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Um incômodo anfitrião

Parece aquela clássica brincadeira de criança em que uma cobre parte da boca com a mão para tentar dificultar o que o ouvido da outra irá captar. Mas, também, poderia ser, simplesmente uma conversa entre loucos. Na ânsia de responder seus internautas com eficácia, a fanpage do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT) tem deixado a desejar. E muito.

Se o simples fato de um remetente verificar que sua mensagem, apesar de visualizada pelo destinatário, não foi respondida já é frustrante, quando, em vez disso, o receptor resolve emitir uma resposta atrás da outra, desesperadamente e de forma desconexa, sem se preocupar com, de fato, resolver o problema em questão, a situação ganha mais um status lamentável: irritante.

Para começar, o site do SBT não dispõe – pelo menos não de maneira clara – de um espaço básico para comunicação com os telespectadores via Internet. Um link ou botão “Fale conosco”, por exemplo. Pois, bem: não tem. Daí a necessidade de recorrer ao Messenger, canal por onde empresas costumam atender de forma rápida e satisfatória seu público.

No caso do SBT, a primeira impressão é a melhor possível. Tão logo percebe que o internauta está em sua página, o sistema emite uma mensagem personalizada de boas-vindas e apresenta alguns dos recursos disponíveis na página – acesso a vídeos, entrevistas, notícias, trechos de capítulos das novelas… Parece simpático. O problema é quando começa a tentativa de diálogo. A cada frase digitada pelo telespectador, na maioria das vezes ligada a alguma dúvida a ser sanada, a emissora lança uma postagem: tem espaço para quiz sobre as Chiquititas, vídeos infantis, manchetes sensacionalistas e tudo quanto é tema ligado à programação do patrão. A pergunta feita por você? Provavelmente não tenha nem sido lida. E se tentar perguntar de novo, lá vem mais bombardeio. Ignore por um dia ou dois as mensagens e eles tornam a insistir. Alguém precisa avisá-los que o método não está funcionando, antes que comecem a empurrar goela abaixo produtos Jequiti…

Taís Brem

A justa saia da coincidência

Na última semana, Fátima Bernardes recebeu, no palco do seu Encontro, o humorista e, agora ator, Ivanildo Gomes Nogueira, o Batoré. Aquele, famoso por cantar os versos “Você pensa que é bonito ser feio?”, por anos a fio, na “Praça é Nossa”, de Carlos Alberto de Nóbrega. Atualmente na Rede Globo, ele está no ar em “Velho Chico”, fazendo o papel de um delegado.
Pois, exatamente no dia em que foi ao programa matinal de Fátima, a principal temática tratada foi a de pessoas que, de tanto contarem piadas sem-graça, podem ser consideradas doentes. Ou portadoras de certo transtorno, para tornar o diagnóstico mais leve. Desde o momento em que pisou no palco, Batoré emendou uma piada na outra, sempre tentando fazer referência ao seu “drama” pessoal – o ser feio -, mas sem surtir o desejado efeito – do riso frouxo – na plateia e nos demais convidados. A própria Fátima chegou a ficar desconcertada várias vezes e, em determinado momento, inclusive, pediu que ele “parasse com essa história de feiúra” e respondesse à pergunta feita, de forma mais objetiva. A atriz Thaila Ayala, também presente na ocasião, teve um surto de sinceridade. “Quando encontrei ele nos bastidores, eu disse: ‘Já sei! Você foi convidado por causa da pauta das piadas!'”. Por outro lado, a anfitriã tentou manter a elegância. Ao entrevistar o médico que comentaria como são identificados os casos graves do transtorno da piada sem-graça, enfatizou que aquele não era o caso de Batoré, uma vez que as piadas que ele contava eram, sim, engraçadas.
A explicação não convenceu muito e, no conjunto da obra, o clima não chegou nem perto do esperado para um ambiente cômico. Se o resultado coincidiu propositalmente com a pauta do programa, não saberemos. A boa notícia é que, se o ramo das risadas não der mais certo para Batoré, pelo menos uma chance para mudar de rumo ele já tem, dadas as boas críticas que tem recebido por conta de seu personagem dramático no horário nobre da emissora global.
Taís Brem
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Graça sem graça

Mais de 60 mil pessoas já curtiram a ideia e para lá de 260 mil compartilharam. Embora não oficial, o movimento de uma fanpage chamada Mussum Sinceris propôs numa postagem, dia desses, que reprises do programa Os Trapalhões (que passou na Globo entre 1969 e 1994) substituam o humorístico Zorra Total, nos sábados à noite.

A bem da verdade, nunca conheci uma pessoa sequer que goste realmente do Zorra, que ria daquelas piadas sem graça, que ache que aquilo deva continuar no ar. A estatística que mostra a quantidade de gente que apoia a saída da atração da grade de programação da Rede Globo, por si só, poderia comprovar isso. Mas, levando em conta que é “apenas” uma proposta facebookiana, restrita aos usuários da rede social, há que se ter certo cuidado.

O que se sabe mesmo é que fazer rir, de verdade, está cada vez mais difícil. E isso, obviamente, não se restringe à emissora de maior audiência no Brasil. A Globo é somente mais um exemplo. O SBT é outro, com seu maior representante do gênero – A Praça é Nossa, criado na década de 1950 e no ar até hoje –, igualmente deficitário em termos de irreverência de qualidade. Em ambos os programas, os tipos são caricatos demais, os atores que os interpretam não têm, sequer, o domínio de controlar as próprias risadas enquanto encarnam os personagens e os textos são sofríveis. O pior é que essa tendência tem invadido outras atrações. As novelas, por exemplo. É óbvio que não é de hoje que os escritores incluem no elenco personagens com uma dose de humor – ninguém aguentaria apenas dramalhão nos folhetins. Mas, o que é Cláudia Raia naquele desespero interpretando a paranormal de Alto Astral? E Paulo Betti, com seu jornalista exageradamente gay na recém-substituída Império? Aguinaldo Silva declarou que estava orgulhoso da atuação de Betti e não conseguia vê-lo encarnar Téo Pereira sem gargalhar a milhões. Eu, como telespectadora, posso estar totalmente fora do padrão, mas discordo dele – a expressão “vergonha alheia” é a única que melhor define o que sinto quando os assisto.

Sílvio Santos diria que se o povo gosta desse tipo de atração, por mais sem graça e bizarra que seja, é isso que o povo vai ter. Afinal, se a audiência está garantida, o resto é mero detalhe. Os intelectuais, por sua vez, diriam que isso é menosprezar a inteligência do povo.

Talvez a Globo esteja testando a aceitação de programas mais antigos com ações como a aplicada no Vídeo Show, há alguns meses. Quem acompanha o programa já percebeu, com certeza que todo santo dia, após a saudação de Otaviano Costa, quem toma as rédeas é o clássico personagem de Chico Anysio, o Professor Raimundo, com sua Escolinha. Seria esse um sinal de que, a qualquer hora, podemos ser surpreendidos com o imortal quarteto de volta à telinha? Só revendo os episódios para saber se valeria a pena. À época da exibição original, Didi, Dedé, Mussum e Zacarias faziam até o poeta Carlos Drummond de Andrade parar em frente à televisão. E isso não me parece pouca coisa. Pelo menos, poderíamos esperar programas um pouco melhores.

Taís Brem
*Texto originalmente publicado no Observatório da Imprensa.

#aletradaspessoas

Tudo bem: o assunto pode ser repetitivo e sem-graça para muita gente. Mas, um fato que ninguém pode negar é que os chamados “memes” são verdadeiras febres virtuais e, dada a repercussão que ganham, fica praticamente impossível não encontrar menção a respeito deles na mídia tradicional.

Se semanas atrás o tal vestido branco e dourado – ou azul e preto – tomou conta da Internet e de outros veículos de comunicação, virando manchete nos jornais, revistas e programas de TV, há alguns dias, o que tem virado notícia é a hashtag “A letra das pessoas”. O movimento on-line consiste, basicamente, em incentivar os usuários da rede a escreverem pequenas mensagens à mão e publicar, uma vez que, por mais simples que seja, o hábito de escrever sem usar o computador virou, para muitos, coisa obsoleta.

Abordagem do Correio Braziliense chamou atenção pela criatividade (Foto: Correio Braziliense).
Abordagem do Correio Braziliense chamou atenção pela criatividade (Foto: Correio Braziliense).

Pois, em vez de, simplesmente, mencionar a adesão de boa parte dos internautas à causa, o Correio Braziliense encontrou uma forma bastante criativa de abordar o assunto. Na quinta-feira (05), o jornal publicou em seu site uma matéria toda manuscrita. O texto em letra cursiva foi assinado pela repórter Luiza Ikemoto e tem três parágrafos. Além de falar acerca da modinha do momento, a reportagem comenta sobre a forma com que a escrita era vista nos tempos do colégio e algumas marcas que acusam a personalidade de quem está escrevendo. Resultado: logo após a publicação – e vários dias depois – a notícia ficou entre as mais lidas da página. Uma ótima inspiração para a imprensa que deseja fugir do convencional e, de quebra, surpreender os leitores.

Taís Brem
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Dinamismo estonteante

Quando Diogo Portugal chamou a colega de palco de “estonteante”, ela rebateu com uma pergunta à altura de sua famosa raridade: “Você está dizendo que eu estou bonita ou que estou tonta?”. O programa em questão era o talk show Luciana by Night, apresentado uma vez por semana por Luciana Gimenez, na Rede TV!. Mas, a piada, planejada ou não, pode vir à memória noutro momento da grade de programação da mesma emissora: o Rede TV News.

É que, de um tempo para cá, a produção do telejornal resolveu fugir do convencional modelo de apresentação na bancada para trazer um pouco mais de dinamismo aos telespectadores. Em função disso, em vez de apenas chamar VTs de reportagens e comentar os assuntos, os âncoras vão adiante, muitas vezes, de forma literal. Não raro, os apresentadores saem do cenário principal e passeiam pelo estúdio, enquanto repassam as notícias à audiência. Caminhando, de um lado para outro, eles mostram vídeos, fotos e textos que estão rolando no site da emissora, entrevistam personagens das reportagens, trocam ideias com os colegas que acabaram de finalizar as matérias que irão ao ar, registram imagens externas, como a da lua gigante, que apareceu no início de setembro, entre outras peripécias.

Fora o exagero e os momentos em que se perdem em meio a tanta liberdade de atuação, os apresentadores desempenham bem a tarefa. Se a ideia era gerar um programa mais dinâmico, com certeza, o objetivo está sendo alcançado. O modelo é semelhante ao que se vê em outros canais, quando os âncoras tentam inovar, dialogando mais abertamente, trocando piadinhas, inventando novos modos de informar a previsão do tempo etc.

O desafio, agora, é manter e aprimorar a qualidade do que mais interessa – a transmissão da notícia – sem que os recursos de apresentação acabem tonteando o telespectador, em vez de embelezar o produto final.

Taís Brem

*Texto publicado também no Observatório da Imprensa.

As capas da derrota

Capa do jornal O Dia em 09/07/14
Capa do jornal O Dia em 09/07/14

Esqueça a ética e a imparcialidade. Pode dar adeus, também, ao bom senso. Afinal, antes de tudo, você é um torcedor brasileiro. Se os editores responsáveis pela capa de grande parte dos jornais nacionais dessem uma aula de como elaborar uma primeira página no último 09 de julho, com certeza essas dicas ganhariam ênfase especial.

Não foi um dia qualquer. Como bem sugeriu o Hora de Santa Catarina, o dia seguinte à amarga derrota da Seleção brasileira para a Alemanha na Copa que sediamos poderia ser chamado de “Quarta-feira de cinzas”. Realmente, os sete gols que levamos geraram um misto de frustração, vergonha e indignação. Porém, o que se viu no dia 09 mostrou a enorme capacidade da imprensa brasileira de não conseguir separar as coisas, enfatizando a máxima de que o futebol é mesmo uma paixão nacional. O negócio acabou, realmente, indo para o lado pessoal.

Se a escolha pela cor preta define bem o sentimento de luto que a torcida brasileira sentiu naquela quarta-feira, muitos foram os jornais que optaram por ela para cobrir suas capas. Uma das mais ousadas foi a do jornal Meia Hora, do Rio, que destacou a frase “Não vai ter capa” – fazendo um trocadilho com o famoso bordão “Não vai ter copa” – e justificou que os editores estavam abalados demais para pensar noutra opção de primeira página. Na contramão, o Lance deixou a capa em branco e sugeriu que os próprios leitores escrevessem nela o que sentiam após o fracasso da Seleção brasileira. Indignação, revolta, pena e frustração foram algumas das sugestões deixadas pela publicação.

Houve quem optasse apenas por palavras únicas de impacto em letras garrafais, como fiasco, vexame, ressaca. O Diário do Nordeste ainda destacou os números que ninguém conseguirá esquecer por um bom tempo: “Humilhação, 7 x 1”. E, logo após: “Foi duro. O placar diz mais que qualquer texto”. O Correio do Povo, de Porto Alegre, resumiu: “1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 x 1. Foi isso”.

O jornal NH conseguiu ser solidário com o nosso camisa 12. Mostrando o goleiro Julio César sentado, atonitamente, o periódico estampou na capa a frase: “Dizer o quê?”. E complementou: “Coitado, não teve o que fazer”. Já o Diário Gáucho desabafou: “6 era sonho. 7 é pesadelo”.

Dentre todos os veículos que aproveitaram para chutar o balde e colocar o sentimento de revolta na frente de qualquer princípio editorial, O Dia, certamente, foi destaque. “Vá pro inferno você, Felipão”, imprimiu, com fúria, a publicação na capa. “Ele ganha cerca de R$ 1 milhão por mês, é o maior garoto-propaganda do país, não treinou, escalou mal e substituiu errado. Foi responsável pela pior humilhação da Seleção em mais de um século de história. Semana passada, questionado sobre suas atitudes, ele disse: ‘Vou fazer do meu jeito. Gostou, gostou. Quem não gostou, vá pro inferno’”, concluiu.

Jornal Extra fez referência à Copa de 1950
Jornal Extra fez referência à Copa de 1950

Mas foi justamente desmistificando a que se considerava a nossa pior derrota como país-sede de um Mundial que o Extra e o Diário de Pernambuco conseguiram se diferenciar dos colegas. As alfinetadas à atual equipe, é claro, não ficaram de lado. Entretanto, o reconhecimento à Seleção de 1950 foi uma sacada interessante e criativa, que acabou virando homenagem. “Parabéns aos vice-campeões de 1950, que sempre foram acusados de dar o maior vexame do futebol brasileiro. Ontem, conhecemos o que é vexame de verdade”, disse o Extra. O Diário de Pernambuco optou pela frase “Barbosa, descanse em paz”, uma alusão à injusta culpa que o goleiro do Brasil na ocasião, Moacir Barbosa Nascimento, carregou até mesmo depois de sua morte, em 2000, por ter tomado dois gols do Uruguai em pleno Maracanã.

No mínimo, um bom material a ser discutido nos cursos de Jornalismo país afora.

Taís Brem
*Texto publicado originalmente no Observatório da Imprensa.

 

Grande novidade

É como se tivesse virado regra: não precisa casar. Vive um tempo junto, para se ter re-al-men-te certeza do que se quer e, depois, casa. Todavia, se não der certo, separa. Mas, não apenas corporalmente. Divorciar-se, direitinho, com papel e tudo, está mais fácil. Agora, quem quer fazê-lo, só precisa desembolsar uns trocados – porque, de graça, nem injeção na testa – e dirigir-se a um cartório de notas. Lá, se encaminha tudo para que o casamento seja desfeito. Uma das únicas ressalvas é que não haja menores de idade envolvidos na tramitação. Porque somente cônjuges de fato responsáveis podem tomar uma decisão como essa.

Há duas semanas, o Jornal Hoje anunciou uma reportagem sobre o assunto. E, quando Sandra Annemberg deu a manchete, parecia até que era novidade. Mas, não. Divorciar-se não está mais fácil “agora”. Já era, desde 2007, quando saiu a lei que descomplica o processo para desfazer um casamento.

A matéria mostrada no telejornal teve como case uma moça que priorizou “ser feliz” e não pensou duas vezes para sair fora da relação matrimonial. Foi até um cartório e pronto: desfez os laços que outrora eram para sempre. As imagens mostravam uma mulher bem-resolvida. E uma criança pequena, provavelmente fruto da união que não deu certo.

Só alguns segundos depois é que ficou claro o que era, de verdade, tudo aquilo. Explicaram que a lei do divórcio rápido não é nada nova. O que sustenta que a notícia deveria ter sido sobre o aumento no número de divórcios do ano passado para este, conforme uma pesquisa divulgada há pouco. Essa, sim, que poderia ser considerada uma “novidade”, apareceu basicamente pincelada. Nem sei se alguém conseguiu entender do que se tratava. A abordagem foi tão confusa que, após o programa, quem procurou revê-la no site do JH, não a encontrou postada entre as matérias daquela edição. Talvez, a produção tenha se dado conta de que o chamariz deveria ter sido mais condizente com a real informação que seria passada. Antes tarde do que nunca.

Ah, e a menininha que apareceu enfatizando a ideia de que, na busca pela felicidade, os filhos são meros coadjuvantes, não era filha do primeiro casamento. Mas, do segundo, ocorrido dez anos depois, do qual a entrevistada diz não se arrepender. “Agora, é tudo diferente.” Fazemos votos que sim.

Taís Brem
*Texto publicado originalmente no Observatório da Imprensa.

Rasa profundidade

Primeiro, a citação de um grande nome, para dar aquela ideia de pesquisa profunda. Depois, a súbita queda de nível. Ocorreu em dois programas de televisão, em duas emissoras diferentes, quando as apresentadoras tratavam de assuntos igualmente diversos. Mas, demonstrou ser uma fórmula bem utilizada no gênero. Na Rede TV!, a repórter entrevistava um desses MC’s que está no topo das paradas de sucesso. Durante o bate-papo, ela resolveu provar ao rapaz que ele não é o único representante do chamado estilo “ostentação”. “Primeiro, começou com Chico Buarque”, disse a moça, com certo ar de intelectualidade, ao referir-se ao compositor da música “Construção”, na qual um amor marcante é narrado, seguido de uma morte trágica.

Quem estava assistindo, até poderia pensar que a produção do programa havia gasto um tempo pesquisando o gênero a fundo entre os representantes de todo o tipo de música nacional – do funk à MPB. Mas, não. Foram até Chico e pararam por ali mesmo. Porque, depois, o que vieram foram os intérpretes de “Lepo-lepo” e companhia limitada. No mínimo, frustrante. Se Chico Buarque estivesse morto, com certeza, teria revirado no túmulo ao se ver incluso numa lista daquelas.

Mas, Adoniran Barbosa deve tê-lo feito quando Angélica, no Estrelas, resolveu listá-lo como uma das personalidades que têm “a cara de São Paulo”. Acontece que a loira caiu no mesmo erro que a colega da Rede TV!: iludiu a audiência com a ideia de uma grande pesquisa no tema, se valendo de uma citação relevante, para, depois, preencher a lista com personalidades mais rasas, como Ana Maria Braga e Serginho Groisman. Está certo que os dois têm seu prestígio artístico, além de serem globais, o que já garante um lugar na lista. Mas mostrou que a arrancada só serviu para tentar impressionar. Acredito que o telespectador se surpreenda com essas quedas bruscas. Ou se começa raso e se mantém o padrão, ou se inicia profundamente e continua fundo. Quente ou frio. Morno, não está pegando bem.

Taís Brem

*Texto publicado originalmente no Observatório da Imprensa.

Mãos ao alto

O Brasil inteiro acompanhou o noticiário sobre a prisão precipitada e injusta do ator, vendedor e psicólogo Vinícius Romão que foi confundido com um assaltante no Rio. O rapaz ficou em reclusão por 16 dias numa cela com outros 15 detentos. E, ao que tudo indica, o erro foi da vítima, que cismou que fora Romão o responsável por lhe roubar a bolsa em que carregava R$ 10,00, um telefone celular e um cartão de crédito. O policial responsável pela prisão aceitou o depoimento, embora as evidências não batessem com o relato. Porque era negro, da mesma forma que o real criminoso, Romão ficou com a fama de culpado. E só nesta quarta-feira (26) pode desfrutar novamente de liberdade.

O caso não é isolado, disso todos sabemos. O episódio surge com força na mídia e levanta uma bandeira – que, espera-se, seja verídica – de revolta contra o preconceito racial, assim como há algumas semanas ocorreu com o caso vivido pelo jogador de futebol Tinga, no Peru. O esportista, que defende as cores do Cruzeiro, foi hostilizado pelos torcedores do Real Garcilaso, contra quem Tinga jogava pela Taça Libertadores da América. A torcida adversária imitou gritos de macaco para ofender o jogador, que, obviamente, lamentou o ocorrido e declarou que trocaria todos os títulos conquistados em sua carreira por um futebol sem racismo.

O ideal seria que não apenas os campos e arquibancadas dos estádios de futebol fossem limpos desse comportamento nojento, mas todos os setores da sociedade. Como os salões de beleza, por exemplo, de onde surgiu uma detenta há alguns dias, pega em flagrante discriminando uma manicure por ser afrodescendente. A australiana disse que não se sujaria entregando suas mãos a alguém que tinha a pele escura demais para fazer suas unhas. Como se não bastasse, ofendeu, também, o policial que lhe prendeu logo depois, que também era negro. A prisão foi merecida. E a estrangeira, se é que não sabia, ficou a par de que, aqui no Brasil, racismo é crime. Inafiançável, desde a Constituição de 1988.

Bom seria, também, que essas prisões – as adequadas – fossem tão comuns quanto é comum a expressão do preconceito racial. Seria ótimo se o global Big Brother Brasil inovasse com uma visita surpresa e marcante à casa. Nem funkeiros, nem apresentadores ou artistas. Quem sabe algum policial disposto a colocar a legislação em prática? Testemunhas é o que não faltam para comprovar a infelicíssima declaração da tal Fran que dias desses disse que, se não usasse desodorante, ficaria cheirando como uma “neguinha”. Fora um outro participante que já havia feito um comentário tão desastroso quanto, a respeito de seu envolvimento sexual com uma moça “de cor”.

Se é para fazer justiça, que se faça em toda e qualquer situação. Não se trata de espetáculo gratuito. Trata-se de impor limites para que se conheça exatamente o sentido e o exercício da palavra “respeito”.

Taís Brem

*Texto publicado, também, no Reportchê.

Mundo paralelo


Particularmente, não lembro disso muito bem. Mas, tenho um amigo que, volta e meia, recorda uma cena que povoou boa parte das manhãs das crianças da década de 1980: a mesa de café da manhã da Rainha dos Baixinhos. Tinha de tudo ali, não só o básico café preto, obviamente. Tinha leite, iogurte e suco. Tinha pão, bolacha e bolo. Tinha geléia, margarina, patê e sabe-se-lá-mais-o-quê! E frutas, muitas frutas. De todas as cores, tamanhos e sabores. Uma mesa farta, de encher os olhos, da qual a apresentadora pegava um grão de alguma coisa e, com o poder de quem pode ignorar toda aquela abundância, seguia o programa, deixando toda a audiência com água na boca. Audiência essa – sempre bom lembrar – que, em sua maioria, não devia ter nem um terço do que estava naquela mesa para provar em sua humilde residência. A mesa de café da manhã da Xuxa era outra realidade. Praticamente, um mundo paralelo. Uma coisa vivida por alguém que parecia estar tão perto, ali, do outro lado da tela, mas, na verdade, estava muito afastada do que ocorre no mundo dos reles mortais.

No dia em que recebeu a atriz Maitê Proença no palco do Video Show, semana que passou, Zeca Camargo bem que podia ter colocado uma trilha da Xuxa de fundo. Talvez os mais espirituosos entendessem o link enquanto o rapaz e sua convidada marcavam num grande mapa-múndi os países que já haviam visitado. Maitê, apresentada como uma viajante nata, jurou nunca ter contado os locais em que já foi durante sua vida inteira, mas fazia ideia de serem umas 70 nações. Camargo se exibiu e foi certeiro: visitou 97 e pretende, em breve, fechar 100. Falou com a naturalidade de quem planeja, depois de amanhã, conhecer o novo minimercado que abriu no bairro vizinho. E isso para um público que, se bobear, não sabe nem que Brasil faz fronteira com o Uruguai.

Daí, o indivíduo que está quebrando a cabeça para ver como vai conseguir completar o dinheiro da passagem do ônibus para o próximo dia de trabalho, se depara com uma notícia-bomba direto do mundo dos esportes: dizem que a fortuna envolvida na compra do Neymar pelo Barcelona não foi “só” de cerca de R$ 188,5 milhões, como o divulgado até então, mas de R$ 284,5 milhões. Um valor que dá nó na cabeça só de tentar contabilizar.

É impossível o cidadão comum não se sentir deslocado com contrastes como esses, que – não é de hoje – pipocam na mídia como se fizessem parte da vida de todos. Para a geral, o jeito é assistir ao lado “vida real” da programação como quem acompanha um programa de ficção. No mínimo, vai doer menos. Para a imprensa, cabe a dica de se adequar melhor à realidade do público que deseja atingir. A menos que os inadequados nessa história toda sejam mesmo os pobres-sonhadores-telespectadores que têm posado de intrusos do outro lado da TV.

Taís Brem

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