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A justa saia da coincidência

Na última semana, Fátima Bernardes recebeu, no palco do seu Encontro, o humorista e, agora ator, Ivanildo Gomes Nogueira, o Batoré. Aquele, famoso por cantar os versos “Você pensa que é bonito ser feio?”, por anos a fio, na “Praça é Nossa”, de Carlos Alberto de Nóbrega. Atualmente na Rede Globo, ele está no ar em “Velho Chico”, fazendo o papel de um delegado.
Pois, exatamente no dia em que foi ao programa matinal de Fátima, a principal temática tratada foi a de pessoas que, de tanto contarem piadas sem-graça, podem ser consideradas doentes. Ou portadoras de certo transtorno, para tornar o diagnóstico mais leve. Desde o momento em que pisou no palco, Batoré emendou uma piada na outra, sempre tentando fazer referência ao seu “drama” pessoal – o ser feio -, mas sem surtir o desejado efeito – do riso frouxo – na plateia e nos demais convidados. A própria Fátima chegou a ficar desconcertada várias vezes e, em determinado momento, inclusive, pediu que ele “parasse com essa história de feiúra” e respondesse à pergunta feita, de forma mais objetiva. A atriz Thaila Ayala, também presente na ocasião, teve um surto de sinceridade. “Quando encontrei ele nos bastidores, eu disse: ‘Já sei! Você foi convidado por causa da pauta das piadas!'”. Por outro lado, a anfitriã tentou manter a elegância. Ao entrevistar o médico que comentaria como são identificados os casos graves do transtorno da piada sem-graça, enfatizou que aquele não era o caso de Batoré, uma vez que as piadas que ele contava eram, sim, engraçadas.
A explicação não convenceu muito e, no conjunto da obra, o clima não chegou nem perto do esperado para um ambiente cômico. Se o resultado coincidiu propositalmente com a pauta do programa, não saberemos. A boa notícia é que, se o ramo das risadas não der mais certo para Batoré, pelo menos uma chance para mudar de rumo ele já tem, dadas as boas críticas que tem recebido por conta de seu personagem dramático no horário nobre da emissora global.
Taís Brem
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Graça sem graça

Mais de 60 mil pessoas já curtiram a ideia e para lá de 260 mil compartilharam. Embora não oficial, o movimento de uma fanpage chamada Mussum Sinceris propôs numa postagem, dia desses, que reprises do programa Os Trapalhões (que passou na Globo entre 1969 e 1994) substituam o humorístico Zorra Total, nos sábados à noite.

A bem da verdade, nunca conheci uma pessoa sequer que goste realmente do Zorra, que ria daquelas piadas sem graça, que ache que aquilo deva continuar no ar. A estatística que mostra a quantidade de gente que apoia a saída da atração da grade de programação da Rede Globo, por si só, poderia comprovar isso. Mas, levando em conta que é “apenas” uma proposta facebookiana, restrita aos usuários da rede social, há que se ter certo cuidado.

O que se sabe mesmo é que fazer rir, de verdade, está cada vez mais difícil. E isso, obviamente, não se restringe à emissora de maior audiência no Brasil. A Globo é somente mais um exemplo. O SBT é outro, com seu maior representante do gênero – A Praça é Nossa, criado na década de 1950 e no ar até hoje –, igualmente deficitário em termos de irreverência de qualidade. Em ambos os programas, os tipos são caricatos demais, os atores que os interpretam não têm, sequer, o domínio de controlar as próprias risadas enquanto encarnam os personagens e os textos são sofríveis. O pior é que essa tendência tem invadido outras atrações. As novelas, por exemplo. É óbvio que não é de hoje que os escritores incluem no elenco personagens com uma dose de humor – ninguém aguentaria apenas dramalhão nos folhetins. Mas, o que é Cláudia Raia naquele desespero interpretando a paranormal de Alto Astral? E Paulo Betti, com seu jornalista exageradamente gay na recém-substituída Império? Aguinaldo Silva declarou que estava orgulhoso da atuação de Betti e não conseguia vê-lo encarnar Téo Pereira sem gargalhar a milhões. Eu, como telespectadora, posso estar totalmente fora do padrão, mas discordo dele – a expressão “vergonha alheia” é a única que melhor define o que sinto quando os assisto.

Sílvio Santos diria que se o povo gosta desse tipo de atração, por mais sem graça e bizarra que seja, é isso que o povo vai ter. Afinal, se a audiência está garantida, o resto é mero detalhe. Os intelectuais, por sua vez, diriam que isso é menosprezar a inteligência do povo.

Talvez a Globo esteja testando a aceitação de programas mais antigos com ações como a aplicada no Vídeo Show, há alguns meses. Quem acompanha o programa já percebeu, com certeza que todo santo dia, após a saudação de Otaviano Costa, quem toma as rédeas é o clássico personagem de Chico Anysio, o Professor Raimundo, com sua Escolinha. Seria esse um sinal de que, a qualquer hora, podemos ser surpreendidos com o imortal quarteto de volta à telinha? Só revendo os episódios para saber se valeria a pena. À época da exibição original, Didi, Dedé, Mussum e Zacarias faziam até o poeta Carlos Drummond de Andrade parar em frente à televisão. E isso não me parece pouca coisa. Pelo menos, poderíamos esperar programas um pouco melhores.

Taís Brem
*Texto originalmente publicado no Observatório da Imprensa.

Palavreado

“O demônio não está dentro do saco de farinha de trigo”.
Ailin Aleixo, blogueira do Gastrolândia, ao opinar que a “ditadura antiglúten” poderia ser eliminada do mundo gastronômico em 2015.

“Cabe a nós tirar o foco do escândalo”.
Nathalia Timberg, atriz, ao comentar sobre o tom natural que pretende dar à personagem lésbica na próxima novela global das 21h, “Babilônia”. Fernanda Montenegro será seu par romântico.

“Quero pedir a mão ao pai, comunicar à família, quero fazer tudo direitinho”.
Pedro Bial, apresentador, ao comentar como pretende oficializar seu relacionamento com a jornalista Maria Prata.

“A porcaria inteira do show é um desastre. Não considero isso boa televisão”.
Kai Hibbard, vencedora da quarta edição do reality show de emagrecimento Biggest Loser, da emissora americana NBC, ao se dizer envergonhada de ter participado da atração e ter a obrigação de alertar novos candidatos sobre o abuso físico e psicológico que diz ter sofrido lá.

“Não tenho muito tempo para acompanhar os times, mas Corinthians e Flamengo são clubes conhecidos e que vestiria a camisa tranquilamente”.
Cristiano Ronaldo, jogador, sobre o futebol brasileiro. Atualmente, ele atua como atacante do Real Madrid.

“Não consigo vê-lo no ar sem deixar que funcione a mil minha máquina de fazer gargalhadas”.
Aguinaldo Silva, autor de novelas, orgulhoso de seu personagem gay Téo Pereira, interpretado por Paulo Betti, em “Império”.

“Nesse caso , pode”.
Evaristo Costa, apresentador do Jornal Hoje, ao relacionar as notícias de desperdício de água com o inusitado fato de uma arara azul ter aprendido a abrir sozinha uma torneira para se refrescar, em Mato Grosso.

“Perdeu. Calor é grande”.
Bilhete deixado por ladrão que furtou três aparelhos de ar-condicionado em uma escola catarinense.

“Lamentamos profundamente que a galeria de fotos com Fernanda Gentil aproveitando a praia no Rio de Janeiro possa ter constrangido a jornalista, principalmente nesse momento especial na vida de qualquer mulher, que é a gravidez”.
Nota do portal de notícias R7, da Record, que publicou fotos da jornalista global, comentando que ela estaria com uns “quilinhos a mais”. Após o “mal-entendido”, a apresentadora anunciou que está grávida de dois meses.

“Desculpas aceitas, Record. Porque o perdão é uma das primeiras virtudes que quero ensinar ao meu(minha) filho(a)”.
Fernanda Gentil, jornalista, em resposta ao comunicado.

“Tá ficando um gatinho. Falta uma barbinha”.
Marie Carly, internauta, opinando sobre o novo visual da atriz lésbica Thammy Miranda que, após passar por uma cirurgia para a retirada dos seios, está malhando os braços para ficar mais musculosa e masculina.

“Quando estamos confortáveis, estamos anestesiados demais pra fazermos as mudanças necessárias”.
Reynaldo Gianecchini, ator, em relato sobre o transplante de medula que, há três anos, salvou sua vida.

Taís Brem
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Muito além da “Biritis”

Em 2014, completam-se 20 anos da morte de Mussum. Mas, ao que parece, o legítimo representante do humor negro continua mais vivo do que nunca

mussumO próximo dia 19 de agosto será marcado pelo lançamento da cerveja artesanal “Biritis”, produzida em homenagem ao humorista Antônio Carlos Bernardes Gomes, o Mussum. Um dos idealizadores e sócios da cervejaria Brassaria Ampolis, seu filho Sandro Gomes, acertou ao dizer que “com um garoto-propaganda desses, o sucesso da marca está garantido”, ainda mais nos dias atuais. Também pudera. Muito antes de a bebida sonhar em existir, várias homenagens póstumas já vinham surgindo na mídia, cativando, até mesmo, os que nem eram nascidos quando o país perdeu um de seus artistas mais engraçados.

Bastou uma enquete informal com a pergunta “Qual dos Trapalhões era o seu favorito?” para comprovar o que já estava implícito. Manfried Sant’anna sequer foi citado. O terceiro lugar ficou para o líder do grupo, Renato Aragão, com apenas um voto. Também já falecido, Mauro Faccio Gonçalves pontuou bem, graças a sua boa impressão junto aos fãs, aparecendo como segunda opção. Mas, é mesmo de Antônio Carlos o mérito do primeiro lugar. Traduzindo, não é exagero dizer que Dedé, Didi e Zacarias devem boa parte da popularidade do quarteto mais famoso da televisão brasileira ao personagem Mussum, mesmo às vésperas dos vinte anos de sua morte.

O contabilista Lázaro Ferreira simpatizava com o humorista pela identificação com a raça negra, o samba e o modo “diferente” de falar – o consagrado vocabulário com a terminologia “is”, que acabou gerando bordões como o “cacildis” e o “forévis”. “Considero que ele seria um comediante melhor que o próprio Renato Aragão, nos dias de hoje. E acho que, além de estar conhecendo o trabalho que ele fazia, a nova geração, que não o viu, somente ouviu falar, está gostando, aprovando e se identificando”, destacou.

O universitário Anderson Rodrigues, que tinha apenas sete anos à época da morte de Mussum, concorda: “Ele é ‘o cara’. Penso que é importante manter viva a memória desse humorista e é uma excelente oportunidade para as novas gerações conhecerem”, disse, sobre a faixa etária na qual ele mesmo se inclui.

Na infância do músico e fotojornalista Solano Ferreira, 37, a influência do seriado foi tão intensa que, até hoje, sempre que presencia uma cena desastrada, ele faz questão de puxar a trilha sonora que marcou a abertura do programa. “Meus domingos eram divididos entre antes e depois dos Trapalhões. Inclusive, chorei quando os dois integrantes [Zacarias, em 1990, e Mussum, em 1994] morreram, porque os quatro para mim é que faziam a diferença. Juntos, eles eram insuperáveis. É que nem separar o Gordo do Magro ou um dos Três Patetas, que eu também sou super fã!”, comentou.

Weilla considera o humor do passado mais inocente
Weilla considera o humor do passado mais inocente

Para a atriz Weilla Martha, 28, Mussum e Zacarias eram os prediletos. Porém, os jargões e as frases de expressão próprios de Antônio Carlos cativavam mais sua atenção. Motivo pelo qual ela diz considerar o artista tão querido até hoje. “Acho que muitas das brincadeiras daquele tempo eram feitas com mais inocência em relação a hoje em dia. Então, nós, ‘os mais velhos’, temos boas lembranças daquele tempo engraçado”, disse ela, que também trabalha com humor na maioria das personagens que interpreta nos espetáculos da Cia de Artes Nissi.


Caiu na rede

Paródia do presidente americano foi divulgada na rede
Paródia do presidente americano foi divulgada na rede

Além de fazer carreira na televisão e no cinema como humorista, o carioca Mussum era integrante do grupo Originais do Samba e fazia questão de ressaltar seu amor à escola carnavalesca Estação Primeira de Mangueira. Quando morreu, em julho de 1994, por complicações no coração, o acesso à Internet ainda não era nada comum. Ainda assim, hoje até ele tem seu espaço garantido por lá. Uma das iniciativas da rede que mais deu certo, brindando fãs e arrebanhando novos admiradores, foi a divulgação de uma série de montagens que mesclavam o rosto do humorista com o de diversos famosos ou em cenários característicos. A boa ideia gerou figuras engraçadas, como o “Obamis”, o “Anderson Silvis”, o “Harry Potis” e a “Ana Maria Braguis”. Um excelente viral, como são chamadas as febres que estouram no ambiente virtual. “Eu acredito que é uma tendência bem forte essa retomada de alguns ícones. As páginas do Facebook que utilizam bastante esse método são super ‘pops’ e deslancham com muita facilidade. Com esse sucesso constatado, a publicidade se apropriou e fez o mesmo com o Mussum, usando a comédia”, opinou a jornalista, pesquisadora de redes sociais e mestranda do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Católica de Pelotas (PPGL/UCPel) Taiane Volcan. “Foi a velha regra da apropriação e, claro, um pouco de sorte”.

E bota sorte nisso. Na mesma época do famoso viral da Internet, em 2012, a agência de publicidade pelotense Santa Anna elaborou uma campanha de Natal para a loja Otros Aires. “A ideia era associar o Mussum, personagem-ícone dos anos 1980 e querido pelo público-alvo da marca, à data, que remete a tantas lembranças da infância. Usamos ele com touca de Papai Noel, em máscaras na vitrine e todas as peças possuíam a chamada ‘Feliz Natalis’”, relembrou, orgulhosa, a publicitária da agência, Cadija Souza. “Os consumidores gostaram tanto da ideia que muitos tiravam foto da vitrine e pediam para posar com a máscara”.

A também publicitária e sócia da Tr3s Comunicação Total, Fernanda Morales, não é muito adepta à tendência de utilizar em campanhas celebridades que já morreram, embora confesse ser fã dos Trapalhões. “Elvis Presley, mesmo, é um dos mais usados. Eu, pessoalmente, não gosto dessa estratégia, mas respeito quem usa. Realmente, o Mussum foi um ‘bum’”, opinou.

“Nada mudou”
Esse movimento todo soa, praticamente, como uma tentativa de ressurreição do ídolo nas diversas mídias. A imagem de Mussum está estampada em roupas, seu linguajar próprio na boca de todo o Brasil e sua figura cai como luva na divulgação de qualquer projeto que queira ser bem-sucedido. Talvez, como nunca antes na história desse país. Até porque, quando surgiu nas telinhas e telonas interpretando seu personagem mais famoso, Antônio Carlos enfrentou um racismo bem mais forte que o que existe atualmente. Porém, para a bancária Eva Maria Soares, graduada no curso de Licenciatura em Educação Artística, com habilitação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a valorização do personagem em nossos dias não remete a evolução racial. Negra e pelotense radicada em Porto Alegre há quase trinta anos, ela acompanhou o sucesso do quarteto de perto, toda vez que levava a afilhada aos shows no Gigantinho ou às estréias dos filmes nos cinemas. Era diversão garantida em família. Mas, as risadas não embaçavam seu olhar crítico. “Os Trapalhões eram extremamente preconceituosos com feios, negros, gordos e pobres. Acho lamentável que os três que acompanhavam o Didi compactuassem com isso (o Mussum negro, o Dedé gordo e o Zacarias feio)”, disse. “De uns tempos para cá, tivemos muitas celebridades negras aparecendo – e reaparecendo –, mas, é só para calar a nossa boca. Nada mudou. Os negros aparecem só um pouco. Não muito. O suficiente para a gente ‘achar’ que não tem preconceito e que a sociedade está nos aceitando. Na verdade, só está nos ‘engolindo’, porque sabe que qualquer deslize pode arder em seu bolso”.

In Memorian
Saúdis
biritisDo tipo Vienna Lager (caracterizado pela baixa fermentação, malte importado, cor alaranjada e aroma a lúpulo), a cerveja artesanal Biritis será comercializada no Rio e em São Paulo em embalagens de 600ml. Haverá ponto de venda até na quadra da escola de samba do coração do homenageado.

Cacildz
uiNão é a primeira vez que Mussum é lembrado em forma de canção. Um exemplo é “Cacildz” (assim mesmo, com “z”), que está no volume dois do CD Único Incomparável, do cantor de hip hop Pregador Luo. O ritmo é dançante, mas a letra não dispensa um toque de crítica social: “Cacildz, cacildz, a parada tá sinistris/ Tão tomando muito mé, exagerando na biritis/O povão tá estressado/ Quando você já não serve, metem o pé no seu forévis”.

Fusquis
fusquisMussum também é estrela na montagem feita pela Volkswagen, no início desse ano, para apresentar ao público o Novo Fusca. A campanha publicitária reconstituiu o cenário do Viaduto do Chá, em São Paulo, como na década de 1970.

Feliz Natalis
feliz_natalis
A frase virou slogan da campanha publicitária encomendada pela loja pelotense Otros Aires à agência Santa Anna, no Natal de 2012. Os clientes aprovaram.

Taís Brem

*Reportagem publicada, também, no Diário Popular, em 11/08/13.