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Companheira do passado, do presente e do futuro

Paulo Guterres_Divulgação

O dia é dedicado aos ciclistas, mas a estrela mesmo é a bicicleta, ontem, hoje e sempre

A professora de 32 anos. O engenheiro civil, de 54. A funcionária pública, de 58. O estudante, que completará 13, no fim do ano. A administradora e a futura fisioterapeuta, que estão com 30 anos de idade. O pedreiro, que, embora bem conservado, já tem 61. E o ex-motorista marítimo, de 89. Os perfis podem ser diferentes, mas, todos eles se conectam quando o assunto é ciclismo. Os praticantes de uma das atividades que melhor equilibra esporte e lazer tem seu dia próprio no calendário nacional hoje, 19 de agosto. E, em se tratando de bicicleta, difícil encontrar quem, de alguma forma, não tenha se apaixonado por ela em alguma fase da vida.

Descobrir o motivo não é nem um pouco complicado. É só analisar uma parcela da população pelotense, por exemplo, de qualquer que seja o nível social. Não raro, se descobrirá que muitos no contexto se encaixam entre aqueles que tiveram o veículo como objeto de desejo na infância; que reconhecem, no presente, sua importância por fazer tão bem para a saúde das pessoas e do planeta; e que já percebem que a bicicleta tem tudo para ganhar o título de meio de transporte do futuro.

Muito ainda há que se fazer para melhorar a vida de quem transita de bicicleta em Pelotas, mesmo com os 27 quilômetros de estruturas cicloviárias que a cidade possui, ao todo. Que o diga o pedreiro Itamar Garcia, 61, que utiliza o veículo como principal meio de locomoção há mais de duas décadas. “Falta sinalizar melhor os trechos e aperfeiçoar as ciclofaixas para evitar acidentes”, disse, ao citar como exemplo a avenida Domingos de Almeida. “Tem algumas tampas de bueiro cruzadas no meio do caminho que podem fazer com que a roda encaixe naquelas grades e acabe gerando um tombo. Mas, está melhorando. Fora isso, é tranquilo. Eu, que dependo da bicicleta para trabalhar, acho ela muito útil. E, como gosto de esportes, andar de bicicleta é um exercício a mais. Faz muito bem para minha saúde”, afirmou.

Gláucia, em recente visita a Amsterdam, na Holanda, onde o ciclismo é uma febre (Foto: Arquivo Pessoal)
Gláucia, em recente visita a Amsterdã, Holanda, onde o ciclismo é uma febre (Foto: Arquivo Pessoal)

A administradora Gláucia Sales, 30, costuma andar de bicicleta com mais frequência no verão, quando faz passeios na Praia do Laranjal. Ela diz considerar muito positivo o movimento de incentivo que tem ocorrido nos últimos tempos em prol do ciclismo. “Faz bem à saúde, é um meio de transporte que não polui e, se as bicicletas forem mais utilizadas, tem a vantagem da diminuição da quantidade de carros nas ruas”, disse. “Porém, para que as pessoas possam fazer uso da bicicleta como meio de transporte ou lazer, deve haver políticas públicas de incentivo e de viabilidade nas cidades”, destacou.


Nostalgia sobre duas rodas
O ciclismo foi a forma adotada pela funcionária pública Luiza Soares, 58, tanto para diminuir o tempo gasto com a espera do ônibus para chegar ao serviço quanto para economizar financeiramente. “O dinheiro que eu usava para pagar a passagem, resolvi juntar para cobrir as prestações de uma bicicleta no crediário”, disse. “Isso faz mais de dez anos e, até hoje, continuo pedalando”.

Aliás, desde que se entende por gente, Luiza observava o pai, o aposentado Maurício Silveira, 89, também utilizando a bicicleta como veículo de trabalho e de passeio. Até agora, esse foi o único meio de transporte próprio que o chefe de família teve, inclusive para carregar no bagageiro os filhos, os sobrinhos e, até os netos. “Lembro até hoje do vô me levando para o colégio de bicicleta”, recordou o militar Lucas Garcia, 18. O corredor da casa da família foi, por muitos anos, utilizado como estacionamento de vários exemplares do veículo. “Praticamente todos nós tínhamos. E a família não é pequena”, comentou Luiza. “Hoje, alguns já se desfizeram das suas, mas ainda usamos bastante. Sempre tem uma bicicleta à disposição para quem precisar”.

Boas lembranças associadas às pedaladas também fazem parte da vida da professora Ana Paula Vallim, 32. Durante uma visita ao médico, quando tinha por volta de oito anos, foi questionada sobre o porquê de ser tão magra. A mãe entregou: “É que ela anda muito de bicicleta, doutor”. Menos mal. Não havia nada de grave no fato da menina estar tomando gosto pelo hábito saudável que nutriria ainda por muitos anos à frente. Na época, Ana Paula morava “pra fora”, na zona rural de Pelotas. Lá, os “cacarecos” que a família adquiria de segunda mão, serviam de transporte para todo tipo de necessidade, inclusive para ir para o colégio. “Eram cinco quilômetros até chegar à escola. Chegou o tempo em que minha mãe começou a achar que eu não tinha estrutura para suportar todo o trajeto, com sol forte no verão, em pleno meio-dia”, recordou.

Depois de algum tempo morando na cidade, com 23 anos, Ana Paula conseguiu adquirir sua primeira bicicleta direto da loja. O motivo principal também era suprir a necessidade de locomoção. Porém, a compra teve um prazer a mais: curar a frustração de nunca antes ter tido uma bicicleta para verdadeiramente chamar de sua, novinha em folha. Cada vez que usava o veículo, fazia uma verdadeira viagem ao passado, com direito a simular que dirigia um carro de verdade enquanto passava pelo meio dos automóveis, ”fingindo que ligava o pisca”, “fazendo som de buzina com a boca” e “girando o guidom, como se fosse um volante”. Há quatro anos, a professora não precisa mais fazer de conta que é motorista, porque já tem licença para dirigir e carro para aplicar suas habilidades de verdade. Mesmo assim, sente falta da companhia da bicicleta. “Pretendo ainda tornar o ciclismo uma rotina semanal. Gosto de sentir a brisa no rosto, enquanto pedalo”, comentou. E a vontade de fazer da meta uma realidade se fortalece ainda mais quando é convidada pela irmã para fazer passeios e trilhas sobre duas rodas. “Isso mexe bastante comigo. Voltar a andar de bicicleta é uma possibilidade que eu não descarto”.

Da mesma forma, embora com pouca idade, o estudante Rafael Santiago, 12, guarda na memória seus bons momentos na companhia da bicicleta. Há uns dois anos, era pedalando que ele, os irmãos e a mãe iam para a igreja que frequentam, três vezes por semana. “Aí, um dia, a mãe decidiu ir de ônibus e a gente nunca mais foi de ‘bici’”, contou, ao mencionar o apelido em diminutivo, demonstrando que tem tanto carinho quanto saudade dos passeios. Hoje, ele anda mais de skate. Mas, quando questionado sobre qual dos dois gosta mais, não consegue eleger um preferido. “Entre ônibus e bici, acho a bici muito melhor. Mas, entre skate e bici, não tem melhor. Gosto do mesmo jeito dos dois”.

Para o corpo e a mente

Pedalar faz bem para a saúde física e mental (Foto: Wilson Lima)
Pedalar faz bem para a saúde física e mental (Foto: Wilson Lima)

A acadêmica do quarto semestre do curso de Fisioterapia da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) Inês Padilha, 30, sabe que, além de ótima atividade física – por melhorar o condicionamento e a respiração, por exemplo –, andar de bicicleta contribuiu com a saúde da mente. “Ajuda a espairecer e colocar as ideias em ordem”, disse. O engenheiro civil Paulo Guterres concorda: “A vida dentro dessa visão é contagiante e muito boa. Muitos abandonam as noitadas, o álcool e o fumo. Isso é maravilhoso, pois encontramos nos amigos, na vida simples e na natureza o Deus que muitos esqueceram”.

Diretor do Centro Politécnico da UCPel, foi Guterres quem teve a ideia de realizar, em parceria com o grupo Pedal Curticeira, a pedalada em homenagem ao Dia do Trabalhador, feita pela instituição no último dia 1º de maio. A comunidade acadêmica aprovou. “Quero contagiar mais e mais pessoas para juntar o útil ao agradável, pois, além de pedalar, temos um grupo de amigos e de gente que busca vida saudável e respeito à natureza e ao ser humano. Vamos pedalando, jogando conversa fora e encontrando gente de verdade”, disse. “Hoje eu conheço muita gente do interior, simples, sem instrução, mas que tem coração, verdade nas palavras e no olhar”.

UCPel promoveu passeio ciclístico em homenagem aos funcionários (Foto: Wilson Lima)
UCPel promoveu passeio ciclístico em homenagem aos funcionários (Foto: Wilson Lima)

Os novos amigos a que Guterres se refere são os integrantes do grupo Pedal Curticeira, que ele frequenta desde 2011. A partir dos 16 anos, amantes do ciclismo se reúnem regularmente às terças-feiras, quintas e sábados. Às vezes, também, há passeios aos domingos, como nesse último (18), em que o engenheiro pedalou 110 quilômetros, indo até o município de Cerrito e voltando pelo interior do Capão do Leão.

Guterres participa do Pedal Curticeira há dois anos (Foto: Divulgação)
Guterres participa do Pedal Curticeira há dois anos (Foto: Divulgação)

Origem da data
O Dia Nacional do Ciclista é comemorado anualmente em 19 de agosto desde 2008, após proposta do então senador capixaba Gerson Camata e aprovação da Comissão de Educação, Cultura e Esporte. A data foi escolhida para homenagear o ciclista e biólogo Pedro Davison, que morreu atropelado em 19 de agosto de 2006, em Brasília. O motorista que o atropelou dirigia em velocidade excessiva e estava embriagado.

Taís Brem