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O desafio de ser sustentável

Como os pelotenses se comportam frente à possibilidade de escassez mundial de água

Mudança de comportamento deve começar pela rotina diária (Foto: Divulgação)
Mudança de comportamento deve começar pela rotina diária (Foto: Divulgação)


Não é novidade para ninguém que a água é um bem esgotável. Estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que, atualmente, 1,6 bilhão de pessoas no planeta vive em região com escassez absoluta de água. E as condições críticas desse quadro, que refletem, sobretudo, na saúde pública, têm tudo para afetar dois terços da população mundial até 2025, se o ritmo do consumo continuar como está, com um quê de despreocupação. Como se não fosse suficiente, desastres relacionados com água – que estão cada vez mais frequentes e intensos – contabilizam 90% dos riscos naturais. Até no Brasil, que é uma das nações mais abundantes em água do planeta, a situação é um problema. Mas, o que a população tem feito para evitar – ou, pelo menos, retardar – um possível colapso ambiental?

Na teoria, o caminho é adotar procedimentos simples no dia a dia, não desperdiçando água enquanto se escova os dentes, ensaboando a louça com a torneira fechada e aposentando a mangueira para lavar o carro com baldes, por exemplo. O desafio está, contudo, em viver esse ideal sustentável e ecologicamente correto na prática.

Para o ecólogo e coordenador florestal Elder Finkenauer, 29, a razão pela qual muitas pessoas ignoram a gravidade da questão está relacionada ao fato do desconhecimento das consequências. “Muitos veem como sendo um exagero, principalmente porque não são afetados pelo problema diretamente”, disse. “A mudança de comportamento é necessária e pode vir em pequenas rotinas, quando as pessoas passarem a valorizar a água como algo precioso, como deve ser”.

A administradora Suzana Lauz, 26, faz parte da parcela da população que não confia totalmente nas estatísticas. “Será que um dia vai faltar água mesmo? Sinceramente, eu não acredito muito. Mas, vá que seja verdade? Por via das dúvidas, eu não economizo, mas, também, não esbanjo”, afirmou.

Na casa da manicure e cabeleireira Andreia Nizolli, 38, a regularidade entre um consumo mais moderado e um gasto maior de água varia. Mas, ela diz acreditar que o ideal seria se todos levassem a sério os alertas para a preservação do recurso. “Que bom que muitas pessoas pensassem que, se continuar o desperdício, isso [os problemas pela falta mundial de água] pode acontecer”, apontou.

Na conta de quem?

Jéssica Farias diz ter consciência do problema ambiental (Foto: Arquivo Pessoal)
Jéssica considera importante poupar água (Foto: Arquivo Pessoal)

Uma coisa é certa: se o bolso não é afetado diretamente, fica bem mais difícil perceber uma mudança de postura. Porém, tanto pela questão mundial de escassez, quanto pelo gasto que um comportamento relapso pode causar às finanças da família, a estudante Jéssica Farias, 19, diz ter consciência da situação. Ela garante que demora entre dez e 15 minutos no banho, não mais. “Acho que é sério e temos que poupar mesmo”, disse. Entretanto, quando a mãe, Simone, entra no assunto, comenta que nem sempre o consumo é assim tão econômico. Quando alguém – além de Jéssica, moram com a cabeleireira outros dois filhos e um neto – fica tempo demais embaixo do chuveiro, ela reclama, batendo na porta do banheiro para mostrar que não está alheia à demora. ”Sei que os aparelhos com resistência têm maior consumo, então, incomodo mesmo. Enquanto eles não me ajudam a pagar as contas, pelo menos, devem colaborar para não gastar demais”, comentou. “O desperdício me incomoda. Detesto ver alguém varrendo a calçada com mangueira ou lava-jato. E o pior é quando a gente questiona e a pessoa responde: ‘Eu é que pago a minha conta de água’”.

Na opinião da universitária Cássia Amaro, 21, a conscientização não deve ser baseada apenas pelo lado do dinheiro. “Mas, pela questão sustentável e prática, afinal a minha geração já sente as consequências, o que dirá a geração dos meus filhos!”, ressaltou. “Uma coisa que muita gente não percebe é que economizar luz, no caso do Brasil, que usa a eletricidade para tudo, inclusive para o aquecimento, é, também, economizar água, mesmo que indiretamente”. Por isso, em sua família, Cássia diz que todos se engajam para economizar ambos – a luz e a água. “Aqui em casa, a gente toma um super cuidado e busca aproveitar a água de todas as maneiras possíveis: a da máquina de lavar é reaproveitada, as torneiras são conferidas para que estejam bem fechadas, os banhos não são demorados e, sempre que a gente lava o carro e a calçada, por exemplo, não fazemos com a mangueira aberta todo o tempo, usamos bastante baldes”.

No início desse ano, a presidente da República Dilma Rousseff divulgou a tão esperada queda nas contas de energia elétrica. A partir de então, a conta de luz está 18,49% mais barata. O impacto da economia foi sentido em muitos lares – e bolsos –, como o do casal de comerciários Monique, 27, e Márcio Coimbra, 37. Eles afirmam que perceberam a diferença e acolheram-na como uma ótima notícia. Mas, confessam que, diante da economia, perder mais tempo no banho é uma tentação. “Já que a conta está mais barata, acabo demorando mais mesmo, porque sei que, até chegar ao valor que era antes, vamos precisar gastar muita água”, afirmou Monique. Além disso, o casal mora num condomínio, onde a conta de água é dividida por todos os moradores, independente do quanto gastam em seus lares, por família. “Muitas vezes, isso faz com que a gente pense: ‘Se temos que pagar mesmo sem usar, não há mal nenhum em gastar um pouco mais”. O marido, porém, demonstra entender que o comportamento deve ser mudado. “Está na hora de gastar menos para sobrar mais água para o planeta, porque essa história de escassez pode não ser bobagem”.

Simone, Cássia e Coimbra estão certos. Assim como o banheiro é o lugar onde mais se gasta água numa residência, conforme a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), os chuveiros elétricos são responsáveis por uma porcentagem significativa no consumo geral de energia da casa. No inverno, inclusive, quando o aparelho normalmente é regulado para aquecer mais a água, o consumo chega a aumentar até 30%.

“E eu, com isso?”

Fábio Roberto e Lia Machado (Foto: Divulgação)
Fábio Roberto e Lia Machado (Foto: Arquivo Pessoal)

O técnico em Contabilidade Fábio Roberto, 36, diz acreditar que o assunto é sério: realmente, pode chegar o dia em que a água não será mais tão acessível para a maior parte dos habitantes da Terra. Mesmo assim, para ele, a sociedade continua se comportando de forma despreocupada, porque não crê que as consequências chegarão à geração atual. “Pode acontecer, mas não vai nos atingir, então, não nos preocupamos. A maioria pensa que não estará mais aqui para sofrer com isso”, disse. Sua mulher, Lia Machado, 48, acha que o caso não é tão simples assim. Moradora do bairro Guabiroba, a secretária cita a escassez que ela e os vizinhos enfrentam durante o verão, quando costuma faltar água na localidade, como um sinal do problema. Finkenauer esclareceu que a falta de água a que Lia se refere não tem a ver com o racionamento mundial, já que a água potável é diferente da água total do planeta. Ainda. “Mas, poderá se tornar no futuro”, alertou o ecólogo.

Vilão ou mocinho?
Por que viver de modo sustentável fica ainda mais difícil quando se está debaixo do chuveiro?

Economia no tempo do banho é boa para o bolso e para o planeta (Foto: Daniel Avellar)
Economia no tempo do banho é boa para o bolso e para o planeta (Foto: Daniel Avellar)

Segundo informações do Serviço Autônomo de Saneamento de Pelotas (Sanep), um banho de chuveiro elétrico de 15 minutos consome aproximadamente 144 litros. Ao fechar o registro enquanto se ensaboa, o consumidor pode economizar mais de 50 litros de água. O grande “problema”, é que, tomar banho está longe de ser apenas o símbolo da higiene completa do corpo. Uma boa ducha é capaz de aliviar dores e estimular a circulação do sangue. Se está frio, a chuveirada ajuda a aquecer o corpo, e, refresca, quando faz calor. É indicada para despertar, mas, também, ajuda para relaxar, depois de um longo dia de trabalho.

Realmente, está para nascer uma prática que se encaixe tão bem nas diversas necessidades do ser humano como o banho. Todavia, a culpa não é apenas dele, que impulsiona bastante o consumo desenfreado no ambiente doméstico. Como causas da escassez que ameaça o planeta estão o esgotamento das reservas naturais de água, o desmatamento, a poluição e a falta de políticas públicas que estimulem o uso sustentável, a participação da sociedade e a educação ambiental. O desperdício ainda pode ser fomentado pelas perdas decorrentes da deficiência técnica e administrativa dos serviços de abastecimento de água, provocadas, entre outros motivos, por vazamentos e rompimentos de redes. Ainda conforme informativo do Sanep, essas perdas se devem à falta de investimentos em programas de reutilização da água para fins industriais e comerciais, “pois, água tratada, depois de utilizada, é devolvida aos rios sem tratamento, em forma de efluentes, esgotos e, portanto, poluída” e inutilizável.

Taís Brem

Tudo “azul” em 5, 4, 3…

Em clima de contagem regressiva, Pelotas já recebeu a maioria dos parquímetros que regularão o estacionamento no Centro a partir do dia 26

Estacionamento rotativo entra em vigor nos próximos dias
Estacionamento rotativo entra em vigor nos próximos dias (Foto: Wilson Lima)

A previsão é que daqui a exatos dez dias, a Sertell – empresa responsável pela instalação dos equipamentos que regularão o tempo e cobrarão os motoristas que estacionarem seus veículos na popularmente conhecida “zona azul” – estará com tudo pronto para começar seu trabalho. Vencedora da licitação referente à monitoração do estacionamento rotativo em Pelotas, a empresa já está finalizando a instalação dos parquímetros no quadrilátero formado pelas ruas Doutor Cassiano, Marechal Deodoro, Lobo da Costa e Gonçalves Chaves, incluindo a praça Coronel Pedro Osório.

Nesse trecho, 1.100 vagas serão controladas para, conforme o gerente

Cardozo considera iniciativa positiva
Cardozo considera iniciativa positiva (Foto: Divulgação)

de trânsito da Secretaria de Gestão da Cidade e Mobilidade Urbana (SGMU), Cléo Cardozo, 30, facilitar o estacionamento na área. A partir de então, cada condutor terá que obedecer a um período máximo de permanência no local. Caso contrário, será punido. “O tempo máximo será duas horas. O condutor que desrespeitar, será autuado em uma infração de natureza leve, de R$ 53,20, receberá três pontos na CNH [Carteira Nacional de Habilitação] e, ainda, terá seu veículo removido”, informou.

Cardozo também acrescentou que o estacionamento deve funcionar das 9h às 19h, de segunda a sexta-feira, e das 9h às 13h, aos sábados. A hora estacionada custará R$ 1,50 para carros e caminhões de até dez metros de comprimento. Os únicos veículos isentos de tarifa são as motos, que terão espaço específico para estacionar. Mas, mesmo com as taxas, o gerente diz acreditar que a novidade será aprovada pela população. Também profissional da área, o agente de trânsito Wilson Brem, 37, demonstra opinião contrária, pelo menos em primeira instância. “Não me agrada termos que alugar um espaço público. Existem inúmeras áreas públicas que necessitam de melhorias. Teremos que arcar com esforço financeiro nesses casos, também?”, questionou, ao mencionar que consideraria mais eficiente qualificar a sinalização e subsidiar a fiscalização. “Eu lamento que, para termos um trânsito aceitável, sejamos obrigados a pagar um valor extra, além dos impostos, por utilizar uma área que deveria ser pública, no sentido literal da palavra: sem custo”.

De fato, há sinalizações que permitem ao cidadão estacionar por pouco tempo sem que tenha gastos com isso, como as placas que permitem o estacionamento por 15 minutos, desde que o pisca-alerta esteja ligado. “Passado esse período, o cidadão é onerado financeiramente, com multa, e pode ter o seu veículo removido, para que outro possa utilizar o espaço público”, continuou Brem.

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Tempo de estacionamento será monitorado (Foto: Wilson Lima)

Novo destino para as moedas
Não é de hoje – literalmente, às vésperas da inauguração do estacionamento rotativo na cidade –, que a questão gera a dúvida sobre como ficará a situação dos guardadores de veículos. Em 2011, durante uma Audiência Pública proposta pelo vereador Roger Ney para agilizar o que era apenas um projeto de melhoria urbana, o presidente da Associação dos Guardadores de Carros de Pelotas, Cláudio Oliveira, solicitou que se discutissem alternativas para que o grupo não fosse prejudicado. Os parlamentares concordaram. “Foram abertas, há um tempo atrás, inscrições de cursos profissionalizantes para que os guardadores fossem alocados em outras áreas, mas a procura foi pouca”, disse Cardozo, ao explicar, contudo, que a falta da qualificação oferecida pela Prefeitura não proíbe os trabalhadores autônomos de continuarem atuando. Porém… “Agora, será mais difícil, pois em cada quadra terá um monitor da empresa, que ficará observando o tempo dos veículos estacionados”, afirmou. “Acredito que, pagando o rotativo, as pessoas parem de contribuir com os guardadores, pois acabariam pagando duas vezes”.

A promotora de eventos Francine Baschi, 22, considera que será pouca a diferença entre “pagar pela intimidação dos guardadores” e investir num serviço organizado. Mesmo habilitada para dirigir, ela pouco pega ao volante, mas, quando anda de carona, observa, com pesar, o quanto é diretamente proporcional o tempo desperdiçado para encontrar uma vaga ao valor investido quando se decide, finalmente, optar pelos estacionamentos pagos. “Para mim, que preciso fazer paradas rápidas no Centro, serão ótimos os parquímetros”, comentou. “Só tem que ver se o custo vai valer a pena e se vai funcionar. Em se tratando de serviço público, confesso que até tenho medo!”.

Seguindo exemplos
Na mesma época em que solicitou a Audiência Pública, o vereador Roger Ney usou como argumento o fato de o estacionamento rotativo já ser uma realidade de sucesso em muitos outros lugares, até mesmo menores – como Rio Grande e Bagé, que, juntos, têm menos habitantes que a população de Pelotas.

Militar citou bom exemplo de outros locais
Militar falou sobre benefício ao desenvolvimento local (Foto: Divulgação)

Na opinião do militar carioca Daniel Avellar, 29, que mora aqui há quatro anos e possui Habilitação desde 2004, a maior prova de que o estacionamento rotativo será bem-sucedido em Pelotas é, exatamente, a boa experiência já vivenciada em diversos lugares do Brasil e, até, do mundo. “Quando a cidade começa a crescer, também cresce o numero de carros e a área comercial não comporta todos ao mesmo tempo. É normalmente no Centro da cidade onde tudo acontece. Se as pessoas que dependem desses serviços tiverem seu acesso dificultado, a cidade vai perder”, opinou.

A publicitária Laura Vianna, 24, já observou o funcionamento dos parquímetros em Porto Alegre e diz ter achado positivo. “Porque, dessa forma, terá mais lugares no Centro para estacionar”, explicou. “Claro que haverá o custo, mas, assim, talvez as pessoas pensem ‘duas vezes’ em andar de carro em vez de caminhar mais em pequenas distâncias”.

Laura mora no Areal e dirige até o Centro diariamente para trabalhar. Todavia, ainda que a agência onde atua seja fora do trecho contemplado pelos parquímetros, ela pretende utilizá-los em seu horário de almoço, quando costuma ficar “rodando horas para achar um lugar”. “Como estou sempre com pressa, assim, vai até facilitar”, completou.

O funcionamento
De acordo com o site da Serttel, o estacionamento rotativo público funcionará a partir da utilização de tíquetes virtuais, comercializados através de telefone celular, Internet e em pontos de vendas fixos e móveis. Para fiscalização e controle do uso das vagas, haverá um software especializado de gestão e terminais inteligentes. Entre os benefícios prometidos pela solução estão a disciplina no uso do espaço público; o aumento da rotatividade e da oferta de vagas, melhorando a acessibilidade dos cidadãos no Centro; a maior comodidade para o usuário através de diversos meios de pagamento e aquisição dos tíquetes; e, inclusive, a redução de ocorrências de pequenos acidentes nas vias públicas.

Ao que parece, a população pelotense, no geral, também está com boas expectativas pelo serviço. Na enquete virtual feita pela Câmara de Vereadores, dos 246 votos registrados até a publicação desta reportagem, 170 concordavam com a iniciativa e somente 76 eram contra.

Por que “azul”?
Em Pelotas, o apelido “zona ou área azul” que os estacionamentos rotativos receberam em vários locais onde foram implantados cairá bem, uma vez que combina com o uniforme dos agentes de trânsito, os populares “azuizinhos”. Não há registros se essa foi a associação que originou essa história. Entretanto, o que se sabe até agora é que a área destinada aos parquímetros tem tanto de azul quanto tem de preto as famosas caixas cor-de-laranja que ficam dentro dos aviões.

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Taís Brem