Arquivo da tag: racismo

Papeando

“Não me venham com ‘evangeliquês’ nem tentem colocar nela a pecha de fanática, porque Marina contraria muita coisa que pastor evangélico pensa”.
Silas Malafaia, pastor, ao rebater as críticas sobre o posicionamento religioso da presidenciável Marina Silva, candidata pelo PSB.

“Depois dessa reportagem, me senti até fora de moda”.
Cristina Ranzolin, âncora do Jornal do Almoço, após a matéria sobre mulheres que vivem mudando a cor do cabelo. A jornalista diz nunca ter feito algo do tipo.

“Eu estou saudável, tenho uma família linda, uma condição de vida boa. Então, não tenho porque sofrer”.
Bruna Marquezine, atriz, ao comentar o término do namoro com o jogador de futebol Neymar Jr.

“Entre os perigos para os adolescentes que dormem pouco estão depressão, pensamentos suicidas, obesidade, mau desempenho na escola e riscos de acidentes de carro por dirigir com sono”.
Judith Owens, diretor de Medicina do Sono do Centro Médico Nacional Infantil de Washington, sobre o estudo divulgado pela Associação Americana de Pediatria (AAP) que recomenda que as escolas iniciem o dia letivo depois das 8h30min, para que os alunos possam ter uma noite adequada de sono.

“Assim como falaram que sou alcoólatra, agora digam o que está acontecendo na Praia Brava de Itajaí”.
Armandinho, cantor, que admitiu ter problemas com álcool e depressão, mas justifica que uma das causas de sua tristeza emocional está relacionada à construção de um prédio de 16 andares em frente à casa do músico em Santa Catarina. “Secaram o lençol freático com uma máquina durante dois meses pra fazer uma p* de condomínio que está rachando as casas ao redor”, complementou.

“Ela significará a chegada de evidentes fenótipos negros no posto da Presidência da República. Isso não é pouco”.
Caetano Veloso, cantor, declarando seu apoio à eleição de Marina Silva.

“Eu casei grávida de quatro meses e tá tudo certo. A vida é bela e o amor existe”.
Angélica, apresentadora, ao tentar encorajar o cantor Júnior Lima e a noiva a aumentar a família mesmo antes de oficializar a relação.

“Nós queremos tirar nossas empresas das páginas policiais dos jornais e introduzí-las nas páginas de economia”.
Aécio Neves, candidato à presidência pelo PSDB, no debate promovido pelo SBT.

“Chávez nosso que estás no céu, na terra, no mar e em nós/ Santificado seja o teu nome, venha a nós o teu legado para ajudar pessoas de aqui e ali”.
Maria Uribe, deputada chavista, ao rezar uma nova versão do Pai Nosso, em honra à memória de Hugo Chávez, durante evento do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV).

“Eu me preocupo tanto quando me xingam pelo Twitter quanto me preocupo ao saber que os motoristas de ônibus da Indonésia entraram em greve”.
Luciana Gimenez, apresentadora, ao ironizar os ataques que, vez ou outra, sofre pelas redes sociais.

“Quando assisto ao VT do jogo me vejo em campo, mas o meu corpo não tem a sensação de ter estado lá”.
Kramer, volante da Seleção Alemã de futebol, que, em função de uma pancada sofrida em campo, não se lembra de ter conquistado a Copa do Mundo de 2014.

“É muito difícil nesse país escreverem personagens para pessoas negras da minha idade”.
Neuza Borges, atriz, que aos 74 anos está com dificuldades financeiras e afastada da telinha.

“Não precisa mais se envergonhar e deletar todo o histórico de navegação com as páginas do PornTube. Ver pornô faz bem”.
Perfil da revista Superinteressante no Facebook, em post sobre estudos a respeito de pornografia.

Taís Brem

Obrigada, não sou macaca

macaco_quemany

A mania de aproveitar o espaço esportivo para exercitar o preconceito – sobretudo, racial – está em alta. Por isso, dia desses surgiu uma nova vítima, o jogador do Barcelona Daniel Alves, que é negro. Parece que ele estava em campo contra o Villareal e foi atingido por uma banana, lançada por um torcedor numa clara tentativa de chamá-lo de macaco. Eu não sei se Alves, por acaso, já tinha pensado com seus botões que reação teria caso fosse alvo de uma atitude assim. O certo é que ele fez o inusitado: parou a bola, pegou a banana, descascou-a e comeu. Para só depois continuar o jogo. Queria, como declarou depois, “rir dos racistas retardados”.

E foi assim que começou essa enorme campanha com a hashtag #SomosTodosMacacos, que está se espalhando pela Internet e além dela. Os pais da ideia? O também jogador de futebol Neymar e a agência de publicidade Loducca.

Eu não conhecia a história desde o começo. E, sinceramente, quando deparei com ela, pensei que era algo mais profundo – Darwin, evolução, macacos, seres humanos, entende? De qualquer forma, contou com meu repúdio desde o início. Porque acredito no criacionismo. Não me conformaria em ser resumida a uma macaca, mesmo que evoluída.

Contudo, quando soube do que, de fato, se tratava a iniciativa, tentei entender pelo lado positivo. As pessoas que têm aderido à campanha, principalmente as celebridades – de Dilma Rousseff a Michel Teló -, parecem querer apenas mostrar que estão do lado dos negros desprezados, que sofrem preconceito dessa forma tão arcaica e sem criatividade. Mas, esse lema soa aos meus ouvidos como um “tiro no pé”, que estimula a associação entre negros e macacos mascaradamente. Ou seja, dá no mesmo. E nesse circo todo, até os macacos resolveram se defender e dizer que não querem ser comparados aos seres humanos. Certo eles. Cada um na sua.

Como negra, agradeço a solidariedade de todos os que aderiram a essa polêmica campanha em prol do respeito às diferenças raciais. Gosto muito de banana, mas gosto ainda mais de respeito. Muito obrigada, mas eu não sou macaca.

Taís Brem
*Texto publicado originalmente no Clicsul.net.

Marciando

“Quando se tem dois filhos, para praticar o pecado da luxúria, é preciso dar umas escapadas”.
Gabriela Duarte, atriz.

“Nós somos comadres: ela é madrinha do meu cachorro”.
susana_quemanySusana Vieira, atriz, sobre a colega Christiane Torloni.

“Eu só gostaria de saber se vocês ainda imitam o Michael Jackson”.
Fátima Bernardes, apresentadora, ao entrevistar a dupla Pepê e Neném e questioná-las sobre a performance que as tornou famosas. A resposta foi um sonoro “Ah, não!”.

“Fazer chimarrão sem termômetro é como dirigir sem velocímetro”.
Pedro José Schwengber, diretor executivo do Instituto Escola do Chimarrão, ao ressaltar a importância de observar bem a temperatura da água com que se prepara o mate ideal. A saber: em torno de 70 graus, nunca fervendo!

“Não esbocei nenhuma reação, porque, se eu corresse ou confrontasse, talvez não estaria aqui hoje relatando o que aconteceu”.
Vinícius Romão,
ator, vendedor e psicólogo, preso injustamente, acusado de assalto, ao mencionar, em entrevista, que o policial que o deteve estava armado.

“Ele foi tratado como um animal e é assim que a maioria do Brasil trata o negro”.
Milton Gonçalves, ator, sobre o mesmo assunto.

mumuzinho_quemany“Não imito, porque as pessoas já falam que eu sou filho dele”.
Mumuzinho, cantor, ao comentar que, embora goste de imitar tipos famosos, tenta evitar as associações com Mussum. O apelido do sambista é uma herança de seu irmão mais velho, que se parecia com o falecido integrante do grupo Os Trapalhões e, por isso, era chamado de Mumu por seus conhecidos.

“Muito importante essa informação. Mudou o seu dia”.
Luciano Huck, ao comentar quanto media o dedo mindinho do pé de uma concorrente ao título Musa do Carnaval 2014 Rio e São Paulo, em seu Caldeirão.

“Tá escrito na ficha!”.
O mesmo, ao explicar, logo depois, porque informou, também, o comprimento do tornozelo de outra candidata… Então…

“Mas, que ódio que me dá desse povo, meu Deus!”.
Fabiana Karla, atriz e jurada do concurso, ao comentar, com ironia, a declaração de uma das candidatas que disse raramente se preparar fisicamente para o Carnaval. O corpo da moça, obviamente, mostrava o contrário…

“O evento tem números impressionantes: você paga R$ 1.000 por uma camiseta para ficar espremido entre 2 milhões de pessoas e zero banheiro por perto. E o mais incrível é que você ainda bebe 259 cervejas e beija 454 garotas”.
Felipe Machado, jornalista e blogueiro do Portal R7, ao definir o Carnaval de Salvador. Deu para notar que o rapaz não curte a festa?

Taís Brem

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Mãos ao alto

O Brasil inteiro acompanhou o noticiário sobre a prisão precipitada e injusta do ator, vendedor e psicólogo Vinícius Romão que foi confundido com um assaltante no Rio. O rapaz ficou em reclusão por 16 dias numa cela com outros 15 detentos. E, ao que tudo indica, o erro foi da vítima, que cismou que fora Romão o responsável por lhe roubar a bolsa em que carregava R$ 10,00, um telefone celular e um cartão de crédito. O policial responsável pela prisão aceitou o depoimento, embora as evidências não batessem com o relato. Porque era negro, da mesma forma que o real criminoso, Romão ficou com a fama de culpado. E só nesta quarta-feira (26) pode desfrutar novamente de liberdade.

O caso não é isolado, disso todos sabemos. O episódio surge com força na mídia e levanta uma bandeira – que, espera-se, seja verídica – de revolta contra o preconceito racial, assim como há algumas semanas ocorreu com o caso vivido pelo jogador de futebol Tinga, no Peru. O esportista, que defende as cores do Cruzeiro, foi hostilizado pelos torcedores do Real Garcilaso, contra quem Tinga jogava pela Taça Libertadores da América. A torcida adversária imitou gritos de macaco para ofender o jogador, que, obviamente, lamentou o ocorrido e declarou que trocaria todos os títulos conquistados em sua carreira por um futebol sem racismo.

O ideal seria que não apenas os campos e arquibancadas dos estádios de futebol fossem limpos desse comportamento nojento, mas todos os setores da sociedade. Como os salões de beleza, por exemplo, de onde surgiu uma detenta há alguns dias, pega em flagrante discriminando uma manicure por ser afrodescendente. A australiana disse que não se sujaria entregando suas mãos a alguém que tinha a pele escura demais para fazer suas unhas. Como se não bastasse, ofendeu, também, o policial que lhe prendeu logo depois, que também era negro. A prisão foi merecida. E a estrangeira, se é que não sabia, ficou a par de que, aqui no Brasil, racismo é crime. Inafiançável, desde a Constituição de 1988.

Bom seria, também, que essas prisões – as adequadas – fossem tão comuns quanto é comum a expressão do preconceito racial. Seria ótimo se o global Big Brother Brasil inovasse com uma visita surpresa e marcante à casa. Nem funkeiros, nem apresentadores ou artistas. Quem sabe algum policial disposto a colocar a legislação em prática? Testemunhas é o que não faltam para comprovar a infelicíssima declaração da tal Fran que dias desses disse que, se não usasse desodorante, ficaria cheirando como uma “neguinha”. Fora um outro participante que já havia feito um comentário tão desastroso quanto, a respeito de seu envolvimento sexual com uma moça “de cor”.

Se é para fazer justiça, que se faça em toda e qualquer situação. Não se trata de espetáculo gratuito. Trata-se de impor limites para que se conheça exatamente o sentido e o exercício da palavra “respeito”.

Taís Brem

*Texto publicado, também, no Reportchê.

Consciência capilar

Liso ou crespo: Qual é o estilo de cabelo que mais valoriza a raça negra?

Para além do Dia da Consciência Negra, tema divide opiniões (Foto: Divulgação)
Para além do Dia da Consciência Negra, tema divide opiniões (Foto: Divulgação)

É fácil presumir que o indivíduo está a fim de potencializar sua negritude quando resolve apostar no black power ou nas tradicionais tranças. Mas, e quando a opção de penteado passa pelo alisamento ou, até, pelas colorações nada comuns à pele negra, como os tons de loiros das luzes e mechas californianas? É exagero afirmar que a escolha por modificar a natureza dos crespos afeta a consciência racial?

O debate é polêmico. Contudo, grande parte das pessoas entrevistadas para esta reportagem acha que sim, é precipitado medir a consciência que alguém tem de sua raça a partir do penteado que escolhe para adornar sua cabeça. Trocando em miúdos, a maioria diz acreditar que não é porque alisa, alonga ou pinta as madeixas segundo o “padrão branco de aceitação” da sociedade que um negro está tentando anular suas raízes.

Especialista no tratamento de cabelos afro, a cabeleireira Simone Santiago estima que 80% das clientes do salão Tranças e Td +, do qual é proprietária, preferem alterar a estrutura dos fios alisando-os, seja à base de produtos químicos ou, simplesmente, com chapinha e escova. “20% prefere os crespos, mas não abrem mão de uma escova lisa vez ou outra para algum evento comemorativo. Já as tranças são sempre bem-vindas, em todos os tipos de cabelos”, destacou. Para ela, cada vez mais as mulheres negras têm se permitido mudar a aparência, à medida que vão passando por cada fase da vida. “Fases marcantes, como 15 anos, formaturas, casamentos, começo ou fim de relacionamentos, novo emprego… E usar cabelo liso ou crespo em cada um desses momentos transcende a consciência racial. Há inúmeros recursos que nos permitem mudar a aparência, conservando a saúde dos fios e expressando nossos sentimentos, conquistas e mudanças sem perder a referência ou a consciência”, enumerou. “Particularmente, essa conversa de que ‘em terra de chapinha, quem tem cabelo crespo é rainha’ é conversa de cabeleireiro preguiçoso. Uma escova bem feita tem seu valor”.

Simone, em suas várias versões (Fotos: Arquivo Pessoal)
Simone, em suas várias versões (Fotos: Arquivo Pessoal)

Engana-se quem lê uma declaração dessas e pensa que é papo de quem quer apenas fazer propaganda de seu trabalho usando a cabeça alheia como cobaia. Com a mesma ênfase com que defende o lado artístico do seu ganha-pão, Simone se dispõe a experimentar os mais diversos tipos de penteados na própria cabeça, em seu cotidiano. A mesma mulher que está de longas tranças na segunda-feira, pode lhe surpreender com um chanel desfiado no dia seguinte, com um mega-hair extravagantemente liso na sexta e com um corte curto, crespo, natural e discreto na próxima semana. Até se apaixonar por uma tintura bem puxada para o azul e mudar novamente. Ela é praticamente uma camaleoa, assim como suas clientes. “Somos negras com estilo e personalidade e podemos, sim, nos expressar através de nossos cabelos, sem parecer um batalhão de ‘tudo a mesma coisa'”, sentenciou a cabeleireira.

“Gosto do carapinho”

Atualmente, jornalista tem preferido os crespos (Foto: Arquivo Pessoal)
Atualmente, jornalista tem preferido os crespos (Foto: Arquivo Pessoal)

Dizem que as mulheres “normais” nunca estão plenamente satisfeitas com sua aparência. Para a jornalista Conceição Lourenço, 53, a afirmação é tão verdadeira que serve para explicar a necessidade de mudança de visual que o sexo feminino expressa em suas transformações. O que, por certo, não é diferente com a raça negra. A dona da cabeleira crespa e exuberante costuma chamar atenção por onde passa, ora por despertar preconceito (“Muita gente olha com desdém e risinhos…”), ora por surtir admiração (“Sábado, por exemplo, duas senhoras brancas me chamaram no shopping para dizer que eu deveria ser modelo. Dei risada e disse que era jornalista. Elas ficaram decepcionadas, mas foi bonitinho”). E há, também, os que demonstram curiosidade. “Um dos porteiros do meu prédio, que é negro, perguntou: ‘Seu cabelo é tão fofo… Não dá trabalho?’. Respondi: ‘É igual ao seu… Deixe crescer e descubra!'”,relembrou, às gargalhadas.

Há alguns anos, Conceição tem deixado as madeixas crescerem de forma natural. E o reflexo que vê no espelho muito lhe agrada. “Não acho que a negra que modifica o cabelo está negando nada, absolutamente. Hoje, acho meu cabelo bonito, mas já alisei. Gosto do carapinho, do crespo e ando gostando cada vez mais. Parece que valoriza meu rosto”.

Na contramão

Wilson, em seu tempo de black power (Foto: Arquivo Pessoal)
Wilson, em sua fase “black power” (Foto: Arquivo Pessoal)

O servidor público Carlos Wilson, 38, já conviveu com o visual da própria mulher, cuja pele é mais escura que a dele, com fios alisados e tingidos de loiro. Mas, é publicamente fã de cachos e tranças. “Para mim, alisar o cabelo e pintar de tons que não têm a ver com a natureza da raça é querer se amoldar ao padrão estético que a sociedade impõe, mesmo que inconscientemente. Até, nós, homens, quando rapamos a cabeça para se livrar da dificuldade de pentear o cabelo estamos fazendo isso”, comentou ele, que já cultivou um cabelão black power há uns cinco anos, mas teve de se desfazer do estilo em nome da praticidade e da apresentação necessária na vida profissional. Agora que tudo o que tem são alguns fios que se encontram com a navalha periodicamente para manter o cabelo baixinho, Wilson se diverte penteando o filho, João Esdras, de um ano. “Vou incentivar o ‘negãozinho’ a valorizar seu cabelo natural e suas raízes afrodescendentes. Pelo menos, até que ele tenha idade para decidir que estilo quer adotar”.

Pai penteando o filho (Foto: Arquivo Pessoal)
Pai penteando o filho (Foto: Arquivo Pessoal)

Taís Brem

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“Ruim é teu passadis”


Na última semana, uma grande fabricante de produtos capilares publicou, em sua página do
Facebook, a foto de uma garota com o penteado da moda: coque com fios bagunçados. A menina tinha cabelo liso e loiro. Muitas curtidas e comentários simpáticos depois, um, em especial, chamou minha atenção: “Acho que vocês deveriam começar a postar dicas para cabelos crespos. Só acho”, sugeriu uma consumidora. A empresa prontamente respondeu que sim, providenciaria dicas que se adaptassem às diversas necessidades das clientes. Foi quando outra consumidora resolveu levar para o lado da ignorância e se meteu na conversa: “Fulana, se seu cabelo é ruim, ninguém pode fazer nada por você!”.

O comentário ridículo teve pouco apoio – uns dois likes, no máximo. A maioria do feedback que a moça recebeu pela sua infeliz colocação foi de reprovação. Não abri a foto para saber se a primeira sugestão veio de uma negra. Mas, quando ela resolveu levantar a bandeira dos cabelos crespos, ficou rotulada, no mínimo, como quem tem problemas graves a cada vez que decide pegar um pente para domar as madeixas, como os proprietários do chamado “cabelo ruim”. Ainda que apenas uma pessoas tenha tido a coragem de expor esse pensamento.

A classificação dada aos cabelos de afrodescendentes não é nova. A variação “cabelo duro”, inclusive, já foi usada para preencher os versos de uma música popular muito cantada lá pelos anos 1990 – ruim, aliás, era a tal música. Alguns diriam que esse “modo de falar”, trata-se apenas de um costume cultural inocente. Mas, para outros, é uma prova de que o preconceito racial que dizem já não existir aqui no Brasil não acabou coisa nenhuma. Afinal, qual é mesmo a métrica que se utiliza para definir se algo é “ruim” ou não? Cabelo de negro é difícil de pentear, é fato. Mas, a palavra ruim carrega consigo um sentido tão pejorativo quanto o que acompanha expressões como “ovelha negra”, “imprensa marrom”, “denegrir a imagem”… É como se o senso comum bradasse que, “se é preto ou negro, basta para ser ruim”. De qualquer forma, como disse meu pai quando conversávamos sobre o assunto há um tempo atrás, a única coisa que destoa dessa realidade é a “grana preta”, que todos querem ter.

Velado ou descoberto, consciente ou inconsciente, o tema merece reflexão sobre a forma com que emprestamos nossas bocas para reproduzir comportamentos preconceituosos que só atrasam o progresso da humanidade.

Se Antônio Carlos Bernardes Gomes, o Mussum, legítimo representante do humor negro, entrasse naquela polêmica facebookiana, seu comentário certamente seria: “Ruim é teu passadis”.

Taís Brem

Texto publicado também no Reportchê.

Design de exclusão

Produtos de apelo inusitado e criativo fazem sucesso no mercado, mas esquecem de contemplar o público negro

avental

Em tempos de design criativo, só consome produtos com cara de convencionais quem quer. Para os mais despojados, divertidos e, até mesmo, autênticos, há materiais com ar de exclusividade que dão um toque especial à decoração da casa ou do próprio corpo. Existem lojas físicas especializadas no ramo, mas é na Internet que os adeptos dessa moda fazem mesmo a festa. Nesse contexto, encontra-se de tudo, inclusive artigos com estampas que simulam a transparência do corpo, que estão no topo das novidades. Um fato, no mínimo, curioso, é que, na maioria das vezes, tais materiais são produzidos apenas para quem tem a pele branca. E descobrir se isso ocorre por uma inocente falta de noção da indústria ou por uma demonstração escancarada de preconceito racial é motivo de debate.

A tendência está nas luvas térmicas que ilustram mãos cheias de anéis; nos aventais divertidos, que sugerem que o cozinheiro está com o barrigão à mostra; e nas camisetas sensuais cuja estampa simula um corpo feminino sarado trajando apenas top – ou um corpo masculino, musculoso e tatuado. Até as grávidas podem usufruir das novidades. Um dos modelos para esse público é uma blusa listrada com o desenho de um bebê no centro, como se espiasse através de uma persiana o mundo que, logo, logo será seu novo lar.

Analista de mídias sociais acha que produtos deveriam ser mais abrangentes
“Viver as diferenças é tendência”, disse Trecha (Foto: Wilson Lima)

Entre o público, há quem diga nunca ter percebido que, “coincidentemente”, esse nicho do mercado parece ter esquecido os consumidores negros. “Nunca havia parado para pensar sobre isso, mas, é possível acreditar que a indústria está sendo racista”, opinou o analista de mídias sociais Ranieri Trecha, 22. “Eu acredito que ter o olhar sobre a diversidade é ver a oportunidade de mercado para diferentes segmentos e fazer com que todos se sintam parte do ‘todo’ sempre, e não somente na hora de comprar. Viver as diferenças é tendência. Se eu não fosse branco, logicamente iria querer comprar produtos com a minha cor. O preconceito está em não querer ver a possibilidade que existe em diversificar os produtos, afinal vivemos numa diversidade de estilos, raças e crenças”.

Para a formanda do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) Tamires Mendes, 21, talvez o equívoco da indústria do design não esteja sendo proposital, mas não deixa de ser uma atitude que merece atenção. “Eu acredito que é uma falha enorme eles produzirem vários produtos que têm o desenho de membros do corpo humano somente para brancos. Não quer dizer que pessoas negras não possam usar esses produtos, mas fica estranho usar algo que simula um corpo diferente do seu”, comentou. “Espero que as pessoas mudem a forma de pensar e vejam que nós somos todos iguais e que devemos ser respeitados e tratados com dignidade”.

Com a palavra, os profissionais
De acordo com a designer Ingrid Scherdien, 27, conhecer as particularidades do usuário do artefato que está sendo produzido é fundamental para o sucesso de qualquer ideia. “Projetos de design necessitam de uma clara definição do público-alvo ao qual se destinam. Partindo desse princípio e observando esses produtos que brincam com a ‘transparência’, percebe-se que os negros certamente não são o público-alvo dessas peças. Afirmar o racismo com exatidão é complicado, mas, é possível dizer, com certeza, que esse posicionamento é, no mínimo, excludente”, disse. “O comparativo não é exato, mas seria algo como relacionar a produção de roupas que geralmente são feitas nas medidas corpóreas dos mais magros a um preconceito com os mais gordinhos. Ouso ampliar essa percepção para a grande maioria das indústrias, não só de produtos criativos. Talvez, as empresas não considerem os negros como consumidores em potencial, pensando que não é apropriado colocar algo específico em produção que, ao final, não terá saída. Esse mercado ainda não conseguiu absorver a ideia de que os negros possuem plena capacidade de ascender social e financeiramente e consumir tais produtos, assim como todas as outras pessoas”.

"Discurso não deve ser apenas dos afrodescendentes", disse Tereza.
“Discurso não deve ser apenas dos afrodescendentes”, enfatizou Tereza (Foto: Wilson Lima)

Tereza Duarte, 38, que leciona disciplinas de Design no Campus Pelotas – Visconde da Graça (CaVG) do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IF-Sul) e na UCPel, concorda que a comunidade negra não seja cogitada como possível consumidora desses produtos, mas demonstra encarar o tema com mais complexidade. “Enquanto educadora, vejo que ainda temos muito que lutar e avançar nas discussões para que o valor e a cultura do negro sejam mais presentes, em todos os segmentos”, disse, ao sugerir que o assunto não se trata de síndrome de inferioridade ou autocomiseração. “Isso não pode ser apenas um discurso dos afrodescendentes, e acredito que seja este o grande problema: falta, ainda, a sensibilidade e o comprometimento de todos (negros e não-negros) sobre a importância das questões étnico-raciais”, pontuou Tereza, que é formada em Artes Visuais – Habilitação Desenho pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e mestranda em Design pelo Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter), em Porto Alegre.

Teoria e prática
Em 2010, a publicitária e sócia da Tr3s Comunicação Total Danielle Gonzales, então diretora de arte da Agência Experimental de Publicidade da UCPel (Agente), participou da concepção da campanha para a divulgação do Vestibular da universidade. A principal peça da ação era um álbum de figurinhas com ilustrações representando os possíveis alunos da instituição. Danielle, que desenhou todos os personagens, procurou contemplar as diferentes raças no projeto, acolhendo a sugestão dos demais colegas. “Procurei fazer um número parelho de ilustrações para cada raça; lembro que tinha uma menina ruiva, tinham negros, loiros, morenos e um japonês, também. Nos morenos, fui variando o tom da cor de cabelo desde preto até castanho claro, e também os tons de pele, para que o maior número de pessoas pudesse se identificar com as figurinhas”, relembrou. “Creio que os dados estatísticos a respeito das populações negra e branca tenham números bem equilibrados. Pensando assim, não teria porque fazer essa distinção e ofertar produtos apenas para os consumidores brancos”.

Um exemplo da distinção a que Danielle se refere é um case para iPhone que estampa uma mão e uma orelha. O propósito do produto é criar a ilusão de ótica de que, ao atender ao telefone, o indivíduo está apenas levando a mão junto ao rosto. Na página da Internet onde é comercializado, o artigo tem seis apresentações diferentes, sem que nenhuma, porém, faça alusão à raça negra. “Pelo menos uma dessas opções poderia representar um negro, porque, aí, não se enquadraria a desculpa de dificuldade de produção. Pode ser que as empresas tomem essa atitude por considerar uma opção mais barata e por achar que a massa de consumidores se enquadra no ‘padrão pele branca’”, sugeriu Danielle.

Também publicitária e gestora de eventos, Adriana Cunha, 22, vê todo esse processo como um reflexo de valores, como o racismo e o machismo, que são passados para a sociedade com o propósito de atingir determinado objetivo de venda. Muitas vezes, de forma tão enraizada que é aceito como normal. “Mas, preciso, também, falar que vejo um movimento contra isso tudo, uma tentativa de mudança”, ressaltou. “Hoje, estamos mais tolerantes que há anos atrás. Acredito que é um processo em que a publicidade pode e deve ajudar. Os questionamentos que surgem com relação a essa questão e as pessoas que já veem além acabam gerando propagandas com o objetivo de questionar, chocar e tentar alertar para uma possível transformação”.

Sentindo na pele
Em 1994, a modelo internacional e mulher do músico David Bowie, Iman

Modelo criou sua própria linha de maquiagens em 1994
Modelo criou sua própria linha de maquiagens em 1994

Abdulmaji, resolveu lançar sua própria linha de maquiagem. O motivo: cansou de ir às sessões de fotos, encontrar apenas maquiagens ideais para pele branca e ser obrigada a praticamente posar mascarada nos trabalhos em que comparecia. Hoje, Iman não trabalha mais como modelo, mas, é executiva-chefe da própria empresa, que, aliás, vende seus produtos para cerca de duas mil lojas mundo afora, além da Internet.

A história de sucesso de Iman pode, muito provavelmente, ter dado certo por ter sido iniciativa de alguém que sentia literalmente na pele a dificuldade de ser ignorada no universo dos cosméticos. Quase vinte anos depois, empresas do ramo já têm linhas específicas para afrodescendentes, inclusive aqui no Brasil. Mas, basta um olhar mais apurado para perceber que a dica para que os demais segmentos da indústria sigam o mesmo exemplo permanece necessária.

Taís Brem

De volta

 

 

“Grandes decisões são tomadas durante conversas na cama, então, estamos pedindo a essas duas senhoras que neste momento de intimidade peçam aos maridos: ‘Querido, você pode fazer alguma coisa pelo Quênia?’”.
Patricia Nyaundi, diretora-executiva da Federação de Advogadas Mulheres (Fida), do Quênia, defendendo a campanha que um grupo de ativistas do país está fazendo em protesto contra as disputas dentro do governo de coalizão. O tema? Greve de sexo… Até as prostitutas de lá serão pagas para entrar na greve e a proposta é convencer também as esposas do presidente Mwai Kibaki e do primeiro-ministro Raila Odinga, protagonistas da crise, a participar.

 

“Estou com medo. Com crise econômica, essa doença e agora isso [o tremor], parece o apocalipse”.

Sarai Luna, cidadã mexicana, comentando seu pavor e o de toda população de seu país em relação à gripe suína e ao tremor de 5,6 graus na escala Richter que ocorreu na Cidade do México.

 

“Não me arrependo de nada, porque adoro minha vida. Adoro até as babaquices que fiz, os sofrimentos que passei. Porque tudo me fez ser o que sou hoje”.

Vera Fischer, atriz

 

“O Ibope não mente. Não teria como me manter num programa ao vivo, no horário nobre, se não fosse por mérito”.

Luciana Gimenez, apresentadora do Super Pop, da Rede TV!, defendendo o programa que é citado como uma das programações onde há mais baixaria na televisão brasileira. E rebate, em tom de sarcasmo: “Não é baixaria, é conflito social”.

 

“Seria bom é que os nomes considerados palavrões se tornassem comuns, sem a carga que têm hoje. Por exemplo: p… é um nome forte, sonoro. Gosto de ser chamada de p…, prostituta. Meretriz, então, acho lindo”.

Gabriela Leite, prostituta aposentada e criadora da grife Daspu.

 

“Eu interpreto um marinheiro e, marinheiro rastafári, não existe, né?”.

Seu Jorge, cantor, explicando que teve de cortar os cabelos para participar das gravações de “Reis e Ratos”, o novo filme de Mauro Lima.

 

“O infeliz Muro de Berlim, na Alemanha, impedia a passagem das pessoas do leste para o oeste. No Rio, não. O morador vai continuar subindo e descendo o morro quando quiser”.

Sérgio Cabral, governador do Rio de Janeiro, sobre seu novo projeto de construir muros em volta de algumas favelas cariocas.

 

“Quando uma pessoa se projeta numa arte qualquer, essa coisa da cor da pele já não pesa. O que mais pesa hoje no problema racial, nos preconceitos, é no social de uma maneira geral. Só”.

Martinho da Vila, cantor, numa análise totalmente zen acerca da problemática do racismo.

Polemizando

 

Quando a polêmica é religião…

 

“Ela sempre acreditou em Deus e cresceu em uma família de religiosos praticantes. Ela espera que virar pastora não só melhore sua vida espiritual como também ajude a aconselhar aqueles que passam por coisas que ela já passou no passado”.

Fonte da revista Star, sobre o anúncio da cantora Britney Spears de que pretende virar pastora quando a carreira pop acabar.

 

…quando a polêmica é nudez…

 

“Foi o momento menos erótico da minha existência. A última coisa que você pensa ali é em sexo. Por mais que seja polêmico, é muito menos erótico que uma passeata no carnaval”.

Rodolfo, ciclista, sobre o evento “Pedalada Pelada”, em que manifestantes nus protestaram pelas ruas da cidade de São Paulo contra a falta de segurança no trânsito para quem usa bicicleta. O slogan escolhido para a atividade foi “nus é como nos sentimos pedalando nesta cidade”…

 

“Os brasileiros associam nudez com sexo e isso me chocou um pouco. Eu vim de família alemã, os valores são outros. Na minha casa, meus pais andavam nus e eu também”.

Vera Fischer, atriz.

 

…quando a polêmica é aborto…

 

“O aborto deve sair da delegacia e entrar no hospital. Deixar de ser crime para se transformar num problema de saúde e responsabilidade pública”.

Tony Belloto, músico e escritor.

 

… quando a polêmica é racismo…

 

“Eu ficava frustrada, porque nenhuma delas era pretinha. Todas tinham os cabelos lisos e louros e eu, com esse cabelo de bucha, de palha de aço. Então, eu apenas cantava as músicas da Xuxa”.

Larissa Luz, vocalista do Araketu, contando o desapontamento que teve na infância, quando não pode ser paquita.

 

… e quando é sexo…

 

“No meu processo espiritual, a relação sexual não tem valor nenhum se não tiver o amor”.

Baby do Brasil, cantora, cristã e solteira, há cinco anos, acerca de sua abstinência de sexo.

 

“Queira ou não, de cada 100 católicos, 99 usam preservativo. O Papa deve entender que a carne é fraca!”.

Alain Fogue, diretor da ONG camaronesa Movimento Camaronês pelo Acesso aos Tratamentos (MOCPAT), sobre o discurso anti-camisinha durante visita do Papa ao país.

 

“Não acho que o amor entre dois homens seja bom ou ruim. É normal”.

Ney Matogrosso, cantor, sobre o homossexualismo.

 

Ô, hein?!

 

“Minha atriz preferida, nunca me esquecerei de você! Tudo por causa da novela ‘Senhora do Destino’”.

Lula, presidente da República, em recente encontro com Susana Vieira, elogiando a atuação da atriz na novela Senhora do Destino (2004/2005). Susana interpretava uma nordestina da terra dele. Vendo novela, hein, presidente?

 

“Me bato muito por expressões como ‘denegrir’, ou ‘a fome é negra’. Quando o poder for mais bem etnicamente distribuído, essas coisinhas de origem racista vão sumir”.

Juliana Alves, atriz, sobre o preconceito racial.

 

“A junção de sagrado e mundano causa estranheza, que pode ser ruim ou ter apelo como bom marketing religioso”.

Clara Mafra, antropóloga e pesquisadora da religião evangélica, sobre a iniciativa da Igreja Renascer, em São Paulo, ao introduzir um ringue de vale-tudo ao lado do altar, como estratégia de evangelismo. Ela diz que a atitude não choca, porque inovar é um hábito dos cristãos. “Nos anos 1940, eles introduziram no Brasil guitarras em cultos. E nos anos 1950, a Assembleia de Deus fez até concursos de miss entre as irmãs. Não deu certo”, disse.

 

“Com muito custo terminei o segundo grau. Se for presa, vou para a galera, não vou ter regalias”.

Paula Lavigne, empresária.

 

“Já posso pegar ônibus de graça e pagar meia-entrada no cinema”.

Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, comentando sua aposentadoria.

 

“A gente tem que se segurar, ciente de que eles não vão ter essa vitória extrema como querem, porque nós adoramos o sagrado, o orixá, e estamos entregue a eles, nossa vida. Evidente que o negativo não vai vencer o positivo”.

Stella de Oxóssi, ialorixá, opinando acerca da rixa entre os umbandistas e os adeptos dos movimentos neopentecostais na Bahia.