, cada coisa tem um preço que se mede com dinheiro”, diz um trecho da cartilha “O que é o dinheiro?”, disponível no site do Banco Central do Brasil (BCB). A cartilha integra o Programa de Educação Financeira, projeto criado pelo BCB para aproximar a comunidade dos conhecimentos sobre economia e finanças.

O público-alvo do projeto não é composto apenas de crianças e adolescentes, mas seu material serve como subsídio para a conscientização dessa faixa etária. As ações educativas de curto, médio e longo prazo estão divididas em cinco pilares básicos – planejamento financeiro, economia, operações financeiras, Banco Central e meio circulante – e incluem, por exemplo, promoção de palestras em universidades, visitas de alunos de Ensino Médio e Fundamental ao Museu de Valores do Distrito Federal e a série de cadernos ilustrativos com textos simples que oferecem uma explicação clara a respeito de temas e conceitos básicos de economia.

Na prática

Kelen e Ariel (Foto: Daniel Avellar)
Kelen e Ariel (Foto: Daniel Avellar)

Ariel Borges tem sete anos. Mas, muito antes de completar essa idade, já havia ganhado de seus avós um cofrinho, que se abastece de moedas toda vez que os patriarcas vão visitá-la. Ela não ganha mesada, entretanto seus pais entendem a importância de ensinar o valor do dinheiro. Tanto que a própria Ariel, quando acompanha a mãe, a estudante Kelen Costa, 28, até o mercado, já sabe quando determinada mercadoria está com o preço alto demais para ser levada para casa.

“Ela sabe distinguir e me diz ‘Hum, isso é caro! Tem tal número na frente; não dá para comprar”, explicou Kelen. Ariel leva tão a sério suas economias que certa vez Kelen pediu emprestado umas moedas do cofre da filha e ouviu um alerta: “Só não pega tudo, porque eu tô guardando para comprar nosso apartamento”, disse a menina. É bem provável que Ariel não tenha noção de quanto custará ao bolso da família adquirir uma casa própria. Mas, o fato de ter sido estimulada a administrar seus trocados está lhe ajudando a ter uma visão mais clara do complexo formato que contorna as transações econômicas do nosso cotidiano. “Do meu ponto de vista, acho que as crianças têm que ter noção de valores, números e quantidade, desde pequenas”, opinou Kelen. “É uma forma de aprendizado. Você ensina e, também, aprende muito com elas”.

Jamile quer ajudar a comprar o carro da família (Foto: Wilson Brem)
Jamile quer ajudar a comprar o carro da família (Foto: Wilson Brem)

A família de Jamile já não vive de aluguel. Portanto, as moedas que guarda em seu cofrinho não serão necessárias para ajudar a subsidiar o sonho de uma nova moradia. Porém, a menina de nove anos tem planos igualmente ousados para alguém de sua idade: quer ajudar a mãe, a auxiliar de Educação Infantil Eloisa Santos, 40, a adquirir um carro. “Não dou mesada a ela, mas dou umas moedinhas, de vez em quando, para ela guardar no cofre. O trato é abrir só quando encher e houver um objetivo”.

De família evangélica, Jamile tem o hábito de separar 10% de tudo o que ganha e direcionar para o dízimo. O restante só é investido após o aval da mãe. “Normalmente, ela pede minha opinião”, comentou Eloisa, ao destacar que considera fundamental ensinar da forma correta para que os filhos não se tornem avarentos.

Nem todas as crianças e adolescentes seguem o exemplo de Ariel e Jamile; preferem custear investimentos bem mais modestos, como o lanche da escola ou o brinquedo do momento. Para Eloisa, entretanto, o principal é orientar para que não haja exageros, nem quanto ao desperdício nem quanto à valorização exacerbada. “Acho que dar dinheiro aos filhos requer, também, orientação. Só dar o dinheiro, sem propósito, não irá edificá-los em nada”, pontuou.

Porquinho de estimação

Tradição de fabricar cofres em formato de porco surgiu na Europa (Foto: Divulgação)
Tradição é europeia (Foto: Divulgação)

Criatividade é o que não falta na hora de inventar novas caras para os tradicionais cofrinhos. Mas, quando se fala de economizar moedas, a primeira imagem que nos vem à cabeça é, inevitavelmente, a de um porquinho. E isso por influência do Velho Continente. Reza a lenda que, por volta do século 16, os europeus costumavam guardar dinheiro em vasinhos feito com um argila chamada “pygg clay”. Mais tarde, o recipiente passou a ser conhecido como “pygg banks”. E, como em inglês, a palavra “piggy” é porquinho, foi daí que os ceramistas tiraram a ideia de começar a fabricar cofres nesse formato. A prova de que a invenção foi um sucesso é que até hoje ela é imitada nos quatro cantos do planeta.

Taís Brem

O desafio de ser sustentável

Como os pelotenses se comportam frente à possibilidade de escassez mundial de água

Mudança de comportamento deve começar pela rotina diária (Foto: Divulgação)
Mudança de comportamento deve começar pela rotina diária (Foto: Divulgação)


Não é novidade para ninguém que a água é um bem esgotável. Estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que, atualmente, 1,6 bilhão de pessoas no planeta vive em região com escassez absoluta de água. E as condições críticas desse quadro, que refletem, sobretudo, na saúde pública, têm tudo para afetar dois terços da população mundial até 2025, se o ritmo do consumo continuar como está, com um quê de despreocupação. Como se não fosse suficiente, desastres relacionados com água – que estão cada vez mais frequentes e intensos – contabilizam 90% dos riscos naturais. Até no Brasil, que é uma das nações mais abundantes em água do planeta, a situação é um problema. Mas, o que a população tem feito para evitar – ou, pelo menos, retardar – um possível colapso ambiental?

Na teoria, o caminho é adotar procedimentos simples no dia a dia, não desperdiçando água enquanto se escova os dentes, ensaboando a louça com a torneira fechada e aposentando a mangueira para lavar o carro com baldes, por exemplo. O desafio está, contudo, em viver esse ideal sustentável e ecologicamente correto na prática.

Para o ecólogo e coordenador florestal Elder Finkenauer, 29, a razão pela qual muitas pessoas ignoram a gravidade da questão está relacionada ao fato do desconhecimento das consequências. “Muitos veem como sendo um exagero, principalmente porque não são afetados pelo problema diretamente”, disse. “A mudança de comportamento é necessária e pode vir em pequenas rotinas, quando as pessoas passarem a valorizar a água como algo precioso, como deve ser”.

A administradora Suzana Lauz, 26, faz parte da parcela da população que não confia totalmente nas estatísticas. “Será que um dia vai faltar água mesmo? Sinceramente, eu não acredito muito. Mas, vá que seja verdade? Por via das dúvidas, eu não economizo, mas, também, não esbanjo”, afirmou.

Na casa da manicure e cabeleireira Andreia Nizolli, 38, a regularidade entre um consumo mais moderado e um gasto maior de água varia. Mas, ela diz acreditar que o ideal seria se todos levassem a sério os alertas para a preservação do recurso. “Que bom que muitas pessoas pensassem que, se continuar o desperdício, isso [os problemas pela falta mundial de água] pode acontecer”, apontou.

Na conta de quem?

Jéssica Farias diz ter consciência do problema ambiental (Foto: Arquivo Pessoal)
Jéssica considera importante poupar água (Foto: Arquivo Pessoal)

Uma coisa é certa: se o bolso não é afetado diretamente, fica bem mais difícil perceber uma mudança de postura. Porém, tanto pela questão mundial de escassez, quanto pelo gasto que um comportamento relapso pode causar às finanças da família, a estudante Jéssica Farias, 19, diz ter consciência da situação. Ela garante que demora entre dez e 15 minutos no banho, não mais. “Acho que é sério e temos que poupar mesmo”, disse. Entretanto, quando a mãe, Simone, entra no assunto, comenta que nem sempre o consumo é assim tão econômico. Quando alguém – além de Jéssica, moram com a cabeleireira outros dois filhos e um neto – fica tempo demais embaixo do chuveiro, ela reclama, batendo na porta do banheiro para mostrar que não está alheia à demora. ”Sei que os aparelhos com resistência têm maior consumo, então, incomodo mesmo. Enquanto eles não me ajudam a pagar as contas, pelo menos, devem colaborar para não gastar demais”, comentou. “O desperdício me incomoda. Detesto ver alguém varrendo a calçada com mangueira ou lava-jato. E o pior é quando a gente questiona e a pessoa responde: ‘Eu é que pago a minha conta de água’”.

Na opinião da universitária Cássia Amaro, 21, a conscientização não deve ser baseada apenas pelo lado do dinheiro. “Mas, pela questão sustentável e prática, afinal a minha geração já sente as consequências, o que dirá a geração dos meus filhos!”, ressaltou. “Uma coisa que muita gente não percebe é que economizar luz, no caso do Brasil, que usa a eletricidade para tudo, inclusive para o aquecimento, é, também, economizar água, mesmo que indiretamente”. Por isso, em sua família, Cássia diz que todos se engajam para economizar ambos – a luz e a água. “Aqui em casa, a gente toma um super cuidado e busca aproveitar a água de todas as maneiras possíveis: a da máquina de lavar é reaproveitada, as torneiras são conferidas para que estejam bem fechadas, os banhos não são demorados e, sempre que a gente lava o carro e a calçada, por exemplo, não fazemos com a mangueira aberta todo o tempo, usamos bastante baldes”.

No início desse ano, a presidente da República Dilma Rousseff divulgou a tão esperada queda nas contas de energia elétrica. A partir de então, a conta de luz está 18,49% mais barata. O impacto da economia foi sentido em muitos lares – e bolsos –, como o do casal de comerciários Monique, 27, e Márcio Coimbra, 37. Eles afirmam que perceberam a diferença e acolheram-na como uma ótima notícia. Mas, confessam que, diante da economia, perder mais tempo no banho é uma tentação. “Já que a conta está mais barata, acabo demorando mais mesmo, porque sei que, até chegar ao valor que era antes, vamos precisar gastar muita água”, afirmou Monique. Além disso, o casal mora num condomínio, onde a conta de água é dividida por todos os moradores, independente do quanto gastam em seus lares, por família. “Muitas vezes, isso faz com que a gente pense: ‘Se temos que pagar mesmo sem usar, não há mal nenhum em gastar um pouco mais”. O marido, porém, demonstra entender que o comportamento deve ser mudado. “Está na hora de gastar menos para sobrar mais água para o planeta, porque essa história de escassez pode não ser bobagem”.

Simone, Cássia e Coimbra estão certos. Assim como o banheiro é o lugar onde mais se gasta água numa residência, conforme a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), os chuveiros elétricos são responsáveis por uma porcentagem significativa no consumo geral de energia da casa. No inverno, inclusive, quando o aparelho normalmente é regulado para aquecer mais a água, o consumo chega a aumentar até 30%.

“E eu, com isso?”

Fábio Roberto e Lia Machado (Foto: Divulgação)
Fábio Roberto e Lia Machado (Foto: Arquivo Pessoal)

O técnico em Contabilidade Fábio Roberto, 36, diz acreditar que o assunto é sério: realmente, pode chegar o dia em que a água não será mais tão acessível para a maior parte dos habitantes da Terra. Mesmo assim, para ele, a sociedade continua se comportando de forma despreocupada, porque não crê que as consequências chegarão à geração atual. “Pode acontecer, mas não vai nos atingir, então, não nos preocupamos. A maioria pensa que não estará mais aqui para sofrer com isso”, disse. Sua mulher, Lia Machado, 48, acha que o caso não é tão simples assim. Moradora do bairro Guabiroba, a secretária cita a escassez que ela e os vizinhos enfrentam durante o verão, quando costuma faltar água na localidade, como um sinal do problema. Finkenauer esclareceu que a falta de água a que Lia se refere não tem a ver com o racionamento mundial, já que a água potável é diferente da água total do planeta. Ainda. “Mas, poderá se tornar no futuro”, alertou o ecólogo.

Vilão ou mocinho?
Por que viver de modo sustentável fica ainda mais difícil quando se está debaixo do chuveiro?

Economia no tempo do banho é boa para o bolso e para o planeta (Foto: Daniel Avellar)
Economia no tempo do banho é boa para o bolso e para o planeta (Foto: Daniel Avellar)

Segundo informações do Serviço Autônomo de Saneamento de Pelotas (Sanep), um banho de chuveiro elétrico de 15 minutos consome aproximadamente 144 litros. Ao fechar o registro enquanto se ensaboa, o consumidor pode economizar mais de 50 litros de água. O grande “problema”, é que, tomar banho está longe de ser apenas o símbolo da higiene completa do corpo. Uma boa ducha é capaz de aliviar dores e estimular a circulação do sangue. Se está frio, a chuveirada ajuda a aquecer o corpo, e, refresca, quando faz calor. É indicada para despertar, mas, também, ajuda para relaxar, depois de um longo dia de trabalho.

Realmente, está para nascer uma prática que se encaixe tão bem nas diversas necessidades do ser humano como o banho. Todavia, a culpa não é apenas dele, que impulsiona bastante o consumo desenfreado no ambiente doméstico. Como causas da escassez que ameaça o planeta estão o esgotamento das reservas naturais de água, o desmatamento, a poluição e a falta de políticas públicas que estimulem o uso sustentável, a participação da sociedade e a educação ambiental. O desperdício ainda pode ser fomentado pelas perdas decorrentes da deficiência técnica e administrativa dos serviços de abastecimento de água, provocadas, entre outros motivos, por vazamentos e rompimentos de redes. Ainda conforme informativo do Sanep, essas perdas se devem à falta de investimentos em programas de reutilização da água para fins industriais e comerciais, “pois, água tratada, depois de utilizada, é devolvida aos rios sem tratamento, em forma de efluentes, esgotos e, portanto, poluída” e inutilizável.

Taís Brem