A quem admirar?

Eleger a personalidade nascida em solo verde e amarelo mais notável, seja por grandes obras culturais deixadas para deleite da população, por bons exemplos dados à família brasileira, por uma representatividade exemplar na política ou por grandes feitos no campo dos esportes. Eis o objetivo do programa “O Maior Brasileiro de Todos os Tempos”, do SBT. Acontece que a abertura da votação para um público não-especializado, embora positiva do ponto de vista democrático, deixa margem para um certo receio de que, no fim, o tal maior brasileiro não seja alguém que mereça, de fato, o título.
A primeira fase das escolhas resultou numa lista bem diversa e surpreendente. Tudo bem que Michel Teló levou a música popular brasileira para o exterior. Mas, daí a poder ser considerado o maior brasileiro de todos os tempos há uma enorme diferença. Creio que houve falha de entendimento entre o ser uma personalidade histórica e o estar em voga simplesmente por ser uma celebridade instantânea.

No programa semanalmente apresentado por Carlos Nascimento não há jogo ou disputa intelectual. Simplesmente, quem tiver mais empatia com o público, ganha o maior número de votos e, assim, mais chances de ser o vitorioso. Dia desses, ao procurar palavras para defender Ayrton Senna, seu representante disse que o piloto merecia ganhar por ter conseguido fazer toda a nação acordar cedo a cada domingo pela manhã para assistir as suas corridas. No mínimo, um dado inusitado. Outra pessoa opinou que Pelé devia vencer porque, além de toda sua genialidade, está vivo e merece uma homenagem desse nível ainda em condição de presenciá-la. O argumento provocou um fã de Juscelino, que acabou dando ao fundador de Brasília e ex-presidente da República um status de Elvis Presley: “Isso é injustiça! Juscelino não morreu! Ele continua vivo toda vez que nasce um brasiliense”, disse o emocionado senhor.

Embora haja expectativas sobre o resultado, nutrir ilusões não é recomendado. É bem provável que o escolhido não satisfaça o gosto da coletividade. Particularmente, não enxergo nenhuma personalidade dentre as citadas no programa que possa traduzir a grandeza de um brasileiro singularmente notável por sua contribuição à pátria como Nelson Mandela o foi – e é – para a África do Sul, se tornando assim o maior sul-africano de todos os tempos na versão da atração veiculada por lá. Até quem conhece minimamente a história daquele país considera a escolha merecida. Aqui, entretanto, quem merece a honraria? Talvez o xis da questão esteja no infeliz e inegável fato de que o Brasil é pobre em referência de heróis e, também, em identificá-los e honrá-los. Daí a dificuldade para os acertos e a facilidade para as confusões numa escolha como a proposta pela atração.

Taís Brem

Texto publicado também no Observatório da Imprensa e no Diário Popular.