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Um shopping para chamar de nosso

Em 03 de outubro, finalmente, Pelotas assistirá à inauguração de seu primeiro shopping center

Shopping Pelotas será o primeiro da cidade (Foto: Taís Brem)
Shopping Pelotas será o primeiro da cidade (Foto: Taís Brem)

O shopping que leva o nome da cidade e o peso de ser o primeiro empreendimento do tipo a ser inaugurado em Pelotas estará aberto ao público a partir do mês que vem. A expectativa é enorme entre os moradores da cidade. Afinal, a Princesa do Sul, do alto de seus 201 anos, já teve de tudo: centro comercial, galeria, hipermercado e lojas que lançaram a escada rolante como novidade, excursões para a capital que incluíam passeios em shoppings e vários projetos que nunca chegaram a vingar. Mas, shopping mesmo, é a primeira vez.

Laureni Mendes (Foto: Arquivo Pessoal)
Laureni Mendes (Foto: Arquivo Pessoal)

Para a maioria dos cidadãos pelotenses, a implantação de um shopping na cidade é positiva, uma vez que, entre outras coisas, é sinal de desenvolvimento econômico. “Vai proporcionar novas oportunidades de emprego e será mais um ponto turístico para os visitantes, sem contar que é um grande investimento para Pelotas”, opinou a dona-de-casa Laureni Mendes, 45. Sheila Teixeira, 19, concorda, principalmente, porque poderá impulsionar as chances para os jovens que nunca trabalharam. Porém, embora considere que o empreendimento será um marco para a cidade, a estudante não acha que o visitará com frequência, já que o Shopping Pelotas funcionará no bairro Areal e Sheila mora no Fragata. Para o jornalista e professor Jairo Sanguiné, o empreendimento dará vida à cidade. “Meu interesse pessoal são as salas de cinema, pois Pelotas é tida como polo cultural e ainda não tem salas de cinema de qualidade”, apontou. A expectativa do militar Igor Silveira, 19, é por variedade de entretenimento. Tendo algo diferente, como boliche ou área de pentibol, eu pretendo frequentar”, comentou.

Com apenas um pavimento, o Shopping Pelotas tem mais de 35 mil metros quadrados de área construída e conta com 172 lojas, seis âncoras, cinco megalojas, dois restaurantes, 14 fast-foods, cinco salas de cinema (sendo que duas são 3D) e 1.173 vagas de estacionamento. Por serem inéditas em Pelotas, as filiais das lojas Americanas e Riachuelo e da rede de fast-food Burger King estão entre as mais aguardadas pelo público.

Progresso ou retrocesso?
Na opinião de Silveira, a instalação do shopping em Pelotas é uma evolução. “Mas, uma evolução meio atrasada”, explicou. “Nós temos uma economia significativa para fazer o shopping render e, de uns tempos para cá, a economia da cidade, que está entre as maiores do Rio Grande do Sul, ficou mais forte. [Essa inauguração] Poderia ter ocorrido antes”. Na mesma linha, a psicóloga Marilei Vaz opinou que o “reboliço” feito pela população em torno da implantação do empreendimento soa como exagero. “Para uma cidade que tem tantos prédios bonitos e já viveu tanto glamour, inaugurar um shopping a esta altura é um retrocesso”. “Depois que municípios, como Lajeado, Passo Fundo, Novo Hamburgo, entre outras cidades menores já têm shopping há mais de dez anos, é, no mínimo, motivo para reflexão”, disse o administrador de empresas Marco Soares, 41, que é pelotense, mas, atualmente, mora na capital paulista. “A propósito, agora que Pelotas está inaugurando um shopping, o ‘comércio de rua’ está em alta”, comentou Soares, ao citar o sucesso da 25 de março, do Brás, da Teodoro Sampaio e da avenida Paulista, em São Paulo; do Saara, no Rio de Janeiro; e dos Open Mall, uma espécie de shopping de rua, famoso nos Estados Unidos e que, agora, ganha força na região de Campinas e Belo Horizonte.

Os envolvidos com o projeto, obviamente, não estão alheios a essa realidade. “Um shopping em Pelotas é aguardado há décadas. Por isso, posicionamos o shopping como uma novidade que veio realizar um sonho do pelotense, mas, sem esquecer que é uma iniciativa que nasceu localmente, que tem a cara de Pelotas e que, por isso, irá satisfazer totalmente nossa comunidade”, disse o diretor de criação da Incomum, Daniel Moreira, o Cuca.

Ação teve início em junho (Foto: Divulgação)
Ação teve início em junho (Foto: Divulgação)

A Incomum é a agência de comunicação estratégica que possui a conta do Shopping Pelotas. Na ação prévia feita para gerar envolvimento e movimentação na Fan Page, a agência utilizou expressões características da região. O primeiro passo foi dado no evento da entrega dos capacetes, em 20 de junho. Na ocasião, os convidados receberam um bolo inglês acompanhado de uma etiqueta com a frase “Não é bolinho, é queque”. “Dando continuidade a esse mimo, criamos a campanha no Facebook, onde, com a mesma estrutura de frase, fizemos 25 posts, publicados de 26 de junho a 29 de julho”, disse Cuca. “A soma do alcance de cada post da campanha foi de 208 mil pessoas. O mais exitoso foi ‘Não é vou embora, é partiu o Guabiroba!’, com um alcance de mais de 40 mil pessoas distintas, 653 compartilhamentos, 450 curtidas e 40 comentários”.

Hoje, a Fan Page do Shopping Pelotas, que ficou popular trazendo à memória dos pelotenses o “frege”, o “mandinho”, o “de primeiro” e a “recheada”, tem mais de nove mil fãs. A expectativa da agência é chegar aos 15 mil até o fim desse ano.

Antes tarde do que nunca
O publicitário Paulo Soares, 52, que também já deixou de morar em Pelotas há mais de 20 anos, torce para que o empreendimento dê certo. A respeito de uma provável resistência local a novidades, o publicitário opinou: “Não há lógica em rejeitar o progresso, se não há uma manutenção e um progresso do comércio nativo. Na Bahia, há uma rejeição à música internacional e até mesmo a ritmos brasileiros não baianos, mas, há uma força incontestável do axé-music, com todas as suas variantes”, exemplificou. “O comércio de Pelotas não oferece, nem nos produtos locais, doces, compotas, artigos de couro, alternativa moderna de compra, nem uma feira permanente, a não ser a dominical da Avenida [Bento Gonçalves]. Em Fortaleza, tem uma feira como essa funcionando todos os dias, das 17h às 23h. Na Praia de Boa Viagem, em Recife, também. Por que Pelotas não trabalha sua vocação turística? Por que o Mercado Público está fechado, um ano depois da previsão de reabertura? São coisas como essas que eu acho que justificam o atraso desse empreendimento”, enumerou. “O Shopping Pelotas será um sucesso se incorporar a cultura da cidade, o samba, inclusive. Se tiver uma política de inclusão de pequenos estabelecimentos, sem deixar de focar nos grandes. Se tiver linhas de ônibus e lotação para acesso fácil, eventos culturais, participação na vida da cidade. Se tiver a coragem de romper com a apatia e se posicionar como uma operação revolucionária”, sugeriu. “Assim esperamos”.

Alerta redobrado

Agente alerta para a prudência no dia da inauguração (Foto: Taís Brem)
Agente alerta para a prudência no dia da inauguração (Foto: Taís Brem)

A inauguração do Shopping Pelotas está marcada para o dia 03 de outubro. E, como a movimentação deve ser intensa no local, intensifica-se, também, a necessidade de prudência no trânsito. “Mesmo se tratando de uma rótula, há um uso excessivo da velocidade dos veículos e desrespeito à sinalização. Por isso, é necessário ter prudência redobrada. O local estará mais sensível a ‘acidentes’, em função do aumento do número de veículos e de pessoas”, lembrou o agente de trânsito Wilson Brem.

O Shopping Pelotas funcionará na avenida Ferreira Viana, 1.526, no cruzamento com a São Francisco de Paula.

Taís Brem

Pelotismos e pelotices

Quem é pelotense nato, como eu, ou mora aqui há certo tempo deve estar se divertindo bastante ao acompanhar a campanha publicitária de um empreendimento que está em vias de inauguração na cidade. Feita no Facebook, a série de propagandas mostra o jeito peculiar que Pelotas tem de se comunicar. Claro que muito do que está ali pode ser confundido com o que é dito no resto do Rio Grande do Sul (como o “cacetinho”, o “guisado” e o “negrinho”). Mas, temos, sim, expressões que bem podiam ser apelidadas de “pelotismos” ou “pelotices”, que o digam o “partiu o Guabiroba”, o “te desse”, o “merece” e o “bem capaz”.

Além de provocar boas recordações, a iniciativa traz um sem número de expressões semelhantes à memória. Me peguei com bloco e caneta na mão dia desses anotando o que poderia caber exatamente na ideia daquelas propagandas. A torneira que chamamos de “pena”, o armazém que apelidamos de “venda”, o glacê que denominamos “merengue”, o rabo-de-cavalo que, pra nós, é “colinha”.

Há uns dez anos, uma amiga carioca, recém-chegada na cidade, se surpreendeu ao ouvir o elogio de uma pelotense à sua filha que tinha cerca de dois aninhos: “Que nojo!”, disse a mulher. A expressão dela, no entanto, não era de asco, mas de quem acabava de achar a guriazinha fofa demais, lindinha, quase uma bonequinha. Minha amiga deduziu, portanto que, para os pelotenses, “que nojo” também pode ser sinônimo de “que amor”, “que graça” ou coisa que valha.

Sim, ela estava chegando à terra em que ponto de ônibus é “paragem”, geada é “cerração” e inseticida é “flit” ou “xispa”. O que o resto do Brasil chama de manta, para nós é “coberta” ou, até, “sono leve”. E a nossa “manta”, para eles é cachecol.

Pelotas tem dessas coisas. Lembro do tempo em que 07 de setembro era data mais que certa no calendário para reunir as famílias para assistir à Parada da Juventude na Avenida. A atração mais esperada? “A Banda da Escola”. Ninguém precisava perguntar a que avenida, a que banda ou a que escola nos referíamos. Estava subentendido: a “avenida” era a Bento Gonçalves e a “banda”, a marcial da “escola”, a Escola Técnica Federal de Pelotas – que já foi CEFET e hoje atende pelo nome de IF-Sul. Conheço, inclusive, quem, ao completar a maioridade, se surpreendeu ao saber que Pelotas tinha, sim, outras avenidas e que a Bento não era exclusiva.

Só quem é daqui entende o que queremos dizer quando falamos de “Curva da Morte”, “Bairro Cidade”, “Guabi”, “Bonja”, “Donja” ou “Avenida Interbairros”. E aquela rua que lá na capital, Porto Alegre, chamam de “Marechal”, pra nós é apenas “Deodoro”. Deve ser porque nos sentimos mais íntimos.

Taís Brem

Texto publicado também no site Reportchê.