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Entre o consumismo e o desapego

Moda dos brechós on-line é uma das maneiras de incentivar o consumo sustentável

(Foto: Divulgação).
Artigos são vendidos pela Internet a preços simbólicos (Foto: Divulgação).

A bem da verdade, ela considera que colaboraria bem mais para o fim do consumismo – ou para uma diminuição significativa dele em sua esfera de convivência – se promovesse um troca-troca de roupas, calçados e acessórios com seus conhecidos. Mas, como um dinheirinho extra é sempre bem-vindo, a opção foi mesmo por organizar um brechó on-line. Na roda, entraram peças que a jornalista Nathalia King, 28, não usava mais e estavam ocupando o espaço que ela precisava esvaziar, em função da mudança para um imóvel menor. A quantidade de bens era grande, assim como foi a coragem de colocar em prática o tal do desapego, conceito que tem viralizado dentro e fora das redes sociais.

Jéssica trabalha com moda e sustentabilidade (Foto: Arquivo Pessoal).
Jéssica trabalha com moda e sustentabilidade (Foto: Arquivo Pessoal).

A estudante do terceiro semestre do curso de Design de Moda da Universidade Católica (UCPel) Jéssica Madruga acompanhou a onda dos brechós virtuais desde o começo em Pelotas, há uns dois anos, e acha iniciativas do tipo super positivas. Funciona assim: pelo Facebook ou outros canais semelhantes as pessoas expõem fotos de coisas que não utilizam mais – seja porque deixaram de servir ou não agradam mais – e colocam os objetos à venda. “No início, havia quem quisesse ganhar dinheiro mesmo com isso. Mas, depois, as pessoas passaram a se desfazer de suas roupas por um preço simbólico, apenas para fazer circular essas peças de um jeito não-agressivo para elas e para o meio ambiente”, disse ela que, além de trabalhar com projetos que aliam moda e sustentabilidade, é cliente assídua de brechós físicos, também. “Esses artigos, de certa forma, terão seu período de vida útil aumentado, não serão jogados fora, serão reaproveitados. E, enquanto isso, as pessoas continuam consumindo, mas de um jeito mais inteligente do que só focado no acúmulo desnecessário”.

Nathalia King (Foto: Arquivo Pessoal).
Nathalia King (Foto: Arquivo Pessoal).

Na calculadora de Nathalia, o “preço simbólico” a que Jéssica se refere varia de R$ 10,00 a R$ 30,00, não muito além disso. “Primeiro, doei muita coisa. Depois, o  objetivo foi vender as roupas para que elas fossem usadas por pessoas que realmente as apreciariam. Pelo menos, os preços são bem menores [que no comércio convencional] e ninguém se endivida”, disse, divertindo-se. “Admito que comprar dá uma sensação maravilhosa, mas, hoje em dia, não me considero mais uma pessoa consumista, como já fui – e muito!. A gente vai crescendo, amadurecendo e tendo novas prioridades. Aprendi que, economizando, posso ter conquistas bem maiores do que a compra de uma peça de roupa, por exemplo. E essa é a mentalidade. O primeiro passo é se livrar dos inúmeros cartões de crédito. Depois, passar a valorizar o que realmente é importante, sem esquecer de fazer aquela perguntinha: ‘Eu preciso disso mesmo?'”.

Blusa foi vendida no Brechó da Nath por R$ 15,00 (Foto: Arquivo Pessoal).
Blusa foi vendida no “Brechó da Nath” por R$ 15,00 (Foto: Arquivo Pessoal).

Consumo equilibrado
A também jornalista Yéssica Lopes, 23, diz não se considerar alguém consumista quando se trata do que ela chama de “bens materiais mais práticos”, como roupas e acessórios. “A maioria das minhas roupas é presente de família, que ganhei no aniversário, Natal…”, explicou. “Atualmente, só compro quando realmente não tenho outra escolha. Muitas peças da minha mãe me servem e isso facilita na hora de eventos mais formais. Já no sentido de ‘prazeres do dia a dia’, sim, me considero consumista. Prefiro andar a pé e de ônibus e poder beber uma cerveja todo dia a ficar pagando prestação de carro ou algo do gênero”.

Yéssica Lopes (Foto: Arquivo Pessoal).
Yéssica Lopes (Foto: Arquivo Pessoal).

Todo esse desprendimento deu um bom incentivo para que Yéssica também fizesse uso do Facebook para “comercializar” alguns itens que estavam sobrando em seu armário. Ou melhor: armários, no plural mesmo. “Morei cinco anos em Pelotas e, quando retornei a minha cidade natal, Rio Grande, estava praticamente com dois guarda-roupas completos. Então, separei umas cinco malas de roupa e doei quase tudo! Com algumas peças, eu tinha algum apego, como o vestido que usei na minha formatura de Ensino Médio, por exemplo. E fui enrolando”. Até que, há aproximadamente um ano, Yéssica atingiu seu limite de estresse por causa da dedicação extrema à carreira profissional. “Chegava a ser superior ao que eu dedicava a mim mesma. Então, comecei a encarar a vida de outra forma. A forma que encontrei de conseguir entregar peças bacanas às pessoas e receber um valor quase que simbólico pela troca foi a maneira que consegui desapegar de roupas que, em muitos casos, nem havia utilizado. Daí surgiu a ideia do brechó”, relatou.

Calça jeans foi um dos itens comercializados no brechó "Praticando o desapego" (Foto: Arquivo Pessoal).
Calça jeans foi um dos itens comercializados no brechó “Praticando o desapego” (Foto: Arquivo Pessoal).

Obviamente, sua atitude acabou beneficiando a ela mesma e, as economias que fez, geraram uma poupança em que ela deposita verba para viajar de vez em quando e aproveitar a vida. “O mundo anda uma loucura sem fim. Acredito que toda e qualquer ação que tente reduzir o consumo seja válida, do copo plástico ao sapato. Não serei demagoga a ponto de querer que todos se vistam da mesma forma todos os dias. Eu não faria isso. Mas, algumas ações caminham para o equilíbrio e isto sempre será benéfico, disse Yéssica. “Tenho uma linha de pensamento bem simples: tudo em excesso faz mal. Resta saber qual é o limite de cada excesso que carregamos”.

A voz das estatísticas
Se levarmos em conta o que diz a pesquisa de mercado divulgada pelo Instituto Euromonitor International, não dá para colocar o consumismo de um lado e o desapego de outro, taxativamente, por mais contraditório que pareça. Um relatório chamado As dez tendências globais de consumo para 2014, que veio a público no início do ano, mostra, entre outros dados, que as pessoas continuam em busca da boa e velha sensação de saciedade que acompanha a aquisição de um novo produto. Por causa disso, as tais compras por compulsão ainda não viraram comportamentos extintos. Entretanto, já é possível observar que esses mesmos consumidores estão muito mais atentos ao impacto que suas compras podem gerar na sociedade e no meio ambiente. A divulgação de notícias de marcas internacionais que fabricam suas peças às custas de trabalho escravo em países subdesenvolvidos, por exemplo, tem colaborado para que as pessoas revejam suas ações e busquem apoiar causas política e ecologicamente corretas.

Brincadeira sustentável

Suélen, Alonzo e Valquíria (Foto: Edyd Junges).
Suélen, Alonzo e Valquíria (Foto: Edyd Junges).

Os irmãos Alonzo, 8, e Valquíria, 6, estavam empolgadíssimos com a chegada do Dia das Crianças semanas antes de o calendário de 2014 marcar, de fato, o 12 de outubro. Por outro lado, os dois já tinham a consciência de que, assim como ganhariam presentes na data comemorativa, tinham a missão de separar alguns itens usados para trocar pelos novos integrantes de sua brinquedoteca particular. Há cerca de dois anos, esse é um trato que eles têm com os pais, o casal de comunicadores Edyd, 28, e Suélen Junges, 29. “Nós dois conversamos e achamos que a melhor forma de ensinarmos eles a não acumular coisas em vão era incentivar a doar”, disse o publicitário. “Não só no Dia das Crianças, mas no Natal ou nos aniversários deles, vamos até o baú de madeira onde eles guardam os brinquedos e, se vemos que há um acúmulo muito grande, separamos aqueles que ainda estão em boas condições para ‘passar para a frente'”, comentou. “De tempos em tempos, damos uma esvaziada no baú”. E todos saem ganhando.

Taís Brem
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Diga-me como te vestes…

Como o figurino que escolhemos para o cotidiano influencia na imagem que passamos adiante

Foto: Jeff Münchow
Em geral, sociedade valoriza hábito de vestir-se bem (Foto: Jeff Münchow)

Você pode até argumentar que ninguém tem nada a ver com a sua vida ou com as roupas que escolhe para passar os dias e as noites. Afinal, sua rotina não é marcar presença nos famosos tapetes vermelhos dos eventos internacionais e a sua ida à padaria não será exatamente disputada pelos paparazzis de plantão para ilustrar a capa daquela revista de celebridades. Mesmo assim, há quem dê certa importância para o hábito de vestir-se bem, o que acaba por confirmar que as pessoas julgam umas às outras pelo que estão vestindo.

Mariana trabalha com moda festa (Foto: Arquivo Pessoal)
Mariana trabalha com moda festa (Foto: Arquivo Pessoal)

A estilista e publicitária Mariana Gomes, 27, diz perceber essa atitude como algo natural na sociedade. “Moda é comunicação, e felizes são aqueles que conseguem passar suas mensagens apenas entrando em um ambiente. A moda é tão ou mais poderosa que a publicidade. E nenhum aqui é vilão”, opinou. “É um julgamento justo. Eu sou aquilo o que pareço, porque sou ou acredito. Eu escolhi ser esta mensagem hoje. Talvez amanhã, eu nem saiba o que dizer. Mas posso ser julgada pelo o que visto, sim, porque foi o que escolhi entre um milhão de opções. Para menos ou para mais, a escolha é pessoal e as consequências também”.

Mariana ressaltou, entretanto, que ligar determinado figurino a status é algo ultrapassado. “Eu acho que a escolha do figurino é sempre fundamental, mas não na prática diária. Não é todo dia que conseguimos sair de casa sendo o que somos ou trabalhando aquela imagem que queremos ser. O cotidiano tem dessas coisas: embora tenhamos comprado quase tudo o que temos no armário, em muitas ocasiões rotineiras, pela pressa ou falta de paciência, acabamos nos descaracterizando ou nos jogando a alguns vícios estéticos que adquirimos em busca de praticidade”, comentou a estilista, que trabalha com moda festa. Ela diz ter escolhido esse nicho específico exatamente pela motivação de produzir peças únicas e especiais. “Quem vem a mim, tem ocasião e motivo para querer ser o seu melhor, tem anseios, sonhos e vontades específicas. É sempre especial. Não é um dia qualquer”.

Eliza (E) considera a escolha da roupa essencial em qualquer ocasião (Foto: Arquivo Pessoal)
Eliza (E) considera a escolha da roupa essencial em qualquer ocasião (Foto: Arquivo Pessoal)

Colega de profissão de Mariana, a estilista Eliza Andrade lida com todo o tipo de roupa em seu ateliê – de peças básicas a vestidos de noiva. Para ela, a escolha de um figurino é fundamental para a vida e o dia a dia, não só quando se vai a eventos pontuais. “Quando saímos para trabalhar ou fazer qualquer outra coisa que pertença a nossa rotina, precisamos estar adequados. É sempre bom pensar se vamos ter que andar muito, se abaixar ou correr, para escolher peças que tragam conforto, que ajudem e não atrapalhem”, resumiu. Quanto ao julgamento feito a partir da roupa que se usa, Eliza diz considerar algo normal. “É um hábito humano que existe há muito tempo e sempre vai existir. Na verdade, é uma forma de diferenciação em uma sociedade totalmente visual”.

Mais que roupa, atitude
Na opinião da empresária Ana Paula Pereira, 37, a escolha de uma roupa não é tudo, porém é um bom princípio. “Realmente, vestir-se bem abre portas, porque é assim que imprimimos nossa personalidade. Entretanto, atitude e educação completam o estilo de uma pessoa. Não é somente pela forma como me visto, mas pela forma como me comporto que serei reconhecida”, disse. O pastor, cantor e recepcionista Paulo Melquiades, 23, concorda: “Vestir-se bem tem tudo a ver com a ‘roupa de dentro’. Não combina gente bem vestida com palavras chulas e atitudes baixas. Não é uma questão de dinheiro, é uma questão de berço ou transformação de mente. É importante que você esteja ciente de que a mensagem que você quer passar está coerente com suas ações, bem como com o seu guarda-roupa”, pontuou. Melquiades diz considerar essencial manter uma postura equilibrada de bom senso na hora de escolher o que se vai vestir. “O desleixo e o exagero são extremos que podem causar sérios danos, seja na vida profissional, social etc. A maneira como eu me apresento diante da sociedade reflete o valor que eu dou a ela. Se você tem a postura de ‘ninguém tem nada a ver com a minha vida, ninguém paga minhas contas, eu saio do jeito que eu quero’, a resposta que você terá é ‘espere mais tempo na fila’, ‘volte amanhã’, ‘as vagas acabaram’… Já que ninguém tem nada a ver com a sua vida, você não pode exigir nada de ninguém, não é mesmo?”, questionou.

Melquiades (C) procura adaptar-se ao modo de vestir dos israelenses (Foto: Arquivo Pessoal)
Melquiades (C) procura adaptar-se ao modo de vestir dos israelenses (Foto: Arquivo Pessoal)

Morando em Tel Aviv, Israel, há um ano, Melquiades notou diferenças entre o estilo de vestir dos brasileiros e dos estrangeiros. E, aos poucos, está tentando se adaptar a isso. “A moda aqui é cosmopolita, mas sempre existe um estilo em vigor e cada região de Israel possui um estilo bem característico. No norte, por exemplo, região da Galiléia, é comum os rapazes saírem com roupas mais clássicas, como camisa de botão, sapato, blazer. Na região de Tel Aviv, onde moro, as pessoas são mais despojadas, porém tem espaço para todos os estilos. No geral, os homens gostam de roupas mais justas e as mulheres de batas mais larguinhas. O contrário do Brasil”, ironizou.

Gosto se discute?

"Conceito de bom gosto é discutível", diz Leonardo (Foto: Luigi Sodré)
“Conceito de bom gosto é discutível”, diz Leonardo (Foto: Luigi Sodré)

Controverso e questionável. É assim que o universitário Leonardo Ferreira, 21, define o conceito de “bom e mau gosto para se vestir”. Mesmo assim, o futuro jornalista diz acreditar que, de fato, a aparência é relevante, principalmente pela grande exposição via Internet, crescente nos dias atuais. “O julgamento é feito inconscientemente, na maioria das vezes, pois nos baseamos em uma estética já moldada pela mídia e o que não é compreendido é tido como diferente e errado”, comentou. “A roupa expressa uma série de signos subjetivos, que são avaliados (positivamente e negativamente) pela sociedade. Vejo isso como algo importante para a interação social. Por isso, costumo cuidar da aparência. Minha profissão vai exigir que eu lide com o público e é necessário já manter certo posicionamento nesse sentido”.

Na história
Muito antes de inventarem as publicações de moda, as semanas internacionais fashion ou os programas de TV que dão dicas sobre as tendências atuais, a Bíblia – sim, ela mesma! – já

Comunicação pela moda vem desde a antiguidade (Foto: Jeff Münchow)
Comunicação pela moda vem desde a antiguidade (Foto: Jeff Münchow)

falava da importância do vestuário na transmissão de determinada mensagem. “Essa mensagem pode ser o que somos, o que pensamos, o que desejamos que os outros pensem ou o trabalho que realizamos. As roupas sacerdotais, por exemplo, foram criadas para transmitir santidade, pureza, separação de alguém para o serviço divino. Os guerreiros, por sua vez, utilizavam vestimentas anunciando o desejo de vencer o seu inimigo e gerar medo no oponente. Pessoas que estavam sofrendo utilizavam roupas de pano grosseiro”, citou o diácono do Ministério Casa de Oração (MCO), Wilson Brem, 37. “A roupa não é uma verdade em si. Entretanto, podemos conhecer alguém pela maneira como ela se veste. Se a pessoa deseja causar boa impressão, conquistar um trabalho, avisar que é perigosa, gerar desejo sexual ou apenas se sentir bem, demonstrará tudo isso na sua maneira de se vestir”.

Taís Brem

Na vitrine

 

Não precisa nem dizer que esta época do ano é a mais propícia para que as pessoas andem com seus corpos em maior exposição, devido ao calor em excesso. E na praia, entra moda, sai moda, nenhuma vestimenta faz mais sucesso que o famoso biquíni. Pois, veja bem: um estudo apresentado para a Sociedade Americana para o Avanço da Ciência (AAAS) mostra que, quando vestidas de biquíni, as mulheres são vistas pelos homens como objetos. Manequins de vitrine, seria? Praticamente isso.

 

Mas, não culpemos os homens. “Eles não têm essa atitude de uma forma premeditada. É algo que eles não racionalizam”, afirmou uma das mentoras do experimento, a professora de Psicologia da Universidade de Princeton Susan Fiske. Dizem os entendidos que o estudo sugere também a explicação para o fato de personagens como Tiazinha e Feiticeira conquistarem tantos admiradores: quando o rosto da dita-cuja está escondido, a sedução é ainda maior…

 

E para que servem as conclusões deste trabalho? De acordo com Susan, para aplicações bem práticas, como, por exemplo, justificar porque um patrão beneficia certas companheiras de trabalho em detrimento dos demais funcionários da empresa. Depende de como ele idealiza aquele corpo. É a velha história dos estímulos visuais (do namorado, do patrão, do estuprador e por aí vai) ligados aos impulsos de todo o resto do desejo humano. E depois, dizem que não tem nada a ver…

 

Taís Brem